Jornal Estado de Minas

Isso aqui vai virar uma poeira só

No dia da tragédia, não estava fazendo nada. Estava na praça. Isso aqui, em frente à igreja, era uma praça. A Praça Santo Antônio. Não tinha nenhum banco, mas era bacana. O pessoal vinha aqui bater uma bola. Meu último trabalho foi há duas semanas, de ajudante de pedreiro em uma construção em Pedras (distrito de Mariana).

- Foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
A dona daquela casa, a Elizete, puxou na internet e viu o que tinha acontecido, mas ninguém estava acreditando. Em seguida o helicóptero chegou aqui, desceu no campo e avisou.

Aí todo mundo ficou ciente. Um chorava, outro gritava, saiu todo mundo correndo. Eles pediram para ir para a parte mais alta. Foi lá para a Rua Furquim, onde eu morava, com minha esposa e dois filhos, Emilly, de 2 anos e Erick, de 5.

- Foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
Ninguém imaginava que poderia acontecer isso. A maioria pensava que a lama ia subir sim, uns dois, três metros, mas não atingir igual atingiu. O que eu sinto é decepção. Decepção.
Todo lugar que olha está tudo destruído. A parte baixa aqui não dá para recuperar. É muita lama. Não tem nem como sobreviver numa poeira dessa quando secar. Esse período chuvoso até que dá porque não vê poeira. E quando secar essa lama? O pessoal da Samarco mesmo falou que isso aqui vai virar uma poeira só.


Se eles forem reconstruir a nova Paracatu lá para cima a maioria vai querer voltar. Eu, no caso, quero voltar. Se fizerem a casa de cada um do jeito que era já tá bom.
Nem mais e nem menos. Sou casado, tenho dois filhos e morar no hotel é ruim demais.

Eu queria esquecer tudo. Passar uma borracha em cima de tudo. Quando eu vou dormir lembro todo dia. Só pela zoeira do dia cinco, essa zoeirada que teve, todo mundo pensa até hoje. Tem muita gente que fica chorando, pensando, na zoeirada. Ninguém via nada porque estava escuro, só escutava o barulho..