Vilhena Soares
Alecia Carter, pesquisadora do Departamento de Zoologia da Universidade de Cambridge e uma das autoras do trabalho, explica que o estudo surgiu como continuidade de uma pesquisa anterior que avaliou o comportamento dos babuínos quando estão sozinhos. “Realizamos testes individuais e vimos que os animais mais tímidos aprendiam com mais dificuldade que os de perfil mais agitado. Mas, para termos certeza, era necessário testar os babuínos quando eles estavam em grupo. Era preciso observar se a presença de um indivíduo dominante não afetaria a resposta de um animal subordinado quando eles interagissem com a comida”, explica Alecia.
Para tirar as dúvidas, a pesquisadora e seus colegas estudaram animais que pertenciam à Sociedade Zoológica do Projeto Baboon Tsaobis, em Londres. Eles observaram a personalidade dos animais individualmente, anotando suas características temperamentais, para depois analisá-los em grupo.
Após três anos de análises, a equipe concluiu que os animais mais ativos (inquietos e agitados) não só obtinham mais sucesso nas atividades relacionadas à alimentação como também eram mais capazes de ensinar os “companheiros” de perfil mais calmo a ter acesso durante as tarefas. Alecia Carter acredita que a personalidade dos animais refletiu diretamente no desempenho. “É possível que, apesar de ver outro babuíno resolver a tarefa, os macacos tímidos e calmos não fossem inteligentes o suficiente para resolver esses desafios novos. Mas as atividades eram muito simples. É bem mais provável que os tímidos fossem muito contidos, o que influencia diretamente essa capacidade de apendizado”, avalia.
Na opinião da cientista, o experimento ilustra que as características individuais dos animais podem ter um peso maior no desempenho de tarefas. “Esses resultados são significativos, pois sugerem que, em relação a tarefas cognitivas, os animais podem ter dificuldade de executá-las não porque não são inteligentes o suficiente, mas simplesmente por serem muito tímidos ou nervosos para interagir. Diferenças individuais na aprendizagem social que são relacionadas à personalidade devem, portanto, ser levadas em conta quando se estuda sistematicamente a cognição animal”, completa.
Particularidades
A suspeita de que características como essas influenciam o desempenho de babuínos em tarefas de aprendizado já havia sido levantada por outros pesquisadores, mas o trabalho do Reino Unido é um dos primeiros a usar o termo personalidade, geralmente utilizado no estudo de humanos, em uma investigação com animais, aponta Maria Adélia Oliveira, primatóloga e professora de comportamento animal da Universidade Rural Federal de Pernambuco (URFPE). “Considero uma grande coragem desses cientistas utilizar um termo que não era usado para definir características animais e afirmar que ele pesa na difusão de informação e no aprendizado social”, destaca ela, que não participou do estudo.
A brasileira também acredita que o método usado pelos cientistas mostra como as características particulares dos animais podem pesar em seu comportamento social. “A espécie estudada é bastante complexa. Penso que esse tenha sido um motivo que pesou para ser escolhida.
Maria Adélia acredita que estudos como esse podem mostrar semelhanças mais fortes entre macacos e humanos. “Vejo cada vez mais pontos parecidos entre humanos e animais. Sabemos, com base em outros trabalhos, que crianças mais tímidas se sentem reprimidas com relação à realização de tarefas. Esse tipo de transmissão de cultura é um ponto estudado por muitos anos na antropologia, e que sempre vemos ser trabalhado antes nos animais e depois nos humanos. Nesse trabalho, temos uma nova ordem, de trás para frente, que busca por características humanas nos macacos”, completa.
Para Alecia, o estudo pode ajudar na compreensão do comportamento social de animais, fornecendo dados relacionados à evolução.
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