Apoio na hora certa

Para Patrícia Regina Henrique Peles, psicóloga clínica e professora de altas habilidades e bem-dotados do curso de pedagogia da Universidade Salgado Filho, a menina Júlia Medeiros recebeu estímulo dos pais desde bebê e, com certeza, será motivada durante a vida a desenvolver sua superdotação em lingüística. Mas nem todos têm a sorte dela. “Algumas crianças e adolescentes são facilmente chamadas de hiperativas, indisciplinadas, por não terem recebido apoio na hora certa.”

Integrante do Conselho Nacional dos Superdotados e consultora sobre o tema, Patrícia Pele define: “Superdotado é um indivíduo que tem altas habilidades em áreas diferenciadas, como na inteligência lógico-matemática, lingüística, interpessoal, intrapessoal e espacial, que são desenvolvidas a partir de interações com o meio ambiente e por meio de uma educação diferenciada. Esse talento, porém, se esvai se não for estimulado, o que exige melhor capacitação dos professores e cuidados especiais”, explica.

Sem capacitação, professores das redes públicas e particulares, na maioria das vezes, não percebem no aluno essa alta habilidade, já que ele pode apresentá-la em uma determinada disciplina e fracassar em outra, até com notas baixas. “Essa oscilação confunde o professor, que não pensa em superdotação, pois o aluno é ruim em outras matérias. Muitas vezes, ele é supercriativo, com resultados acima da média nessa área, mas tem dificuldade de aprendizagem em outra, então, passa despercebido.”

A família também é responsável. “Muitos pais põem expectativa em cima de uma determinada área, esperando que o filho seja superdotado, mas ele revela, por exemplo, alta habilidade cinestésica corporal para a dança. Como os pais não valorizam essa superdotação, não permitem o desenvolvimento do talento.”

VALORIZAÇÃO
Exemplos, de acordo com Patrícia, não faltam. Ela conta o caso de um menino de 11 anos, com alta habilidade no xadrez, atividade valorizada pelos pais dele. O menino treina todos os dias e hoje é um dos campeões nacionais de xadrez. Outra paciente dela é superestimulada pela família na leitura e na escrita. “Aos 5 anos está terminando a primeira série e vai para a segunda, em 2009.”

Ela lembra aos pais que toda criança superdotada tem necessidade de acompanhamento psicoterápico, pois, se não for devidamente acompanhada, pode apresentar desajustes emocionais, como se sentir excluída da turma, passar a freqüentar rodas de pessoas mais velhas, sem ter maturidade para essa convivência. Também pode ser estigmatizada como superdotada e esconder as suas habilidades.

Patrícia mostra a diferença entre um superdotado e um gênio. Mozart e Albert Einstein, por exemplo, foram gênios. Pessoas com conhecimento que vão provocar mudanças no mundo. Pelé, por exemplo, é um talento, um exímio jogador, mas tem problemas de dislexia, dificuldade de leitura, na decodificação dos textos. Tom Cruise também é disléxico, mas um ator superconsagrado. “Quem não se lembra do filme Gênio indomável, de 1997, com Matt Damon e Ben Affeck? O gênio é o jovem órfão Will, faxineiro do Massachusets Institute of Technology, capaz de resolver equações matemáticas e problemas de raciocínio lógico que nem os mais conceituados doutores das universidades conseguiam. Ele, porém, era um desajustado emocional e só encontrou seu caminho com a ajuda do psiquiatra interpretado por Robbin Williams.”

De acordo com a psicóloga clínica, o programa internacional de avaliação comparada (Pisa) é uma pesquisa realizada no mundo inteiro para obter o nível de quociente intelectual (QI) da população. O estudo aponta para o crescimento do QI da população em todo o mundo, que avançou 17 pontos em relação a 1930.

Nos países desenvolvidos, o QI da população varia pouco. Já no Brasil é possível ainda avançar bastante. “Há campo para estimular a inteligência das crianças. Quanto maior o nível de QI da população, maior e melhor o desenvolvimento do país”, conclui.