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Estado de Minas

Oceanos viram depósito de plástico

Estudo inédito indica que, por ano, 13 milhões de toneladas métricas do material são lançadas ao mar por 192 países costeiros, inclusive o Brasil


postado em 13/02/2015 00:12 / atualizado em 13/02/2015 13:08

Paloma Oliveto

Brasília – Maiores produtores de oxigênio do planeta, os oceanos estão se transformando em um grande lixão. Todos os anos, quase 13 milhões de toneladas métricas de plástico são despejadas no mar por cada um dos 192 países costeiros. São garrafas, sacolas, fraldas, brinquedos e embalagens, entre outros descartes, que enfeiam a paisagem, sufocam e matam a enorme biodiversidade marinha. Quanto maior a produção de plástico, mais desse material é lançado nas águas. Segundo um levantamento publicado na edição de hoje da revista Science, nada menos que 270 milhões de toneladas métricas de plástico foram geradas pela indústria em 2010, um número que deve aumentar consideravelmente até 2025, quando a população mundial ultrapassará os 8 bilhões.

Os autores do estudo explicaram que já foram feitas muitas estimativas sobre resíduos sólidos nos oceanos, mas esta é a primeira vez que se aplica um modelo preciso, que levou em consideração variáveis fornecidas pelo Banco Mundial e pelos governos dos países analisados. Para avaliar a quantidade de plástico lançada ao mar, os pesquisadores contaram a população total, a vivendo no raio de 50 quilômetros da costa, a produção industrial de plástico e os resíduos plásticos em 2010.

Também foi feito um ranking dos 20 países que mais acomodam incorretamente os descartes desse material. O Brasil figura em 16º. Em primeiro, vem a China que, com uma população costeira de 263 milhões, registrou, em 2010, uma produção de um quilo de lixo plástico por pessoa diariamente. No ano avaliado, 27,7% dos resíduos do material foram armazenados de forma inadequada; e entre 1,32 e 3,53 milhões de toneladas métricas pararam no oceano.

No Brasil, a geração de lixo plástico por pessoa ao dia foi de 1,03 quilo, sendo que se descartou incorretamente 1,5% do resíduo; e de 0,07 a 0,1 milhão de toneladas métricas acabou no Atlântico. Mesmo tendo a maior produção de lixo plástico por pessoa – 2,58 quilos por dia –, os Estados Unidos estão em último lugar da lista porque apenas 0,9% do resíduo recebe descarte inadequado e, consequentemente, a quantidade de plástico que vai para o oceano é menor: de 0,04 a 0,11 milhão de toneladas métricas por ano.

Submersos

Em todo o mundo, são 8 milhões de toneladas métricas inundando e imundando os mares anualmente. “Essa quantidade é o equivalente a encontrar cinco sacolas de compra cheias de plástico a cada passo que você der no litoral dos 192 países que avaliamos”, exemplifica Jenne Jambeck, pesquisadora da Universidade da Geórgia e principal autora do estudo. Ou uma área equivalente a 34 vezes o tamanho de Manhattan com sacos de lixo. “E isso é apenas uma pequena parte do problema. Das até 12,7 milhões de toneladas métricas que caem no oceano, só detectamos de 6.350 a 245 mil toneladas métricas flutuando na superfície. Isso quer dizer que há uma quantidade enorme de plástico repousando no fundo do mar, nas praias desses 192 países”, observa.

Para ela, está na hora de os países incluírem ações de mitigação do lixo oceânico na lista de prioridades. “Como a água doce é essencial para a saúde, o tratamento da água do mar vem em último lugar – quando vem. Quase ninguém tem políticas públicas nesse sentido. Os resíduos sólidos não parecem incomodar. As pessoas pegam um monte de lixo e simplesmente deixam no canto de seu terreno. A ideia de fazermos esse levantamento foi justamente mostrar a todos o tamanho do problema e fornecer subsídios para os países desenvolverem suas ações”, observa Kara Lavander Law, professora da Associação de Educação Marinha de Massachusetts e também autora do estudo.

De acordo com o artigo, a poluição por plásticos no oceano foi citada pela primeira vez na literatura científica no início da década de 1970. “Essa questão é um problema relativamente novo e, para piorar, a própria questão do manejo do lixo é algo extremamente recente”, observa Jenne Jambeck. Enquanto o material começou a ser consumido industrialmente entre 1930 e 1940, as soluções para dejetos sólidos só entrou para a agenda de infraestrutura de países desenvolvidos das Américas, da Europa e da Ásia em meados dos anos de 1970. Antes disso, os despejos urbanos eram simplesmente amontoados em lixões sem qualquer tipo de tratamento nem destinação, como reciclagem.

