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#ReconquistarSantiago, mas aquela, nunca mais

Numa noite de ditaduras covardes, os cruzeirenses cruzaram a cordilheira por amor à Academia Celeste


postado em 03/04/2019 05:08


Twitter: @gustavonolascoB

As Cordilheiras dos Andes estavam especialmente repressoras na noite gelada de 30 de julho de 1976, em Santiago, no Chile. O estádio Nacional, envergonhado de seu passado de sangue e tortura, recebia a finalíssima da Copa Libertadores. Em instantes, Cruzeiro e River Plate adentrariam o gramado, envoltos pelos fantasmas e terrores daquela arena, que, três anos antes, fora transformada num campo de concentração e extermínio pelo ditador Augusto Pinochet.

Cerca de 40 mil torcedores pulavam nas arquibancadas. Mesma quantidade de gente que, em 1973, passou por lá como presos políticos. Dos quais, mais de 500 nem sequer conseguiram sair com vida, torturados até a morte ou executados sumariamente.

Tambores, na sua ampla maioria, ecoavam a favor do River Plate. Ditavam o ritmo da hinchada, comandada por Gorda Matosas, torcedora símbolo do clube. Longe de Buenos Aires, se esqueciam momentaneamente dos horrores da ditadura argentina comandada pelo monstro Jorge Videla.

Do outro lado, os chilenos se juntavam aos cruzeirenses apaixonados que haviam cruzado a cordilheira por amor à Academia Celeste. Otimistas, tanto por saberem que o Cruzeiro era superior ao River, quanto pela (falsa) esperança de estarem vivendo os anos finais da covarde ditadura brasileira pós-golpe de 1964.

Os flashes dos fotógrafos iluminavam a camisa celeste do nosso escrete, perfilado no círculo central para a foto oficial. Os alto-falantes usados em 1973 para convocar mulheres e homens que seriam interrogados e torturados pelas bestas de Pinochet, naquela noite apenas anunciavam a escalação dos times.

O River Plate, mesmo desfalcado do goleiro Fillol e dos craques Perfumo e Passarella, tinha uma máquina, com Alonso, Luque e Más, reforçada pela típica arbitragem desfavorável aos clubes brasileiros. Ao redor do campo, placas de publicidade anunciavam Gillette G2, Casas Pernambucanas, bicicleta Caloi, Smirnoff, Shelton, isqueiros Cricket e escondiam os militares.

O apito do juiz cortou o ar, sufocando vozes reais. Nelinho foi logo atingido covardemente. Com as mãos no tornozelo e com o corpo encolhido, sua imagem de dor no chão lembrava a forma como jovens eram torturados no pau de arara na ditadura brasileira.

Poucos minutos depois, pênalti. O mesmo Nelinho, ao contrário das bombas e canhões, apenas deslocou o goleiro para abrir o placar. Resultado mantido até o fim do primeiro tempo, graças aos verdadeiros milagres operados por Raul e sua camisa amarela.

Segunda etapa. Eduardo surge como um lobo pela direita e acerta o ângulo do goleiro Landaburu. Cruzeiro 2 a 0. Parecia o fim, mas eis que o River Plate desconta num pênalti. O empate argentino saiu de uma falcatrua. Cobraram rápido uma falta e, sem o apito do juiz, fizeram 2 a 2. Os comentaristas da TV Nacional do Chile denunciavam a ação irregular. Se a transmissão fosse ao vivo, provavelmente, teriam sido censurados e presos pelo simples ato de questionarem os homens de preto.

O final, todos sabemos. Últimos minutos; falta na entrada da área; Nelinho se prepara e Joãozinho dá o troco da mesma moeda. 3 a 2. A bola morre na rede da trave localizada bem à frente da “Salida 8”, local onde, até hoje, jogadores e o povo chileno rendem homenagens e rememoram os mortos e torturados do estádio Nacional, para que ninguém se esqueça da vergonhosa ditadura chilena.

Nesta noite, contra o Emelec, no Equador, inspirados pelos primeiros campeões de 1976, continuaremos nossa caminhada pelo tri. Queremos #ReconquistarSantiago na final que será exatamente no estádio Nacional, mas, desta vez, sonhando com uma América liberta para sempre de seus ditadores.

Dedico esta crônica aos torcedores de Cruzeiro e River Plate torturados, mortos ou desaparecidos durante as três ditaduras que covardemente estavam instauradas no Brasil, na Argentina e no Chile naquela noite de 30 de julho de 1976. Ditaduras, nunca mais!  

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