Jornal Estado de Minas

LITERATURA

Diálogos da vida real transcritos para a literatura



 é tratada como tabu dentro de muitas famílias e falar sobre a sexualidade acaba se tornando ainda mais difícil para os jovens, principalmente pela falta de apoio e acolhimento familiar. Inspirado no diálogo que teve com a mãe ao se assumir gay, o professor e escritor Eduardo Ribeiro Dias compartilha com os leitores sobre medos, inseguranças e, por fim, a liberdade de revelar quem realmente é em seu novo livro “Sobre Pedras e Flores”.




 
Eduardo utilizou das próprias experiências na narrativa para transmitir sentimentos aos personagens e torná-los reais e identificáveis. Um destes personagens, Isaac, enfrenta as consequências dos próprios atos que levaram ao fim do casamento com Lílian. Em uma noite sem rumo, ele conhece Elias, que aos 32 anos encara dúvidas quanto à carreira e às ausências que finge não sentir.

O encontro, que aparentemente não mudaria a vida de nenhum dos dois, tem desdobramentos inesperados quando os protagonistas são colocados frente a frente para lutar contra os traumas e fantasmas do passado. Ao leitor, ficam mensagens acolhedoras sobre luto familiar, bullying na adolescência e homofobia, além da luta diária contra quem são e a descoberta de quem querem, de fato, ser.
 
O autor deixa claro que acredita que uma obra literária de ficção nunca fica totalmente no âmbito da ficção, porque as experiências pessoais de quem escreve sempre farão parte da obra, tanto em seus acontecimentos como nas características de personagens que existem dentro daquela narrativa.




“No caso de “Sobre Pedras e Flores”, o diálogo inicial no qual o personagem Elias se assume gay para o pai só fez sentido e realmente criou vida e funcionou quando adicionei partes da conversa que tive com minha mãe na mesma situação. A partir daí, consegui entender quem eram aqueles dois personagens e como as histórias e personalidades de ambos se desenvolveriam”, afirma.

SENTIMENTOS

Em vários outros pontos da história, Dias declara que relatou sentimentos que teve em momentos bem específicos, de tristeza, alegria, frustração, deslumbre e até raiva, como guias para as cenas que precisava descrever, embora sejam todas ficcionais. “É estranho voltar e ler o que nasceu disso e ver que aquela não é a minha história de vida, ao mesmo tempo que é, se destrinchar as entrelinhas”.
 
Isaac e Elias, os protagonistas, têm vivências muito diferentes um do outro, e cada um traz uma mensagem distinta, embora ambas estejam ligadas ao autoconhecimento. De acordo com o escritor, ele tentou, por meio de um desses personagens, transmitir a ideia de que é preciso entender e aceitar as escolhas impostas e feitas no passado, e suas consequências, sem deixar que elas ditem como você viverá hoje.




 
Outra mensagem que o livro traz é a de que todo mundo se sente um pouco perdido em algum momento, de um jeito ou de outro, e que não há nada de errado em não ter as respostas para tudo ou em perder as rédeas da vida de vez em quando. Até porque, segundo Eduardo, ter controle sobre a vida é uma ilusão e tanto.
 
“Podemos fazer planos diversos e segui-los por muito tempo, mas o que acontece quando algo muda e os planos feitos antes não se encaixam ou não fazem mais sentido? A possibilidade de se reinventar deve estar presente em nossas vidas, e o autoconhecimento é fundamental para entendermos os momentos em que esta necessidade surge”, comenta o professor.
 
A motivação para escrever “Sobre Pedras e Flores” veio enquanto o autor lia o romance “As Fúrias Invisíveis do Coração”, de John Boyne. “Isso me ajudou a ver que havia tanto espaço quanto a necessidade de mais histórias como a que já martelava em minha cabeça e alimentava minha insônia havia meses”, explica.




REFLEXÃO

Eduardo, que não vê a escrita com um único objetivo, citou os principais motivos que o levaram a escrever o livro. “O primeiro foi o de tirar a história da minha cabeça para ver se eu conseguia dormir”, comenta, em tom de brincadeira. “Depois, é a vontade de contar uma história que pudesse tocar os leitores e causar algum tipo de reflexão. E a necessidade que eu sentia, e ainda sinto, em ver mais dramas e romances com protagonismo LGBTQIAP+ onde o enredo não se limita à descoberta da sexualidade e ao ‘sair do armário’''.
 
“Embora este ponto seja, sim, importante em nossas trajetórias, nós temos tanta complexidade quanto qualquer outra pessoa, com sonhos, traumas, medos, sofrimentos com perdas e qualquer outro sentimento positivo e negativo que permeia nossas mentes. E sinto que isso ainda é pouco explorado, principalmente nas obras literárias e audiovisuais mais populares, e isso influencia diretamente na visão que o público em geral tem a nosso respeito”, completa o escritor.
 
Complexos e reais, os personagens de “Sobre Pedras e Flores” agradam especialmente o leitor que busca narrativas LGBTQIA+ mais densas, que vão além do despertar da sexualidade. “‘Sobre Pedras e Flores’, é apenas uma de muitas histórias que me mantêm acordado à noite e que serão, muito em breve, transportadas às páginas de livros”, torce Eduardo.

* Estagiária está sob supervisão da editora Ellen Cristie
 
(foto: Reprodução)
 

Serviço

Título: Sobre Pedras e Flores
Autor: Eduardo Ribeiro Dias
ISBN:  6525413923
Páginas: 388
Formato: 23 x 15 cm
Valor: R$ 66,99
Venda: Amazon