No sábado passado, Felipão, o pequeno, distribuiu as camisas, sua especialidade enquanto “treinador”. Por algum motivo que nada tem a ver com sua tática inexistente e seus treinos pra boi dormir, a coisa finalmente se encaixou. Lembrei de uma foto do zagueiro Maurício Lemos lendo um livro, certamente uma peça de campanha pelo fomento da leitura, acompanhada de uma frase: “Quando tava lendo, tava lendo”.


O poeta Ronaldinho, claro, é o autor do verso original, “Quando tá valendo, tá valendo”, da antologia de 2013. Nem era necessário adaptá-lo para a campanha em favor dos livros, visto que Lemos já seria, por si só e também acompanhado, um convite à leitura. O importante é a elucidação do mistério daquele time encaixadinho, apesar do Felipinho: quando tá valendo, pois, tá valendo.


O Galo gosta dessa situação crucial, esse ponto de não-retorno, também conhecido como a hora que a onça bebe água. Ou, ainda, quando a porca torce o rabo. O frigir dos ovos, se é pra continuar no mundo animal. O atleticano que mantenha em dia o check-up de sua víscera mais importante, o coraçãozinho machucado e carcomido por tantas desilusões e injustiças, ó Deus, ó vida, ó azar.


Desde 2013 que esta tem sido a receita: antes da fervura, é preciso cozinhar o atleticano em banho-maria. E veja bem, não estou a falar de nenhum banho-Cruzeiro, visto que em respeito às mulheres abandonei o apodo antes conferido ao torcedor adversário como se Maria fosse pior que João. Viva todas as Marias do mundo! Que venha o matriarcado.


(De qualquer maneira, impõe-se aqui um parêntese: o Cruzeiro de fato cozinhou o Galo em banho-Maria nos dois últimos confrontos, e acabamos queimados em nosso próprio caldeirão. Agora, no entanto, caso um e outro confirmem suas vagas na finalíssima, vale o escrito do Lemos que lê: “Quando tava lendo, tava lendo”. Ou os originais do poeta maior.)


Pobre Mequinha, para o qual essa máxima do tá valendo nem de fato se aplica, já que a gente ganha quando tá valendo e ganha também quando não vale nada. DataFred informa: nos últimos 30 confrontos entre Atlético e América, houve uma única derrota do Galo, pelo Brasileirão de 2020.


Carácolis, é um caso em que já se ultrapassou a barreira da freguesia, atingindo agora a categoria de cliente VIP com cartão fidelidade, cujos pontos podem ser trocados por milhas. Daqui a pouco vai ser possível ir à Marte na SpaceX do Elon Musk. Força, guerreiros!


Mais eu não vou dizer, porque senão esses caras levam os meus escritos para a preleção. Não pagam nenhum direito autoral, e de repente estou eu ali a cutucar o freguês com a vara curta, quando o que realmente desejo é que ele volte sempre.


Vou aproveitar o ensejo para reafirmar meu carinho pelo América. É de tal monta, que, num momento de desvario, dei ao meu filho uma camisa dessa desgraça. Falsificada, claro, porque também não vou dar dinheiro pra América, né? Explico aos fundamentalistas: joguei no futsal do Mequina por quase 10 anos.


Em minha bela carreira de leão de treino, destaco dois fatos relevantes: uma derrota em casa por WO (a Kombi não passou pra buscar o time) e nenhuma vitória sobre o Atlético, do que muito me orgulho. Aliás, vou retirar esse último item, porque isso não tem nada de extraordinário.


Mas como eu ia dizendo, nutro um certo carinho. Motivo pelo qual tive a ideia de anexar o América quando nos idos de 2012 tomamos o Independência como um Putin na Crimeia. A proposição foi bombardeada pelos americanos, que, vai entender, preferiam seguir americanos do que acordar Galo no dia seguinte. Uma gente estranha.


O fato é que o processo de anexação se deu não no modo beligerante do Putin, mas à moda do mineiro que vende queijos e possui bancos, o mineiro que come quieto, aquele que ao encontrar o gênio da lâmpada pediu dois queijos e uma namorada porque ficou com vergonha de pedir logo os três canastras. Enfim, a coisa foi na nossa toada, devagar com o andor, que o santo é de barro.


Então é assim: a cada vitória do Galo sobre o América, mais um pai americano – um avô, a bem da verdade – deseja que seu filho seja Galo. Afinal, o progenitor capaz de fazer do próprio filho um torcedor do América é caso para o Conselho Tutelar.


Vamo, Galo, pelo amor de Deus, o Felipinho quer ser penta outra vez! Como disse o velho Lobo, a gente vai ter que te engolir!

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