Brasília - O Senado aprovou ontem à noite, em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 1/2022), que estabelece "estado de emergência" no país para o governo conceder uma série de benefícios sociais até o fim deste ano ao custo de R$ 41,2 bilhões para os cofres públicos. Os recursos serão liberados por meio de créditos extraordinários, fora do teto de gastos, dispositivo que limita as despesas públicas. A proposta, que substituiu a PEC dos Combustíveis, obteve 72 votos a favor e um contra no primeiro turno e 67 votos favoráveis e um contra no segundo. Agora foi enviada para a Câmara dos Deputados e deve ser votada já na semana que vem, devido ao seu caráter emergencial. O texto relatado pelo senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) é de autoria do senador Alexandre Silveira (PSD/MG), que o apresentou inicialmente em fevereiro.
Desde que foi apresentada em fevereiro por Alexandre Silveira, a proposta sofreu forte resistência da equipe econômica do governo. No entanto, na última semana, o próprio governo apresentou propostas semelhantes (PEC 16 e 18/2022). “Essa foi a primeira proposta que apresentei quando cheguei em fevereiro no Senado Federal, junto com o senador Carlos Fávaro. É um projeto muito necessário, que vai atender as pessoas que estão mais precisando da atenção do Estado nesse momento de inflação alta e de aumento dos preços”, ressaltou Silveira.
O parlamentar lamentou o atraso na aprovação da matéria. “Só lamento o Ministério da Economia ter atrapalhado a sua tramitação por tanto tempo. Já era uma Lei para estar em vigor há muito tempo, gerando benefícios em favor da população brasileira, especialmente daqueles que mais estão sofrendo com a fome e a miséria”, acrescentou o senador.
Como a legislação proíbe a criação de novos benefícios sociais em ano eleitoral, foi incluída na PEC 1/2022, que destina R$ 41,2 bilhões para benefícios sociais, a expressão “estado de emergência”, devido ao aumento no preço dos combustíveis, que impacta na inflação e, consequentemente, no bolso dos consumidores. Um exemplo é o “voucher caminhoneiro”. O benefício terá o valor de R$ 1.000 e atenderá apenas profissionais autônomos cadastrados em registro nacional até 31 de maio deste ano. Assim, o governo precisará reservar R$ 5,4 bilhões. A proposta ainda prevê subsídio para o setor de transportes públicos urbanos e metropolitanos com o objetivo de impedir o aumento das passagens de ônibus. A estimativa para esse gasto é de 2,5 bilhões. Com o estado de emergência (Lei 9.504., de 1997), a PEC não precisar respeitar o teto de gastos, a regra de ouro ou os dispositivos da Lei de Responsabilidade Social que exigem compensação por aumento de despesa e renúncia de receita.
O senador Fernando Bezerra disse que o estado de emergência se justifica pela "elevação extraordinária e imprevisível dos preços do petróleo, combustíveis e seus derivados e dos impactos sociais deles decorrentes". "Nós estamos enfrentando em função da desorganização econômica que se verifica no mundo inteiro, fruto dos transtornos causados pelo pós-COVID, pelo pós-pandemia, desorganizando todo o sistema de produção mundial, que está levando inflação para todos os países do mundo. Os EUA têm a maior taxa de inflação dos últimos 40 anos, inflação no Japão, inflação na Europa, inflação no mundo inteiro, com o preço elevado dos alimentos, a fome se alastrando pelo mundo inteiro; enfim, o Congresso Nacional tinha que tomar as providências que está tomando", explicou Bezerra.
"A despesa será financiada por crédito extraordinário e não será considerada no teto de gastos nem na apuração da meta de resultado primário prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022", completou. Nos dois turnos, o único voto contrário foi o do senador José Serra (PSDB-SP). "Às vésperas das eleições, o Senado tenta aprovar uma emenda à Constituição instituindo uma situação de emergência para liberar gastos da ordem de R$ 38 bilhões, passando por cima de todas as regras fiscais", argumentou o parlamentar ao antecipar o seu voto pelas redes sociais. Depois da votação, o senador afirmou: "O 'pacote de bondades' é eleitoreiro, só vai até dezembro de 2022 e compromete o futuro das contas públicas. Hoje, fui o único senador a votar contra a PEC, apelidada de PEC Kamikaze. Por esse nome já sabemos que se trata de uma bomba fiscal. Essa PEC viola a Lei de Responsabilidade Fiscal e fura o teto de gastos".
