Jornal Estado de Minas

NOVELA

Denise Fraga: "Estamos cheios de vícios"


Denise Fraga vê beleza nas fragilidades de Júlia, a cantora fracassada e com vício em álcool que interpreta em “Um lugar ao sol”. Na trama das 21h da Globo, a mãe de Felipe (Gabriel Leone) luta contra a doença, enquanto tenta lançar um trabalho musical. Mas jura ao filho que permanecerá sóbria. No entanto, a psicanalista Ana Virgínia (Regina Braga) pouco acredita na recuperação da filha, porque já escutou promessas semelhantes. Na entrevista a seguir, a atriz de 57 anos, detalha o processo de voltar às novelas e como se sentiu quando a pandemia chegou a ameaçar as gravações. Além disso, explica de que forma construiu uma personagem que é alcoólatra, mas também possui outras camadas. Denise também comenta o que acha da abordagem do tema no folhetim.





Como foi voltar às novelas em “Um lugar ao sol”?
Realmente, fazia muito tempo que não atuava em uma novela. Eu e a Lícia (Manzo, autora) tínhamos tentado trabalhar juntas, mas não deu certo. Não tinha feito antes porque os convites que tive calharam de acontecer quando eu estava, ao mesmo tempo, em cartaz no teatro. É um privilégio estar com esse elenco, com o Maurício (Farias, diretor), a Lícia e esse texto. No início, a gente achava que não conseguiria gravar e isso começou a apertar meu coração.

Por quê?
Porque é uma novela preciosa e cheguei a pensar que, talvez, não desse certo. Foi realmente uma grande vitória, uma guerrilha com todos os protocolos. E essa equipe é brilhante! A coisa foi sendo assimilada e tem uma particularidade com o texto da Lícia: os personagens falam sobre si de forma coerente, com clareza, e isso dá voz para muita gente. Principalmente para a Júlia, que tem esse dilema da adição. Fiquei emocionada com as cenas.

Como você se preparou para viver uma alcoólatra?
A característica do alcoolismo é tão forte que você resume a "viver uma alcoólatra", mas ela tem muitas outras camadas. Fui a algumas reuniões do A.A. (Alcoólicos Anônimos) e uma coisa incrível da novela é as pessoas conhecerem o trabalho de lá. Porém, a Júlia tem outro problema, além da adição. A relação com o Felipe, personagem do Gabriel Leone, é linda. Todo mundo tem um amigo a quem deu a mão, que tem de entender isso como uma doença, algo que precisa ser cuidado. Acho que todos nós deveríamos ir a essas reuniões do A.A., porque estamos cheios de vícios que não conseguimos deixar.





Como você se sente abordando esse tema?
A adição permeia a nossa vida. A gente não tem mais como falar de vício só de droga e bebida. Estamos mergulhados em vidas que gostaríamos que fossem diferentes. Júlia tem um otimismo trágico. Ela tenta, de toda maneira, falar que está tudo bem. E se enfia em enrascadas. É uma tragédia melancólica, cheia de humor e bem-escrita. O que eu acho bonito da personagem, mais do que tudo, é a relação que ela tem com a arte, a música. Acreditar que aos 50 anos vai gravar o álbum.

Como a psicologia está envolvendo a relação familiar da Júlia com o Felipe e a Ana Virgínia?
A minha personagem é filha de uma psicanalista que acabou se especializando em pacientes com adição, mas ela não consegue resolver o problema da filha com álcool. É bonito ver, nessa história, como a vida é móvel, como não tem solução e não há uma receita.