Jornal Estado de Minas

ENTREVISTA / PRESIDENTE DO TJMG

Funcionamento do Judiciário em Minas será híbrido após a pandemia

Um ano se passou desde que o desembargador Gilson Soares Lemes assumiu a presidência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). De 1º de julho de 2020 até o momento, o magistrado vem resolvendo demandas internas do TJMG, além de ter homologado o acordo entre o governo de Minas e a Vale, de R$ 37,68 bilhões – o maior da história do Brasil em termos de fixação de compensação e reparação socioambiental – e de ter participado de conciliações e decisões relacionadas à pandemia da COVID-19 no estado. Sobre o trabalho pós-pandemia, o desembargador diz que parte das atividades do Judiciário será em home office




 
“Temos praticado mais atos judiciais eletrônicos do que presenciais. Após a vacinação e após a pandemia, nós, com certeza, teremos parte do funcionamento em home office. Temos uma resolução que trata do teletrabalho e após a pandemia, com certeza, teremos um funcionamento híbrido, ou seja, parte presencial e parte através do teletrabalho”, anuncia.
 
No entanto, Lemes não olha apenas para Minas Gerais, uma vez que não descarta assumir uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF), caso surja a oportunidade. No próximo dia 12, o ministro Marco Aurélio Mello se aposentará de forma compulsória por completar 75 anos. Com isso, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) poderá indicar um magistrado para ocupar uma das cadeiras do STF, após o escolhido passar por sabatina no Senado. Gilson Lemes destaca que tem todos os predicados para assumir a função, caso seja lembrado pelo chefe do Executivo federal.
 
“Com relação ao meu nome, que foi cogitado em algumas oportunidades na mídia e com alguns parlamentares e colegas do tribunal, considero que me encaixo no perfil, haja vista que tenho 29 anos de carreira. Sou um juiz de carreira. A escolha cabe ao presidente, mas se acontecer seria uma bênção que a gente acolheria com muita alegria e com muita honra”, disse, em entrevista exclusiva ao Estado de Minas.




 
Enquanto isso, o presidente do TJMG acompanha o impasse entre a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e o governo estadual sobre a transferência de parte dos recursos oriundos do acordo entre a mineradora Vale e o governo de Minas em função da tragédia de Brumadinho.

O Legislativo defende transferências diretas, mas o Executivo é favorável aos convênios. Uma das alegações do governo é que os convênios servem para detalhar e apontar legalmente a destinação do dinheiro. Sem isso, o trato firmado com a mineradora, com mediação Judicial, seria violado. Com isso, R$ 11 bilhões estão travados aguardando definição, sendo que R$ 1,5 bilhão seriam repassados diretamente à conta dos 853 municípios mineiros de início.
 
O fato desagrada a Lemes. “Nós estamos em contato tanto com o presidente da Assembleia quanto com o governador do estado e com o Ministério Público buscando auxiliar na solução desse impasse, porque isso é ruim para Minas Gerais e os mineiros, haja vista que o acordo já está pronto e o dinheiro depositado. Nós precisamos equacionar esse problema o mais rápido possível para que as verbas atinjam o mais rápido possível aqueles que precisam”, afirma o desembargador em entrevista exclusiva ao Estado de Minas.




 
Já em relação às demandas internas no TJMG, Gilson Lemes tem como uma de suas metas  virtualizar 100% dos processos físicos até o fim do seu mandato. Ao todo, são 3,5 milhões de ações, cíveis e criminais. Desse número, de acordo com o desembargador, em torno de 650 mil já foram digitalizados. “Os processos que chegarem ao Judiciário a partir de outubro, seja cível ou criminal, serão eletrônicos”, anuncia. 

O senhor assumiu em meio a uma pandemia. Além de trabalhar com demandas do próprio TJMG, como a digitalização de processos, o senhor teve que mediar impasses relacionadas à política de prevenção da COVID-19. Como o senhor avalia esse primeiro ano de seu biênio?
Estamos completando, nesta semana, um ano de gestão. Assumimos em julho de 2020. Essa primeira metade da gestão foi toda dentro da pandemia. Evidentemente que isso trouxe algumas dificuldades para a prestação da jurisdição, porque as nossas atividades eram essencialmente presenciais. Com a pandemia, tivemos que modificar. Já tínhamos implantado o PJe Cível, que é o processo judicial eletrônico cível, e desenvolvemos o PJe Criminal durante a pandemia. E já estamos implementando em 100% das comarcas até outubro. Isso vai facilitar as atividades dos servidores, magistrados e os advogados de forma geral. Nós adquirimos, também, plataforma para que haja possibilidade da realização de videoconferência, e isso já vem sendo realizado desde o início da gestão. Os desembargadores e juízes podem fazer as sessões e as audiências por videoconferência, não há necessidade de deslocamento. Todos esses avanços tecnológicos têm facilitado a atividade durante a pandemia. As comarcas estão fechadas ou abertas conforme monitoramento da Secretaria de Saúde e toda semana baixamos uma portaria abrindo ou fechando comarcas, conforme grau de contaminação daquela cidade. A gestão é feita sempre buscando a prestação jurisdicional efetiva, a segurança de todos os servidores e magistrados durante o exercício da atividade.

O senhor falou sobre as sessões virtuais durante a pandemia. Essas e outras medidas tomadas excepcionalmente têm possibilidade de permanecer pós-pandemia?
Perfeitamente. Temos praticado mais atos judiciais eletrônicos do que presenciais. Após a vacinação e após a pandemia, nós, com certeza, teremos parte do funcionamento em home office. Temos uma resolução que trata do teletrabalho e após a pandemia, com certeza, teremos um funcionamento híbrido, ou seja, parte presencial e parte através do teletrabalho.





