A Argentina teve seu “ponto de virada” em 2024, com a eleição de um candidato presidencial – Javier Milei – que mal aparecia nas pesquisas iniciais. O mesmo pode acontecer em outubro de 2026 no Brasil, revelando a surpresa de um candidato até agora pouco lembrado. A motivação mais poderosa na hora do voto será o cansaço do eleitor e sua completa decepção com políticos e com a própria política.


A cabeça do cidadão médio não guarda mais simpatia por nada parecido com “governo”, seja a traquitana da Administração pública, o formigueiro do Congresso Nacional, o sombrio Supremo Tribunal, os togados nos inúmeros tribunais, o enxovalhado INSS, o lerdo SUS, as amorfas agências reguladoras ou os incontáveis “Conselhos”, cabides de empregos. Mesmo não sabendo da missa metade, o lesado cidadão consegue intuir quem paga a conta dessa máquina infernal que devora trilhões de reais como cupins da República.


O eleitor gostaria de acreditar que um vento mágico de mudança passará varrendo essa odiosa engrenagem de moer riquezas e pulverizar esperanças. Mas como fazer isso e quem erguerá a bandeira do cidadão? O “como fazer” tem a ver com o tal ponto de virada na política. Assim aconteceu com Milei e vários outros da nova safra de presidentes na região, do México ao Chile. O “com quem” das eleições brasileiras também dependerá de muita sorte. O desafio é eleger um candidato presidencial preparado e testado para a missão e tão livre quanto possível de conchavos e acertos obscuros no caminho até Brasília.


A mensagem política desse candidato precisa ser clara a ponto de mobilizar o imaginário de cidadãos dos mais diferentes matizes e condição social. Precioso levantamento feito pela Quaest, uma agência de pesquisas de opinião dirigida por Felipe Nunes, identifica, entre 10 mil entrevistados, nove “tribos” de brasileiros, com suas preferências e vieses, em porcentuais da população eleitoral, conforme o quadro.


Numa agregação desses grupos, percebemos distintas colorações políticas e, dentro delas, os laços de interesse comum entre as tribos. Numa conta de chegar, temos perto de 70% dos eleitores num universo político que repudia o Estado-babá, de viés assistencialista. O eleitor, identificado como “direita”, cobrará melhorias profundas na tal máquina pública e mais espaço para expressar seus desagrados.


Os demais 30% seriam os de “esquerda”, que ainda põem fé no aparelho do Estado como capaz de “induzir o futuro desenvolvimento”. O lado da direita, embora mais apático e desatento, forma uma folgada maioria, embora sem padrinho definido, após a condenação de Jair Bolsonaro. Esse grupo reconhece que o PT já esgotou sua caixinha de mágicas e que a figura mais representativa da atual gestão é hoje o Careca do INSS.


Para a direita, não há esperança enquanto houver a corrupção oficializada pelo aparato de interesses que cerca Brasília, gerando fraudes e gastança com os recursos tomados da sociedade. A esquerda, nos outros 30% do espectro político, continuará confiando no Estado-babá, pela distribuição de milhões de bolsas e auxílios, além da promessa de “imposto zero” e de empregos com direito a mais feriados e dias de descanso remunerado do que de serviço efetivo.


Mas se a esquerda ainda se ilude na quimera assistencialista, a direita não faz por menos. Certas narrativas no campo direitista vão ao mundo da lua: desde armar o cidadão para ele mesmo fazer sua “segurança pública”, até “privatizar estatais” para se conseguir um Estado mais enxuto. Privatizar é bom e necessário, mas o candidato da direita enfrentará perguntas incômodas.


Milhões de eleitores em SP e RJ não confiam mais no serviço de energia elétrica nas mãos de uma Enel, nem os usuários da via Dutra aplaudem uma concessionária que os deixa travados quase dez horas no trajeto Rio-São Paulo, nem os que ficam entalados na serra Rio-Petrópolis ou, ainda os que perigam no tenebroso trecho de Juiz de Fora a BH. Para não lembrar das barragens vazadas de mineradoras privatizadas ou da desafortunada Oi, que se afundou na telefonia.


Os eleitores não querem mais ouvir promessas de mudanças pontuais, para que tudo fique como estava antes. Avanços efetivos dependem da participação efetiva e crescente de cada brasileiro num pedaço da riqueza nacional. O candidato presidencial que procuramos precisa passar a noção de que fará a inserção dos brasileiros no patrimônio nacional que, afinal, é de todos. Tal inserção se pode dar de várias maneiras, desde que de forma individualizada.


A educação para o trabalho é parte dessa apropriação de riqueza efetiva. É preciso um plano ousado para dar capacitação aos jovens e adultos no mundo da inteligência artificial. E mais. A riqueza do país precisa ser acumulada em contas previdenciárias individualizadas, que hoje não existem. Uma vasta reforma deve repaginar o velhaco INSS para transformá-lo naquilo que a Constituição ordena no seu artigo 250, ou seja, um fundo social que reflita um conjunto de ativos de riqueza palpável, servindo de lastro para o futuro dos seus participantes.


Não sabemos se 2026 nos trará uma virada para valer. Vai depender de um candidato, com discurso afiado, para motivar a maioria de brasileiros. Milagres acontecem. É o inesperado, como ocorreu há pouco, na vizinha Argentina.

Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia


Deixo aqui votos de que sejamos – da esquerda à direita – todos muito felizes no ponto de virada de 2026 para que, unidos, possamos retomar essa obra majestosa chamada Brasil, a partir de 2027.

compartilhe