OPOSIÇÃO
Senadores da oposição tentaram retirar o termo estado de emergência do texto, mas não conseguiram as 27 assinaturas necessárias para a mudança. Eles criticaram a previsão do governo de decretar estado de emergência na tentativa de prover os benefícios e classificaram a medida como "eleitoreira". Se a moda pega, governos em final de mandato vão criar caos no começo do ano para no final tirar o bode da sala e tentar uma recuperação eleitoral. Contra isso já me insurjo. Não pode pesar mais do que a necessidade dos benefícios. Apenas um alerta, usar estado de emergência pra qualquer coisa e, principalmente, para cobrir incompetência de governo é intolerável", disse Jean Paul Prates (PT-RN), líder da minoria.
"É claro que nós vamos votar nessa proposta porque quem tem fome tem pressa. Mas eu queria lembrar aqui que o governo, esse governo que aí está, o governo Bolsonaro, nunca teve interesse em política social. Aí, agora, a menos de 100 dias da eleição, ele apresenta essa PEC, uma maneira de burlar a Lei Eleitoral, certo?", afirmou a senadora Zenaide Maia (Pros-RN). (Com agências)
PACOTE DE BENEFÍCIOS SOCIAIS
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 1/2022 destina R$ 41,25 bilhões
AUXÍLIO BRASIL: R$ 26 BILHÕES
Acréscimo de R$ 200 no benefício mensal (de R$ 400 para R$ 600)
Meta: incluir todas as famílias elegíveis (fila "zerada")
Parte do valor poderá ser usado para operacionalização do benefício
Será vedado o uso em publicidade institucional
AUXÍLIO-GÁS: R$ 1,05 BILHÃO
Parcela extra bimestral no valor de 50% do valor médio do botijão de 13kg
Parte do valor poderá ser usado para operacionalização do benefício
Será vedado o uso em publicidade institucional
AUXÍLIO PARA CAMINHONEIROS: R$ 5,4 BILHÕES
Voucher de R$ 1 mil mensais para cadastrados no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC)
Será concedido para transportadores autônomos, independente do número de veículos eles que possuírem
Não será preciso comprovar a compra de óleo diesel no período de recebimento
AUXÍLIO PARA TAXISTAS: R$ 2 BILHÕES
Benefício para profissionais cadastrados como motoristas de táxi
Serão contemplados aqueles cadastrados até 31 de maio de 2022, mediante apresentação do documento de permissão
A formação do cadastro e a forma de pagamento ainda serão regulamentadas
GRATUIDADE PARA IDOSOS: R$ 2,5 BILHÕES
Transferência para estados e municípios para custear a gratuidade no transporte público para cidadãos acima de 65 anos
Distribuído na proporção da população idosa de cada estado e município
40% do valor será repassado para serviços intermunicipais e interestaduais
Somente destinado para estados e municípios com sistema de transporte coletivo urbano em funcionamento
CRÉDITO PARA ETANOL: R$ 3,8 BILHÕES
Auxílio para estados que outorgarem créditos tributários do ICMS para produtores e distribuidores de etanol hidratado
Pagamento em parcelas mensais
Distribuído na proporção da participação de cada estado no consumo de etanol hidratado no ano de 2021
Estados renunciarão ao direito de pedir indenização por perda de arrecadação decorrente dos créditos outorgados
Valor será livre de vinculações, mas deverá ser repartido com os municípios e entrará no cálculo de receita para efeito de investimento mínimo em educação
Objetivo é reduzir a carga tributária do etanol para manter diferencial competitivo em relação à gasolina
- Estados ficam autorizados a "zerar" a tributação sobre a gasolina, desde que façam o mesmo para o etan
ALIMENTA BRASIL: R$ 500 MILHÕES
Reforço orçamentário para o programa, que promove compra de alimentos de pequenos produtores e sua destinação para famílias em situação de insegurança alimentar
Fonte: Agência Senado