Até o início do ano que vem, é possível que o Bio Protetor, produto totalmente ecológico desenvolvido para lavouras de café, possa começar a ser oferecido comercialmente, facilitando o acesso pelos cafeicultores de Minas e do Brasil. O produto tem como base o fungo Claridosporium claridospoides, que ficou conhecido como fungo do bem por sua ação benéfica à qualidade do café, e é feito em biofábrica instalada dentro da Universidade Federal de Lavras (Ufla), no Sul de Minas, em parceria com a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig).
Mas enquanto não sai o registro do Ministério da Agricultura, para que possa ser vendido como qualquer produto no mercado, o projeto evolui e o Bio Protetor já vem sendo usado por fazendeiros do estado, que ao entrar em contato com os responsáveis por seu desenvolvimento, em Lavras, obtêm orientação especializada e uma amostra do produto. Esse ano, especificamente, devido ao outono/inverno mais úmido, época de frutificação do café, a procura aumentou.
Há mais de 20 anos, o Claridosporium claridospoides é estudado pela pesquisadora da Epamig e colaboradora na Ufla Sara Maria Chalfoun, engenheira-agrônoma, doutora em fitotecnia. Tudo começou em 1989, quando ela fazia trabalho para estabelecer o papel de micro-organismos sobre a qualidade do café e identificou a presença do Claridosporium em uma lavoura na cidade de Alfenas, no Sul do estado. “Já havia relatos desse fungo no Brasil desde 1957 em áreas em que o café tinha melhor qualidade. Mas sua presença apenas havia sido constatada.
Nesta fazenda, tive a oportunidade de separar os frutos que continham o fungo dos demais. Separei e comecei a estudá-lo”, conta. Além de pedir a um provador que tomasse separadamente o café que continha o fungo na lavoura, Sara começou a observar os efeitos na plantação.
Durante a pesquisa, Sara constatou que a simples presença do Claridosporium, associado aos frutos do café, inibia o desenvolvimento de outros fungos – aqueles que vulgarmente são conhecidos como mofo –, melhorando por isso a qualidade do café. “Ele produz um antibiótico e ainda exerce ação de parasitismo sobre os outros”, explica.
Segundo a pesquisadora, o Claridosporium claridospoides existe sempre que há lavoura de café, mas sua presença é mais acentuada em algumas lavouras do que em outras. E, além disso, há lavouras de onde ele já desapareceu, o que pode ocorrer devido a uma série de fatores, como o uso de determinados tipos de produtos pelo cafeicultor. Já as lavouras mais prejudicadas pelos fungos maléficos são as localizadas em regiões muito úmidas, principalmente próximo a rios e represas.
NA PRÁTICA E são justamente essas lavouras que mais necessitam do Claridosporium claridospoides, o fungo do bem. Pensando nisso, Sara teve a ideia de fazer um produto derivado do Claridosporium para que ele fosse inoculado nas lavouras, inibindo o desenvolvimento de outros fungos e melhorando a qualidade do café. “A partir do ano 2000, começou a haver um movimento das instituições de pesquisa e ensino para partirem também para o desenvolvimento de alguns produtos de origem biológica. Então passamos a receber suporte financeiro para avançar nisso”, lembra Sara. Assim, em 2007, foi possível viabilizar um projeto de inovação para a criação de uma biofábrica dentro da Ufla, em parceria com a Epamig. Paralelamente foi criada uma startup, a Tbio, para dar suporte à parte burocrática.
Desde então, o Bio Protetor começou a ser fabricado.
“A gente orienta o produtor, vai até a fazenda, colhe amostra com o fungo e produz o inóculo (que é o fungo multiplicado) para ele. Nas fazendas onde o Claridosporium já desapareceu, fazemos sua reintrodução”, explica. Com a suspensão concentrada em mãos, o produtor é orientado sobre como aplicá-la na lavoura. E então é só aguardar a proliferação do fungo do bem, que tem tom esverdeado e um aspecto semelhante à camurça.
CHUVAS Além dos terrenos tradicionalmente úmidos, sofrem a ação de fungos maléficos as regiões afetadas por chuvas durante o período de frutificação, que vai de março/abril a setembro/outubro. “Estamos no pico da frutificação. O clima está muito instável e em Minas estamos tendo um outono/inverno úmido”, observa Sara.
Caso do cafeicultor Norberto Gonçalves, que tem fazenda em Patrocínio, no Alto Paranaíba. “Recentemente, choveu aqui. Isso é muito prejudicial para o cafeicultor na época da colheita, pois faz com que apareçam fungos maléficos que prejudicam a qualidade do café”, afirma Norberto, que procurou a equipe de Sara, em Lavras, em busca de manter a qualidade de seu café por meio das colônias do Claridosporium claridospoides. “Esse fungo exerce uma espécie de proteção no grão do café e não deixa os outros proliferarem”, continua. Norberto ainda não pode atestar o resultado porque ainda não colheu e consequentemente não provou o café. Mas conta que já constatou a formação de colônias do Claridosporium na lavoura.
REGISTRO Segundo a administradora e sócia da Tbio Samantha Bretas, o processo para obtenção do registro no Ministério da Agricultura está encaminhado e em cerca de seis meses tem tudo para essa etapa ser finalizada. Saindo o registro, o produto estará liberado para comercialização. Samantha acrescenta que a Tbio também está buscando parcerias com empresas privadas e tentando recursos com fundos de investimento para que o Bio Protetor possa ser comercializado em larga escala. Atualmente, o produtor que busca ajuda na Ufla não paga pelo produto, apenas pelo serviço de consultoria que é prestado pela equipe da pesquisadora Sara Chalfoun.
Além do Bio Protetor, a biofábrica localizada na Ufla tem uma linha voltada para a cadeia produtiva do café, como produtos que ajudam no processamento do fruto, inoculante que facilita a assimilação do fósforo pela planta, bioinseticidas e biofungicidas.
Bio Protetor pode ser encontrado na forma líquida ou em pó. Ele ainda não é comercializado, pois depende de autorização do Ministério da Agricultura.