Jornal Estado de Minas

ENTREVISTA/NILMÁRIO MIRANDA

Nilmário Miranda diz que, se eleito, retomará orçamento participativo



Uma cidade mais alegre, com menos desigualdade social e livre do neofascismo. É o que projeta Nilmário Miranda (PT), terceiro candidato à Prefeitura de Belo Horizonte entrevistado pelos Diários Associados (Estado de Minas, TV Alterosa e Portal Uai).



O petista detalha seus principais projetos de governo, como renda mínima municipal, com a qual pretende complementar o Bolsa-Família de cerca de 300 mil belo-horizontinos. Nilmário se apresenta como candidato que luta “pela democracia sempre” e “em defesa dos direitos humanos, do povo negro, LGBTs, mulheres, assistência social e cultura”.


E fala em “economia de guerra” e priorizar as micro e pequenas empresas, se eleito. “Serão os piores anos do século. Viemos de uma crise econômica, social e política, que com a pandemia se agravou. Vamos fazer uma espécie de economia de guerra, como foi pós- 1930, quando surgiu o keynesianismo, e pós- Segunda Guerra Mundial.

É quase uma situação de emergência, para poder socorrer as pessoas. Tem mais pessoas desempregadas do que empregadas hoje no Brasil”, afirma.

Qual será a sua primeira medida se for eleito prefeito?
Acredito que serão os piores anos do século. Viemos de uma crise econômica, social e política, que com a pandemia se agravou. Vamos fazer uma espécie de economia de guerra, como foi pós-1930, quando surgiu o keynesianismo, e pós-Segunda Guerra Mundial. É quase uma situação de emergência, para poder socorrer as pessoas. Tem mais pessoas desempregadas do que empregadas hoje no Brasil. Houve perda de renda. A queda de R$ 600 (do auxílio emergencial) para R$ 300 é perversa; R$10 por dia não dão nem para um prato feito. Como o povo vai viver desse jeito? Vamos ter que criar mecanismos para as pessoas viverem. Por isso, falei em economia de guerra. Precisa de um esquema tipo keynesiano, de pequenas obras, economia popular e solidária. Penso em uma renda mínima municipal para completar o Bolsa-Família, paga com moeda social – só vale em Belo Horizonte. E um banco social. Tem vários casos no Brasil e vamos aplicar aqui. Gerar empregos também. Por exemplo, trocador. Tiraram os trocadores não sei pra quê. Só agravou a situação dos motoristas, causou desemprego e aumentou a passagem mesmo assim. Ficou péssimo.  Voltar a ter escola de tempo integral, recontratar pessoas na saúde, na assistência social. Os próprios empregos virem do socorro à população.





As medidas que o senhor citou seriam implantadas em determinadas regiões da cidade para quais segmentos?
A renda municipal é para atingir pouco mais de 300 mil pessoas. São as do cadastro único, mais alguns que ficaram com renda zero. Quem tiver criança até 6 anos, acrescenta R$ 50. Ninguém ficará com menos de um quarto do salário mínimo em cada família. Vamos quase dobrar o Bolsa-Família per capita, com moeda social. Só vale aqui em Belo Horizonte. Não vale em Santa Luzia nem em Nova Lima. A pessoa só pode comprar aqui. Isso visa também recuperar as atividades econômicas locais. Tenho uma proposta de fazer por regionais. BH são nove grandes cidades. Se fossem cidades separadas, teríamos nove cidades com dois turnos. Felizmente, é uma cidade só. Regionalizar de novo. Foi um erro grave do Kalil ter acabado com as regionais. Entre Barreiro e Venda Nova olha a distância que tem! Obrigar as pessoas a se deslocarem de todas as regionais para o BH Resolve, para quê? Engarrafamentos gigantescos, Hipercentro, é tudo hiper aqui. A cidade que eu chamo do ‘bem viver’ descentraliza, tem muitos centros. Isso vale para transporte, ciclovias, educação, saúde, cultura. Para todas virarem agência de desenvolvimento regional.

