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Estado de Minas

Brasileiros arriscam ganhar peso para conseguir fazer a cirurgia bariátrica

Em busca do sonho de ser magro, muitos brasileiros se impuseram uma meta maluca


postado em 24/08/2011 06:00 / atualizado em 24/08/2011 08:54

(foto: Arte D.A Press)
(foto: Arte D.A Press)
A dieta consistia em comer de duas em duas horas, mas, em vez daquele pão integral ou da fruta, a comunicóloga Josiane Ferreira, de 31 anos, se entupia de calorias. Em vez de uma fatia de pizza, comia oito. No lugar de um copo de refrigerante, tomava um litro. Sanduíches e massas eram até a boca aguentar. Tudo isso porque Josiane, que pesava 115 quilos e tem 1,65m de altura, precisou se tornar obesa mórbida para ter o Índice de Massa Corpórea – o IMC, que é o peso dividido pela altura ao quadrado – de 40kg/m², como exigia seu plano de saúde para cobrir a cirurgia bariátrica.

"Em um mês, engordei 10 quilos. Era um sonho. Comia com vontade tudo o que via pela frente", conta a comunicóloga. Assim como ela, muitas pessoas, na maioria dos casos mulheres jovens, têm enfrentado uma corrida desenfreada para ganhar quilos e mais quilos e, com isso, alcançar o IMC de 40kg/m² ou 35kg/m² para estar aptas para a cirurgia de redução de estômago feito pelo convênio médico ou pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Para especialistas, o método, não recomendado, é uma tragédia anunciada.

Para somar à preocupação, nos próximos dias a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) bate o martelo sobre a venda de inibidores de apetite no país. Se a agência optar pela proibição e os remédios forem retirados do mercado, cirurgiões e endocrinologistas temem que a operação se torne a primeira opção de quem quer perder peso mais rapidamente e o método de "engordar para emagrecer" se transforme em uma epidemia entre os brasileiros. O Brasil só perde em operações bariátricas para os Estados Unidos, que têm o maior volume de gordos no planeta – lá, 150 mil entraram na "faca" no ano passado. Por aqui, 60 mil brasileiros diminuíram o estômago no mesmo período. Na Itália, em terceiro lugar, foram 5 mil.

Mas, por que uma pessoa que pesa mais de 100 quilos e quer emagrecer come para engordar? Trata-se de uma conta indispensável para reduzir o estômago sem ter que pagar um procedimento particular, que pode custar até R$ 25 mil. Os convênios e o SUS só cobrem a intervenção se o paciente tiver o IMC recomendado pela Federação Internacional para Cirurgia da Obesidade (IFSO) e adotado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que definiu as regras: a cirurgia é indicada para pacientes com obesidade mórbida (IMC a partir de 40kg/m²) e obesos (IMC entre 35kg/m² e 39kg/m²) que sofrem de doenças relacionadas à própria obesidade, como diabetes e hipertensão. Também há a determinação de que os "candidatos" realizem no mínimo dois anos de tratamento para emagrecer, com uso de remédios e acompanhamento médico. Apenas quando tudo isso falhar deve-se partir para o recurso mais radical.

Sem os emagrecedores no mercado, o diretor clínico do Instituto Mineiro de Endocrinologia, Geraldo Santana, teme o pânico entre aqueles que precisam do remédio. "O risco é grande de muitos começarem a engordar para enfrentar o bisturi. Muitas pessoas não aceitam estar acima do peso", comenta, dizendo que aqueles que optam por ganhar os quilinhos não passam pelos consultórios dos endrocrinologistas. "Se essa forma de comer sem parar já ocorre com a venda de inibidores e sem ajuda médica, imagine o que não vai ocorrer sem eles? É perigoso demais. Por isso, a Anvisa não deve proibir, deveria fiscalizar a comercialização dos medicamentos", diz.

O receio é o mesmo de Galzuinda Figueiredo Rei, titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (Sbcbm) e responsável técnica de cirurgia bariátrica da Santa Casa de Belo Horizonte. De acordo com ela, estimam-se que apenas em Minas Gerais haja 3 milhões de obesos mórbidos para os quais a cirurgia tem indicação. Sua maior preocupação é de que não há no país uma política pública nacional de combate à obesidade. "Não existe uma cultura para estimular o emagrecimento saudável. Faltam campanhas. A cirurgia deveria ser o último recurso, e não a primeira opção", diz. Ela aposta que na saúde suplementar a tendência de ganhar peso é maior. "No SUS, há filas imensas de pessoas que aguardam a cirurgia. Por isso, não acredito que quem quer emagrecer por estética vai enfrentar essa espera".