A principal bandeira da sua gestão, sem dúvida, é digitalizar todo o acervo de processos físicos até o término de seu mandato. Como está o andamento dos trabalhos?
Terminamos em outubro a implantação do PJe Criminal em todas as comarcas. Os processos que chegarem ao Judiciário a partir de outubro, seja cível ou criminal, serão eletrônicos. O acervo anterior, físico, está em torno de 3 milhões de processos. Desse número, já digitalizamos em torno de 650 mil processos. Estamos em ritmo acelerado para que a gente consiga cumprir essa meta ambiciosa até o fim da gestão.

Como está o andamento do projeto Destrava Minas, que busca solucionar obras públicas paradas no estado? 
Assim que foi lançado o programa, em conjunto com o Ministério Público, Advocacia do Estado, Defensoria Pública e Tribunal de Contas, o advogado-geral do estado encaminhou já algumas obras para o nosso Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc). E o responsável aqui em segundo grau, desembargador Newton Teixeira, já intimou as partes para que possam, então, vir a juízo para tentar uma mediação ou conciliação. Em 7 de julho, já temos a primeira audiência designada de um caso de Conselheiro Lafaiete para a tentativa de solução do conflito.

Governo e Assembleia ainda não entraram em acordo sobre o repasse, aos municípios, de R$ 1,5 bilhão da parte do acordo da Vale que precisa de aval legislativo — R$ 11 bilhões dos R$ 37,68 bilhões totais. Enquanto o Legislativo defende transferências diretas, o Executivo é favorável aos convênios. Uma das alegações do governo é que os convênios servem para detalhar e apontar legalmente a destinação do dinheiro. Sem isso, alegam, o trato firmado com a mineradora, com mediação judicial, seria violado. Isso posto, a realização de transferências diretas aos municípios, na visão do TJMG, fere o acordo da Vale, que teve a chancela deste tribunal?
A pergunta, para ser respondida com precisão, a gente precisa ter acesso ao projeto que está tramitando na Assembleia. As tratativas que já foram feitas entre Executivo e Legislativo, não é possível responder à pergunta sem ter acesso a esses documentos para conhecermos exatamente em que termos esses repasses serão feitos. Nós estamos em contato tanto com o presidente da Assembleia quanto com o governador do estado e com o Ministério Público buscando auxiliar na solução desse impasse, porque isso é ruim para Minas Gerais e os mineiros, haja vista que o acordo já está pronto e o dinheiro depositado. Nós precisamos equacionar esse problema o mais rápido possível para que as verbas atinjam o mais rápido possível aqueles que precisam.





Há reunião agendada com o governador Romeu Zema para tratar do assunto?
O governador parece que tem interesse em que haja uma reunião com os membros de poderes e as instituições na segunda-feira . Ainda não recebi nenhum convite oficial para participar da reunião, mas tenho ouvido nos meios de comunicação que haverá uma reunião na segunda-feira para uma tentativa de acordo.

Como disse no começo da entrevista, o senhor assumiu o TJMG em meio à pandemia da COVID-19, tendo que resolver alguns impasses nos últimos 365 dias, como a suspensão do toque de recolher durante a onda roxa do programa Minas Consciente. Entre as situações resolvidas com a sua mediação, qual foi a mais desafiadora e por quê?
Várias situações foram colocadas para o Poder Judiciário. Nós tivemos em torno de 6 mil ações propostas no Judiciário mineiro relativas à COVID-19, seja para liberação de medicamentos e leitos de UTI. Em todas as demandas houve a pronta resposta do Judiciário. Com relação à presidência do tribunal, recebemos requerimentos dos prefeitos ou do governador para suspensão de liminares concedidas pelos magistrados de 1º grau que possam trazer prejuízo público. Algumas medidas foram acatadas, suspendendo a decisão dos magistrados, e outras não foram acatadas. Uma das medidas que veio ao Judiciário, que seria relativa ao toque de recolher, antes mesmo de esse presidente se manifestar houve acordo entre as partes nesta presidência. O próprio comitê da Secretaria Estadual de Saúde resolveu revogar, haja vista o baixo impacto sanitário dessa medida. Todas as medidas que foram propostas foram resolvidas em tempo hábil.

No próximo dia 12, o ministro Marco Aurélio Mello se aposentará no STF. O senhor se coloca como um possível substituto?
Como eu já disse, todo magistrado tem como ápice na carreira uma cadeira no STF. Conforme determina a Constituição, a escolha cabe ao presidente da República com a sabatina feita no Senado Federal. Com relação ao meu nome, que foi cogitado em algumas oportunidades na mídia e com alguns parlamentares e colegas do tribunal, considero que me encaixo no perfil, haja vista que tenho 29 anos de carreira. Sou um juiz de carreira. A escolha cabe ao presidente, mas se acontecer seria uma bênção que a gente acolheria com muita alegria e com muita honra.





O que podemos esperar para os próximos 365 dias de sua gestão? Quais são os próximos planos do senhor à frente do TJMG?
Nos próximos 365 dias, esperamos ter mais facilidades nas atividades, haja vista que a sociedade começa a voltar ao mercado, saindo das restrições. Poderemos ter atividades presenciais, efetivando os projetos em andamento com mais facilidade, como as construções dos prédios, que, por muitas vezes são paralisadas, implantação de câmaras no nosso tribunal, especialização de varas judiciais nas comarcas e implementação de diversas medidas que ainda estão em andamento. Então, neste ano que está por vir nós estamos muito otimistas de que os projetos serão mais rápidos e mais eficazes.


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