Jornal Estado de Minas

COMPORTAMENTO

Crianças e adolescentes voluntários: corrente solidária


“Sou o Davi Pimenta, hoje vou contar como é minha experiência de voluntário no Lar Novo Céu. Para quem não sabe, é onde trabalho socialmente. Quando fui lá pela primeira vez, achei estranho, fiquei com muito medo porque aquelas pessoas estavam com um rosto estranho... Lá as pessoas têm paralisia cerebral, que é uma doença muito grave e na época eu tinha 6 anos. Depois de um longo período indo lá, comecei a não ter mais medo e entro lá para fazer aquelas pessoas felizes. Levo um instrumento chamado ukulele. Não sei tocar, mas canto musiquinhas com os outros palhaços e sempre fico feliz quando entro naquele lugar. Posso recomendar para todos esse projeto, pois me sinto bem e orgulho de ajudar.” O depoimento de Davi, de 13 anos, mostra o poder transformador, mágico e educador do voluntariado.





Ser criança é viver no mundo da fantasia e da imaginação, olhar o outro sem preconceito, ser curioso, perguntar sempre, aprender e ensinar brincando e formar parcerias, fazer amigos para, naturalmente, ajudar um ao outro. Tudo que é essencial para se tornar um voluntário desde cedo.

No próximo domingo (29/08), será comemorado o Dia Nacional do Voluntariado (Lei 7.352/1985, que instituiu a data). E, hoje, o Estado de Minas quer inspirar todos, crianças e adultos, a tomarem a decisão de olhar e ajudar o outro para mergulhar em uma corrente do bem. E apresentar aos leitores como crianças e adolescentes se sentem ao participar, colaborar e contribuir com o trabalho solidário, com as causas sociais. E como pais, responsáveis, escola e instituições podem e devem fazer esta semente germinar e dar frutos para um mundo melhor.


 
Não existe uma idade mínima para quem quer ser voluntário. Crianças e adolescentes podem dar o primeiro passo para ser agentes de transformação social, seja dentro de casa, no prédio, bairro, escola, clube, comunidade ou cidade onde vivem. A única regra é: se tem menos de 18 anos é preciso que seja respaldado e atenda aos critérios da Lei Nacional do Voluntariado 9.608, de 18 de fevereiro de 1998. 



Aí, está tudo certo, basta se dispor a prestar um serviço sem intenção de lucro ou de receber qualquer valor em dinheiro. A missão do voluntário é doar, não só tempo e generosidade, mas atender a um chamado humano de colaborar, ajudar, dividir alegrias, aliviar sofrimentos e melhorar a qualidade da vida de todos. É estender a mão e não abandonar ninguém.

Dividir para somar, amor sem medida

Ana Pimenta, mãe de Davi, conta que conheceu o Novo Céu a convite de um amigo, o Palhaço Geleia, e levou seu filho para que pudesse interagir e ver de perto as dificuldades que ele não tem.

“Foi muito bom para o desenvolvimento dele e na formação do caráter e espírito de solidariedade. Há três anos, eu, Viviane Vale e Giselle Simões fundamos um grupo de voluntários que se chama Amor em Obra Dr. Palhaço (@amoremobradrpalhaco) e participamos de vários projetos sociais e fazemos campanhas para ajudar as instituições. Uma frase que define o voluntariado: Ser voluntário é dividir para somar, é amor sem medida.”





“Quando puder, quero visitar o Novo Céu novamente. Até lá, já vou saber ler e vou contar histórias para as crianças”, fala Marina Simões Sena, de 5 anos. Desde bebê, ela visita a instituição que acolhe pessoas com paralisia cerebral, junto com a mãe, Nathália Simões, relações-públicas, autora do livro “Como posso fazer o bem?”, da Editora Gulliver, que acaba de ser lançado, com Marina sendo personagem principal de uma linda história que incentiva as crianças a conhecerem as diversas formas de praticar o voluntariado e como traz valores essenciais, como a colaboração, empatia e a solidariedade. 

Por meio do diálogo com sua mãe, Marina compreende que fazer o bem começa com ações simples em seu próprio espaço, mas desenvolve, também, um olhar atento para as carências de atos de gentileza e solidariedade com as pessoas no entorno dela. O desejo e os planos de Marina fazem todo o sentido, já que desde o início da pandemia, por segurança, ela não pode ir ao Novo Céu.



“Quando colocamos um filho no mundo, o desejo de torná-lo uma morada melhor vira um compromisso. Sem dúvida, a maternidade me impulsionou ainda mais para criar ferramentas de transformação social. Escrever um livro infantil com esse tema foi um grande desafio, primeiro por ser para crianças. Além disso, 'fazer o bem' é um conceito amplo e abstrato. Eu me sentia à vontade para conversar com os adultos, mas buscava formas de abordagem com as crianças, em especial minhas filhas Marina, de 5, e Isabela, de 3. Então, escrevi uma história me inspirando nos diálogos que tinha com Marina, que na época estava com 3 anos. Essa fase é marcante pela curiosidade, pelas perguntas inusitadas e expressões sobre o mundo que ela começa a compreender. O meu desejo é que ele alcance muitas crianças e adultos também”, conta Nathália.