Psicológico
A psicóloga familiar sistêmica Cláudia Prates, que faz avaliações em pacientes que vão se submeter à operação de estômago, diz que aquele que engorda para emagrecer come pensando que não será responsável pela conquista de peso, o que acaba sendo prazeroso para ele. "É um álibi para o próprio descontrole. Conheço muitas pessoas que se mantêm magras com medicamentos e, se eles forem proibidos, tenho certeza de que vão recorrer à cirurgia. Vai entrar em pauta o juízo da medicina", opina.

Mas, há quem defenda que, independentemente da decisão da Anvisa, o método de adquirir mais peso para se submter à operação não se altera. De acordo com o professor de clínica e endocrinologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Davidson Pires de Lima, a prática ocorre independentemente da liberação ou não de medicamentos. "É uma busca dos jovens por uma solução mágica. O inibidor não faz emagrecer por si só; tem que ter atividade física e boa alimentação. O que é necessário é haver uma mudança de comportamento."


Para atingir o índice para operar, Josiane comia oito fatias de pizza(foto: Marcos Avellar/EM )
Para atingir o índice para operar, Josiane comia oito fatias de pizza (foto: Marcos Avellar/EM )
‘A cirurgia foi boa para mim"
Ela jura que não foi por vaidade que, aos 23 anos, teve que engordar 10 quilos para enfrentar o bisturi. "Como meus exames de colesterol e glicose já estavam alterados, o médico me recomendou engordar para alcançar o ICM e passar pela cirurgia paga pelo convênio. Comia sem remorso. Antes, já tinha feito todas as dietas possíveis para emagrecer e nada adiantava. Bastava relaxar que engordava três vezes mais. A cirurgia foi boa para mim", diz, apostando que se os remédios para emagrecer forem proibidos muitas pessoas seguirão seus passos. "Vai aumentar a busca pela operação. É um meio muito rápido de emagrecer. Hoje em dia, ninguém quer fazer esforço. Mas o pós-operatório não é fácil. Fiquei três meses sem comer sólidos."

 

OUTROS DEPOIMENTOS

A. R. D. - 26 ANOS

"Durante seis meses me entupi de doces para chegar ao IMC 40. Meu corpo foi ficando pesado, cansado e eu quase não saía de casa. Fiquei só com duas mudas de roupa que ainda me serviam. Em quatro meses, engordei 12 quilos. A partir daí, o peso estacionou. Bateu desespero, custei dois meses para ganhar os dois quilinhos que faltavam. Mas consegui, hoje peso 53."

F. F. S. - 22 anos

"Cheguei a comer um ppacote de macarrão no almoço. A compra do mês durava umdia. Comia 30 barras de chocolate diariamente. Em dois meses, engordei os 10 quilos que me faltavam. Fui me entupindo de pizzas até passar dos 100 para os 113 quilos. O melhor era saber que depois ia ficar magra."

 

A OPERAÇÃO

A cirurgia bariátrica, também conhecida como cirurgia da obesidade, cirurgia metabólica ou mais popularmente como redução De estômago, reúne técnicas com respaldo científico destinadas ao tratamento da obesidade e das doenças associadas ao excesso de gordura corporal ou agravadas por ele. O conceito metabólico foi incorporado há cerca de seis anos pela importância que a cirurgia adquiriu no tratamento das comorbidades (doenças associadas à primeira), como o diabetes e a hipertensão.

INDICAÇÃO

A cirurgia da obesidade é indicada para pacientes que se encaixam em parâmetros determinados pelo Índice de Massa Corpórea (IMC):
- acima de 40kg/m²
- entre 35kg/m² e 39kg/m² na presença de doença associada

EXIGÊNCIAS

Além disso, o paciente deve ter tentado perder peso pelo tratamento clínico (dietas, atividades físicas, emagrecedores) por pelo menos dois anos, sem sucesso. Essa exigência não se aplica a casos de pacientes com IMC maior que 50kg/m² e para pacientes com IMC entre 35kg/m² a 49kg/m² comdoenças em evolução progressiva ou risco elevado. Não há restrições em relação à idade, para pessoas entre 18 e 65 anos. Em adolescentes e idosos, considerados casos de exceção, recomenda-se uma avaliação detalhada, feita pelo cirurgião e por uma equipe multidisciplinar.

 


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