 

Ainda em discussão
De acordo com o a Gerência Costeira do Ministério do Meio Ambiente (MMA), o “lixo marinho é um crescente problema no país, e vem sendo pesquisado e discutido em algumas esferas (…), mas o país ainda não tem políticas públicas direcionadas especificamente para essa questão”. O MMA apoia um projeto da Universidade Federal da Bahia para criar um banco de dados sobre esse tipo de resíduo. 

 

Homem poluía antes da Revolução Industrial

No século 16, durante a conquista da América do Sul, o Império Espanhol forçou os incas a extraírem prata das minas de Potosí, onde hoje é a Bolívia. Lá, estava a última grande fonte do metal no mundo. Esse povo já sabia como refinar a prata, mas, em 1572, os espanhóis introduziram uma tecnologia que intensificou a produção e fez subir pelos Andes, pela primeira vez, finas nuvens de mercúrio.

Os ventos levaram parte dessa poluição ao Peru, onde poucos sobreviventes habitavam o povoado de Quelcacaya. No vilarejo, por centenas de anos, o resíduo ficou enterrado sob camadas de neve e gelo, até ser resgatado por cientistas da Universidade Estadual de Ohio em 2003.

Na edição on-line da revista Pnas desta semana, eles reportaram a descoberta de uma camada do poluente dentro de um bloco congelado, datando de mais de 500 anos. É um dos poucos lugares do planeta em que a poluição da era pré-industrial provocada pelo homem pode ser estudada. “Essa evidência suporta a ideia de que o impacto humano no meio ambiente já era praxe mesmo antes da revolução industrial”, disse Paolo Gabrielli, pesquisador do Centro de Pesquisa Climática da Universidade Estadual de Ohio.

Lonnie Thompson, professor de ciências da terra na mesma instituição e coautor do estudo sugeriu que investigações mais aprofundadas poderão ajudar a compreender melhor o que acontecerá com a poluição que circula atualmente na atmosfera. Para ele, Quelccaya é uma “pedra de Roseta” para a história climática do planeta.

As amostras foram retiradas de um bloco de gelo que se formou ao longo de 1,2 mil anos, à medida que a neve se depositava nos andes peruanos. Camada por camada, o gelo capturou substâncias químicas do ar. Com o método de espectrometria de massa, que mede a quantidade e o tipo de elementos presentes no gelo, os cientistas constataram que o período da colonização coincide com o acúmulo de substâncias poluentes pesadas, provenientes da extração massiva da prata. 

 

Impacto geral

Embora o estudo divulgado na Science não tenha se concentrado nos efeitos do lixo plástico na biodiversidade marinha, pesquisas anteriores documentaram o impacto desse lixo sobre espécies diversas, de minúsculos zooplânctons a enormes baleias. Animais podem ficar presos e engolir os resíduos – uma pesquisa examinou o conteúdo estomacal de 144 pássaros marinhos, como o albatroz, e descobriu peças plásticas em 82 deles.

Além disso, objetos e embalagens servem de transporte oceânico para espécies invasoras, com potencial de provocar distúrbios em ecossistemas e prejudicar a saúde humana. Ao se degradar, o plástico libera resíduos tóxicos que, ingeridos por peixes e outros frutos do mar, podem ser consumidos pelos humanos.

Encontrar uma solução para o problema não é fácil, alertaram os autores do estudo. “Precisaremos de uma combinação de esforços locais e globais. Começa desde a campanhas de educação e sensibilização populacional a técnicas de manejo de lixo. Isso gasta tempo e dinheiro, mas é preciso pensar que também poderá gerar muitos novos empregos e oportunidades de inovação econômica”, destaca Jenne Jambeck.

Roland Geyer, professor de ciências ambientais e manejo da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara e coautor do estudo, conta que não há meios eficazes de limpeza do oceano. “A remoção em larga escala de plástico não é fácil, rápida nem custo-efetiva. Simplesmente não nos parece possível”, diz.

“Então, o que nos resta fazer é evitar que o plástico chegue aos oceanos, por meio de um manejo mais eficaz em terra, mais reuso e reciclagem, melhorias no design e substituição do material”, aposta. (PO)

 


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