No livro, a história parte da prática do bem a partir do entorno. “Afinal, não é possível fazer o bem para terceiros se não começarmos pelos nossos. Lembro-me, ainda adolescente no desejo de mudar o mundo, meu pai 'puxando minha orelha' dizendo: 'Filha, antes de querer mudar o mundo, arrume o seu quarto'. Depois descobri que ele parafraseou um discurso de Bill Gates aos formandos de uma universidade americana. Sempre me lembro disso e a história começa com a personagem olhando para seu entorno até o ponto em que ela expande o olhar e pergunta para a mãe se existem voluntários em outros países. Nesse sentido, acredito que a semente começa com exemplos diários.”

Permitir a participação e a autonomia da criança em tarefas importantes, como a organização do espaço que ela habita, proporcionar o contato com a natureza para que ela conheça e valorize a fauna e a flora, conviver com pessoas diferentes, demonstrando o respeito a essas diferenças. “E doe, o próprio ato de doar, de maneira genuína, incentivando que ela compartilhe roupas e brinquedos, por exemplo”, destaca Nathália.
 
Nathália Simões com as filhas Marina, de 5 anos, e Isabela, de 3, que são estimuladas a um olhar atento para atos de gentileza e solidariedade com as pessoas no entorno delas (foto: Arquivo pessoal)
 
Nathália revela que sua experiência com Marina é um repertório que é aumentado todos os dias, inclusive com a caçula, Isabela: “Não adianta dizer o que tem que ser feito, mas fazer. E isso é uma construção diária que parte dos cuidadores da criança. Na pandemia, na qual o convívio social se limitou, tivemos que nos voltar para nós cultivando o cuidado do ambiente doméstico. Desafios enormes, não é mesmo? Mas é assim que a gente começa com a criança. Quando ela está no ‘mundo lá fora’, será mais natural cuidar do outro. Um passo de cada vez”.





O livro, que trata de conceitos de cidadania global, rede colaborativa e sustentabilidade inseridos com exemplos simples e de afetiva percepção pelas crianças, aliás, nasceu no modelo “um por um”, ou seja, a cada livro vendido, um é doado. “A cada edição, escolho uma organização social para a doação. A primeira foi a Novo Céu, que acolhe crianças, adolescentes e adultos com paralisia cerebral, e convido uma empresa a apoiar a produção. Dessa forma, consigo ampliar o acesso ao livro e apresentar um modelo de negócio sustentável, fortalecendo a cultura de doação”, explica.

PEDIDO DE AJUDA 

Nathália conta que seu despertar para o voluntariado aconteceu a partir de um pedido de ajuda. Uma grande amiga fazia parte da diretoria de uma organização social sem fins lucrativos em Belo Horizonte e precisava de um apoio na área de comunicação. Com 10 anos de voluntariado, alguém que começou sem nunca ter sido voluntária, Nathália se transformou em alguém que mobiliza e conecta pessoas em prol de causas sociais.
  
“Gosto de simplificar o voluntariado para torná-lo acessível e uma prática recorrente. As primeiras perguntas que as pessoas devem se fazer são: pelo quê seu coração bate? Quais são os problemas que gosta ou gostaria de ajudar a resolver? Quais causas mais sensibilizam você?. A partir disso, fica mais fácil procurar organizações sociais para ajudar.” Para ela, no Brasil, existe vontade, mas há também pouca consciência social de fato. “Talvez seja por isso que em cenários extremos de escassez e de crises, percebemos mais claramente os que doam e ajudam genuinamente, e os que não têm esses valores introjetados e os praticam por conveniência ou superficialmente. Ser voluntário e doador é um estado de consciência, e não de ter recursos para fazê-lo. Quem tem consciência encontra os meios. Nesse sentido, coloco-me como uma semeadora desse movimento.”





LEITURA DO BEM

(foto: Arquivo Pessoal)
 
  • Obra: “Como posso fazer o bem”
  • Autora: Nathália Simões
  • Editora: Gulliver, selo Adelante
  • Ilustrador: artista anjo, Sérgio Luiz
  • Prefácio: filósofo e escritor Rodrigo Starling, fundador da associação Minas Voluntários
  • Vídeo: https://www.youtube.com
  • /watchv?=Bv-kPV-iNtY
  • Número de páginas: 35
  • Preço sugerido: R$ 30
  • Venda: no http://www.comopossofazerobem.com.br/ ou na instituição Novo Céu (31) 3368-6860.