Jornal Estado de Minas

Como isto veio parar na minha água?

- Foto: Renato Weil/Estado de Minas - 09/02/2004


Etinilestradiol, dipirona sódica, clofibrato.... Você sabia que estas substâncias (e muitas outras) podem estar fazendo parte da sua “dieta” mesmo que você não queira e não precise delas?

O etinilestradiol é um dos princípios ativos mais utilizados em contraceptivos orais, a dipirona sódica é empregada como analgésico e antitérmico e o clofibrato é um fármaco usado para reduzir as taxas de colesterol. Claro que os medicamentos têm sua utilidade, mas o que acontece se uma pessoa que não tem problema de colesterol começar a tomar pequenas doses de clofibrato? E se uma mulher continuar ingerindo etinilestradiol após decidir engravidar? Qual a conseqüência para um homem se ele tomar etinilestradiol? A cocaína é uma das muitas substâncias que podem estar na água nossa de cada dia. É isso mesmo!

Na verdade, existem milhares de substâncias dissolvidas na água. Algumas delas estão presentes em quantidades muito pequenas e não se sabe ao certo os danos que podem causar à saúde humana e por isso que há pesquisadores no mundo inteiro estudando o assunto.

Com o avanço tecnológico, os instrumentos que fazem análise da água estão cada vez mais sofisticados e são capazes de determinar um número cada vez maior de substâncias mesmo que elas estejam presentes na água em quantidades muito pequenas. Foi por meio destes instrumentos, por exemplo, que um trabalho desenvolvido na Espanha permitiu estimar o número de doses diárias de cocaína consumida em Barcelona, pela análise da presença desta droga no esgoto da cidade.

O que está no nosso esgoto pode dizer muito sobre nossa rotina diária! Vejamos um outro exemplo. Sempre evito remédios, mas na semana passada peguei uma gripe daquelas, tive febre e acabei tendo que tomar um antitérmico a base de dipirona sódica (após uma insistência carinhosa da minha esposa ao ver meu estado lastimável). Se alguém fizesse análise do esgoto do apartamento onde moro poderia verificar a presença de dipirona e concluir que algum morador estava tomando analgésico/antitérmico.
- Foto: Diomarcelo Pessanha/Folha da Manha.15/01/07

Não é possível deixarmos de tomar remédios (sempre com prescrição médica), mas podemos agir para evitar a poluição e a contaminação dos nossos mananciais. Uma ótima ação neste sentido é cobrar ações efetivas de nossos vereadores, prefeitos, deputados, governadores, senadores e presidentes para que o esgoto não seja apenas coletado, mas também tratado.

Não custa lembrar que a água que temos hoje no planeta é a mesma que “deu banho em Cleópatra e passou pelo estômago de César”: aquela água apenas evaporou, virou chuva, infiltrou no solo, transformou-se em água subterrânea, formou rios e lagos, mas continua a mesma água, já que o ser humano não fica aí criando H2O nos laboratórios.

Como mencionei minha esposa três parágrafos acima, e como hoje, 1º de dezembro, dia que estou escrevendo este texto, é aniversário dela, vou aproveitar para agradecê-la pelo amor e pela dipirona sódica e desejar “Feliz aniversário!”. Aproveito também para deixar meus votos de “Feliz Natal e Feliz 2009!” a todos os leitores.

* Valter Lúcio de Pádua é professor do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG

 

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