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Estado de Minas OLIMPÍADA

Atletismo: bom desempenho do Brasil no Mundial eleva expectativa para Paris

Desempenho brasileiro no Mundial de Eugene (EUA), o melhor em uma edição da competição, acende a esperança de bons resultados na próxima Olimpíada


31/07/2022 04:00 - atualizado 31/07/2022 08:35

Letícia Oro durante salto em distância
Letícia Oro Melo, de 24 anos, surpreendeu ao garantir o bronze no salto em distância e revela quase ter desmaiado ao ver sua marca (foto: Andrej ISAKOVIC/AFP)


A edição 2022 do Campeonato Mundial de Atletismo, disputado em Eugene, no estado do Oregon, nos EUA, há uma semana, pode ser considerada um divisor de águas nesse esporte, muito especialmente para o Brasil – 19º colocado no quadro de medalhas, com uma de ouro, conquistada por Alison dos Santos, nos 400m com barreiras; e uma de bronze, com Letícia Oro Melo, no salto em distância.

Pela primeira vez, a classificação final foi definida não só pelo quadro de medalhas, mas também por um novo ranking elaborado pela Federação Internacional de Atletismo (IAAF), que distribui pontos do primeiro ao oitavo lugar, sendo oito para o medalhista de ouro, e um para o oitavo colocado.

E esse novo ranking mostra o Brasil com a melhor participação na história da competição, criada em 1983. Ficou em 13º lugar, com 34 pontos.

Dois nomes importantes para essa estatística são esperança de bons resultados para o Brasil daqui pra frente. A grande meta são os Jogos Olímpicos de Paris, em 2024, e a maior aposta do atletismo brasileiro é Alison dos Santos, que até já voltou aos treinos, com o técnico Felipe Siqueira, em São Paulo.

Focado nos resultados, ele diz que o Mundial já é passado, embora ainda viva a emoção da medalha de ouro. Tem planos definidos até dezembro, com a mira voltada para a Olimpíada: “Já está quase na hora de retornar à Europa. Meu objetivo, agora, é disputar pelo menos três das quatro etapas que restam da Diamond League. Quero terminar em primeiro lugar nos 400m com barreiras da competição, que é muito importante”.

Restam apenas cinco etapas da Diamond League, em Silésia (Polônia), Mônaco, Lausanne (Suíça), Bruxelas (Bélgica) e Zurique (Suíça). Dessas, ele não disputará a primeira, que não inclui sua prova. “Vou definir, ainda, se estarei nas outras quatro ou em três.”

Alison dos Santos em prova nos EUA
Alison dos Santos, principal nome do atletismo brasileiro, confirmou o ótimo momento ao conquistar o ouro nos Estados Unidos (foto: Steph Chambers/AFP)


Nono do ranking mundial nos 110m com barreiras, o mineiro Rafael Henrique Campos Pereira também tem como planos o retorno à Europa e a disputa do restante da Diamond League. 

“Dei azar na semifinal do Mundial. Esbarrei o pé no primeiro obstáculo. Ali, fiquei pra trás”, lamenta o atleta, que vislumbra uma vaga nos Jogos de Paris: “Vou usar essas provas restantes da Diamond League, mais um torneio que disputarei na Alemanha, e ainda os dois Mundiais de 2023, indoor e outdoor, para conseguir índice para estar na França em 2024”.

Superação de Leticia Oro Melo

Já Letícia foi a grande surpresa brasileira em Eugene. A saltadora, que precisou de apenas dois saltos para conquistar o bronze, com 6,89m, é catarinense de Joinville, onde mora. 

Ela tem 24 anos, e por incrível que pareça, não treina em uma pista, mas sim na terra. De acordo com a diretoria de seu clube, a Associação Corville de Atletismo, não há recursos para comprar o equipamento adequado – ou seja, a pista especial para corridas e saltos.

O Mundial foi a segunda competição do ano para Letícia. Sete meses atrás, ela passou por cirurgia, por causa de um rompimento no ligamento do joelho esquerdo.

Sua participação no Mundial foi surpreendente. Ela passou para a final do salto em distância com 6,67m, marca obtida na terceira e última tentativa, então seu recorde pessoal. Ficou com a última vaga para a final com essa marca.

“Meu objetivo, agora, é treinar para saltar 7 metros”, diz Letícia, garantindo não sentir pressão: “Esse é meu jeito, concentrada. Não tenho medo de ninguém. Quero alcançar minha nova meta, 7 metros, e para isso, vou continuar treinando e sei que tenho condições”.

Sobre a marca alcançada em Eugene, a atleta conta que ao ver 6,89m quase desmaiou. “Sempre que vou competir, seja no estadual ou no Mundial, eu penso em medalha”, comentou a catarinense.
 
Fabiana Murer exibe medalha
Fabiana Murer, que obteve destaque no salto com vara, reclama da falta de aporte financeiro para que o Brasil colha mais frutos no esporte (foto: GREG BAKER/AFP - 27/8/15)

Ex-atletas cobram mais apoio ao esporte

O resultado obtido pelo Brasil no Mundial de Eugene deixa ex-atletas otimistas, como Fabiana Murer, que fez bela carreira no salto com vara (dona de uma medalha de ouro e uma de prata em Mundiais, um ouro e um bronze em Mundial indoor, além de um ouro e duas pratas nos Jogos Pan-Americanos), e o mineiro Ronaldo da Costa, ex-recordista mundial da Maratona, em Berlim’1998.

