Jornal Estado de Minas

Megatempestade em Saturno é captada com riqueza de detalhes pela 1ª vez

Nuvens carregadas de amônia encobriram quase todo o planeta, atingindo a impressionante extensão de 66 mil quilômetros

Paloma Oliveto

Imagem mostra a tempestade em formação. Cientistas ainda não sabem dizer porque ela surgiu antes do esperado - Foto: ESO/DivulgaçãoTudo começou com uma pequena mancha branca observada no pacato Hemisfério Norte de Saturno. Mas o que era só um pontinho cresceu em poucos dias, ficando com diâmetro semelhante ao da Terra. Nasceu um “rabo” feito de nuvens brancas e, dois meses depois, quase todo o planeta estava tomado de névoa. Nos últimos 130 anos, apenas cinco eventos semelhantes foram detectados, mas nunca de forma tão detalhada, como descrito na edição desta segunda da revista especializada Nature.

A Grande Mancha Branca, como os cientistas chamam esse fenômeno, toma conta de Saturno a cada 30 anos. “A diferença agora é que, embora o evento esteja dentro da sazonalidade esperada, ocorreu antes do que imaginávamos”, diz ao Estado de Minas Agustin Sánchez-Lavega, pesquisador do Departamento de Física Aplicada da Escola Técnica Superior de Engenharia da Universidade do País Basco, um dos autores do estudo. De acordo com ele, telescópios em terra detectaram os primeiros sinais do evento em 5 de dezembro do ano passado, às 21h05 (horário universal), quando um quase invisível ponto luminoso emergiu de Saturno. “Isso ocorreu quase simultaneamente à detecção da atividade elétrica observada pelo instrumento de rádio de ondas de plasma da sonda Cassini”, completa.

O fenômeno que culminou com a mancha branca foi uma tempestade gigantesca, que tomou conta de quase todo o planeta. Para comparar, é como se uma chuva torrencial atingisse a Terra inteira durante meses, lembrando que a massa de Saturno é 95 vezes maior que a terrestre. Somente o centro da tempestade media 6,6 mil quilômetros, com comprimento total de 66 mil quilômetros. As imagens capturadas pela Cassini mostram uma nuvem branca avançando sobre o planeta. Segundo Sánchez-Lavega, a coloração se deve aos cristais de amônia que se condensam em vapor.

“Nada do que já se viu na Terra aproxima-se desse evento em magnitude”, conta Lavega ao Estado de Minas. De acordo com ele, essa foi a sexta tempestade de forte intensidade registrada desde 1876, sendo que a última ocorreu em 1990. O pesquisador afirma que se algo semelhante acontecesse por aqui, certamente a Terra seria dizimada.

Estratosférico O fenômeno violento, que começou como uma perturbação normal, chegou até a estratosfera, a camada mais alta da atmosfera. “Na Terra, a estratosfera inferior é onde os aviões comerciais geralmente voam, com o objetivo de evitar tempestades severas, que podem causar grande turbulência”, disse ao site da Agência Espacial Americana (Nasa) Brigette Hesman, pesquisadora da Universidade de Maryland em College Park. “Se voássemos em Saturno, essa tempestade atingiria uma altura tão grande que seria praticamente impossível evitá-lá.”

Por causa da violência, a composição da atmosfera do planeta mudou. O espectrômetro infravermelho do supertelescópio VLT, localizado no Chile, observou grandes volumes de amônia ao redor de Saturno e detectou a presença de acetileno e fosfina, elementos relacionados ao movimento atmosférico. Segundo Leigh Fletcher, as descargas elétricas decorrentes da tempestade emitiram ondas de rádio com intensidade 10 mil vezes maior do que o normal.

Convidado pela Nature para comentar as observações da sonda Cassini, o físico Peter Read, da Universidade de Oxford, disse que é a primeira vez que uma tempestade extraterrestre é tão bem documentada. De acordo com ele, o artigo publicado na revista especializada fornece boas pistas sobre a formação e a consequência de fenômenos parecidos. “As observações indicam que nuvens brancas brilhantes são produzidas quando uma pluma de partículas de gelo aquecida injetam amônia na troposfera. Os autores do artigo estimam que a velocidade dos ventos seja de muitos metros por segundo”, diz.

Mas, para Read, alguns aspectos do fenômeno precisam de mais explicações como, por exemplo, a latitude incomum onde surgiu a tempestade, um pouco acima da parte mediana do planeta. “E por que a tempestade ocorreu antes do que se imaginava? Uma possível explicação é a estrutura das nuvens de amônia, que podem ter exercido fortes pressões na atmosfera”, acredita. “Questões como essas serão esclarecidas com modelos mais sofisticados e futuras observações. Será um desafio para a próxima geração de modelos atmosféricos predizer quando e onde nuvens como essas voltarão a aparecer”, diz.

Investigação

A sonda Cassini, uma parceria entre a Nasa e a Agência Espacial Europeia, tem como missão investigar Saturno. Ela entrou na órbita do planeta em 2004 e fez importantes descobertas sobre sua atmosfera, além de produzir mais de 20 mil fotos detalhadas até agora.

Flagra na Via Láctea

A maior câmera digital já construída para uma missão espacial, um verdadeiro mosaico de detectores eletrônicos, servirá como o extremamente sensível “olho” da missão da Gaia Galaxy, da Agência Espacial Europeia. Sua função será mapear – a partir de 2013 e durante cinco ano – um bilhão de estrelas na Via Láctea e outras galáxias. Para detectar os corpos distantes, a nave vai levar 106 dispositivos de carga acoplada (CCDs), versões avançadas dos chips de câmeras digitais comuns. Cada detector (foto) mede 4,7cm X 6cm e é mais fino que um fio de cabelo. A Gaia vai operar a 1,5 milhão de quilômetros da Terra e pretende revelar a composição, a formação e a evolução da Via Láctea, a partir de uma amostragem de 1% das estrelas da galáxia. A nave também deve investigar galáxias distantes e quasares.