“Quem é a Fernanda? Para falar de Fernanda, pergunte primeiro a mim. Você está no caminho certo. Era uma menina muito especial, como minha outra filha é. São especiais. Fernanda era uma menina não presa às coisas convencionais. Ela buscava liberdade.
Fernanda trabalhava no financeiro da nossa empresa, contas a receber e a pagar. Sempre estava com fone de ouvido trabalhando: 'Pô, Fernanda! Desse jeito não tem como trabalhar. Você está mexendo com o financeiro. Aí fica ouvindo esse fone de ouvido. Não tem condições'. Mas era o mundo dela. Era assim que ela sabia viver. Tanto é que ela abdicou de tudo isso, um conforto razoável, de trabalhar no negócio dela. Abdicou de tudo isso: ‘Ah pai. Estou indo para a Austrália’.
Foi para Austrália, ela e uma amiga dela. Ela falava, pai em inglês é did? Ah, não sei como é que é. Mandava: ‘Hi, dad!'. Mandava muito: 'Papi'. Italiano. Era muito carinhosa. Na hora de atravessar a rua, ela falava: ‘Vem cá, velhinho. Vamos atravessar’. A gente tinha papo sério. A gente tinha alguns atritos, coisa normal de família, mas era ponto, zero um por cento. Sempre respeitei a liberdade dela, sempre respeitei as vontades dela.
Fernanda pediu: 'Pai, faz um churrasco de despedida para nós, que vamos reunir todos os amigos em Curitiba'. Não pensei duas vezes: ‘Tranquilo. Vamos fazer’. Deixaram para revelar o sexo do bebê em Florianópolis, na confraternização. Ficamos cinco, seis dias na ilha. Ela e o Luiz vieram.
Quinta-feira, a levei ao aeroporto, em Curitiba, para fazer escala em São Paulo e ir para Belo Horizonte. O avião dela atrasou e mudaram o voo para sexta-feira. Na sexta-feira, chegou ao aeroporto e a companhia aérea disse que só poderia atendê-la às 17h.
Fernanda e Luiz tinham acertado de ir ao Inhotim na sexta de manhã. Negociou com a companhia e conseguiu voo para as 8h. Chegou ao aeroporto às 10h17. Passou uma mensagem: ‘Pai, já cheguei. Fique tranquilo’. Estava trabalhando, correndo para lá e para cá, em obra. Às 11h15 vi a mensagem dela e respondi: ‘Ok, filha! Se precisar de alguma coisa, me liga'. Ela não respondeu, só vi que ela leu a mensagem. Nesse meio tempo, estava deslocando de uma obra para outra e vi a notícia do ocorrido em Brumadinho. Nem sabia que Brumadinho era perto de Inhotim, mas disse à minha outra filha: 'A Fernanda está naquela área, veja se não tem alguma coisa acontecendo com ela.'
Ela estava muito espirituosa. Os dois estavam. Só peço que Deus tenha reservado um lugar muito especial para eles. Eles poderiam se perder depois. Eram muito especiais para nós. Lorenzo seria um príncipe. Pena que tudo se perdeu. Adaptei uma frase que dediquei à minha filha e também ao filho dela: ‘Fernanda e Lorenzo, não há verso, poemas ou rimas para demonstrar o quão é grande o meu carinho por vocês. Talvez suas partes humanas não possam ver nem ouvir, mas espero que suas almas possam sentir o quanto os amo. Papi, como ela me chamava, e o vovô’ ”.