Fabiana Murer exibe medalha
Fabiana Murer, que obteve destaque no salto com vara, reclama da falta de aporte financeiro para que o Brasil colha mais frutos no esporte (foto: GREG BAKER/AFP - 27/8/15)


Ambos apontam Thiago Braz, Alison dos Santos, Darlan Romani e Daniel Nascimento como nomes certos na briga por pódio em Paris’2024, mas também criticam a forma como o esporte é tratado no país.

Fabiana diz que falta aporte financeiro para que o Brasil possa colher mais frutos em Paris’2024. “Depois da Olimpíada Rio’2016, clubes de atletismo acabaram, cortaram salários e ainda veio a pandemia de COVID-19. Agora, a CBAt e o COB vêm fazendo um trabalho conjunto para tentar recuperar o tempo perdido. Um atleta precisa de muitos detalhes para se preparar para as competições, como participar de campings de treinamento, que só ocorrem no exterior”, destaca.

Sem clube e sem salário, o atleta não tem tranquilidade para se preparar, ressalta. “O Thiago Braz foi ouro na Rio’2016, era atleta do Pinheiros, e sofreu um corte salarial. E ele não tinha patrocínio”, relembra Murer, apontando que, hoje, CBAt e COB bancam as viagens dos principais atletas.

Ela diz ainda que existem muitos talentos no Brasil, mas que acabam sendo perdidos por falta de visão dos políticos e governantes. “Se tivessem uma visão diferente na escola, detectar o talento e fazer preparação adequada, nossa situação seria outra”, afirma, enfatizando ser essencial construir pistas de atletismo, pelo menos, nas principais cidades de cada estado.

Projetos sociais para descobrir talentos

Ronaldo da Costa também destaca a importância do esporte nas escolas. “O Brasil pode ir muito mais longe no atletismo se houver projetos escolares esportivos. Sem isso, não vamos muito adiante.”

Para ele, a CBAt está no caminho certo, tentando a detecção de atletas a partir de projetos sociais. “Saí de Descoberto para bater o recorde mundial. Isso pode acontecer com outro, no entanto, é preciso que se dê oportunidade, o que não vemos hoje. Tem de mostrar o esporte para a criança”, comenta Ronaldo, professor de atletismo de um projeto social no Centro de Treinamento Olímpico, em Brasília.

Bom desempenho do Brasil

Além dos dois medalhistas, o Brasil apareceu oito vezes entre os oito melhores em Eugene: Thiago Braz (quarto no salto com vara), Darlan Romani (quinto no arremesso de peso), Caio Bonfim (sexto na marcha atlética de 20km e sétimo nos 35km), Almir Júnior (sétimo no salto triplo), Viviane Lyra (oitavo na marcha atlética de 35km), Daniel Nascimento (oitavo na maratona) e no revezamento 4x100m (sétimo).

A equipe ainda bateu um recorde sul-americano, de Vitória Rosa nos 200m, e duas marcas brasileiras, com Viviane Lyra e Caio Bonfim, ambos nos 35km da marcha atlética. Resultado bem diferente de há três anos, em Doha, quando voltou sem medalha e com poucas finais. Presente em todas as edições do Mundial, o Brasil soma 15 medalhas na competição: duas de ouro, seis de prata e sete de bronze.

Com 57 atletas (23 mulheres e 34 homens), o Brasil esteve em 10 finais. Anteriormente, a melhor campanha havia sido no Mundial de Sevilha’1999, com 26 pontos e três medalhas – prata com Claudinei Quirino nos 200m, e com Sanderlei Parrela, nos 400m, além do bronze com o 4x100m formado por Raphael de Oliveira, Claudinei Quirino, Edson Luciano Ribeiro e André Domingos.

Para o presidente da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt), Wlamir Motta Campos, é preciso enaltecer os medalhistas e os finalistas: “O Thiago Braz foi muito bem, havia expectativa de medalha, mas o quarto lugar deve ser celebrado. O Caio Bonfim mais uma vez mostrou toda a força mental ao bater um recorde em 8 minutos. Alison dos Santos se fez gigante. A melhor palavra que define a Letícia Oro é resiliência. Aproveitou a oportunidade de ir ao Mundial por ser campeã de área, fez um trabalho fantástico, pois foi a última a entrar na eliminatória para ganhar o bronze”.

Falta de política esportiva

Um dos treinadores da Seleção, Felipe Siqueira é técnico do Pinheiros e de Alison dos Santos. Ele indica que a base para Paris’2024 são os Mundiais: o de Eugene e dois, indoor e outdoor, em 2023. Aposta que poderão surgir talentos, mas aponta um problema para que o Brasil siga forte no atletismo.

“Não temos política para o esporte. É preciso permitir que se detecte o atleta e evitar que não se consiga, por falta dessa política, que esse talento seja desenvolvido.”

Mauro Roberto, técnico da equipe mineira Clã Delfos e descobridor de Raphael Henrique Campos Pereira, vê um momento difícil para o atletismo, especialmente em Minas Gerais: “Não temos competições. Estão terminando os Jogos de Minas, em Uberaba, com uma situação muito triste. Os destaques são de Lagoa da Prata, Japaraíba e Oratórios, onde não há pistas. Treinam na terra, orientados por abnegados”.


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