Além das regionais, o que o senhor mais criticaria na gestão Kalil? E qual acerto?
Kalil foi bem na pandemia. Isso é óbvio. Eu era presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos representando o Sindicato dos Jornalistas e fizemos uma nota de apoio a ele quando ele enfrentou  Bolsonaro. Com Bolsonaro desorganizando o enfrentamento da pandemia, apoiamos o prefeito. Não o partido, o prefeito. Quando ele tomou posse, disse: ‘Não vou fazer nada, só vou tocar o que existe’. Isso é ótimo para nós. Porque nós (PT) governamos a cidade por 16 anos com quatro bons governos. Deixamos uma estrutura de governança sólida. BH funciona mesmo com prefeitos que não fazem nada. Há mobilidade, tem Plano Diretor para isso e aquilo. A saúde tem 15% há mais de duas décadas. A educação tem 30% há mais de duas décadas. A folha ocupa, no máximo, 35%, incluindo inativos. A cidade tem R$ 3 bilhões para investir por ano. A cidade funciona. Então, não é difícil administrar BH. Agora, isso é suficiente? Não. Tem 300 mil pessoas em Belo Horizonte, que a minha vice, Luana de Souza, chama de invisíveis. As políticas não as abrangem. Nem de saúde, educação, inclusão digital... Nada. A pandemia revelou essa profunda desigualdade na cidade. Sou um defensor histórico dos direitos humanos e, no meu entendimento, essa é a tarefa principal. O prefeito não tem esse projeto. Precisa tocar o que tem? É claro. Mas nós não fizemos nenhuma oposição injusta, pessoal ou agressiva. Quero chegar ao segundo turno de uma eleição com 15 candidatos que não têm debate nem em televisão, nem em lugar nenhum. O tempo de televisão tem 1min04. Não dá nem pra expor direito a proposta. Vamos chegar ao segundo turno e mostrar: ‘Olha, prefeito, você acabou com a escola de tempo integral, isso era estratégico para combater a desigualdade. Congelou as creches, isso era estratégico para BH. O transporte, você falou que ia fazer isso e aquilo, e ficou pior no final do seu governo’. Vamos ter que resgatar isso. Nada dessa selvageria, desse ódio que quiseram implantar em nossa cidade. É uma cidade que nunca teve esse ódio e espero que nunca mais tenha.

O senhor falou em 300 mil invisíveis, entre eles, obviamente, estão os moradores de rua. Como pretende resolver esse problema se for eleito?
Em primeiro lugar, outra crítica a ele (Kalil). Ele falou que, se tratar bem demais, der muito conforto – ele usou essa expressão – vai atrair mais. Isso para mim é uma negação dos direitos humanos, à dignidade de cada ser humano. O que é ‘conforto’? Fazer com que eles tomem café da manhã, almocem e jantem todos os dias? Tenham um lugar de se lavar, para dormir? Quando precisar, tem duas mil pessoas que podem ser acolhidas. Mas existem 10 mil (moradores de rua na capital). Isso é um recorde histórico! O que temos que fazer? Temos 70 mil imóveis não ocupados em BH. É fazer aluguel social, autoconstrução. Visitei dezenas de conjuntos de autogestão feita pela prefeitura. As últimas grandes intervenções em BH, feitas nos aglomerados, fomos nós que fizemos. Vila Viva, urbanização da Favela da Serra, Morro das Pedras, Barragem Santa Lúcia. Fizemos isso e não foi feito mais nada. Recuperar isso. É claro que não se governa olhando para trás. Tem que projetar a partir dos novos desafios. Vamos voltar com o Orçamento Participativo, a democracia participativa, a ter regionais fortes, enfrentar o problema dos moradores de rua, que envolve habitação, assistência, acolhimento, para os que são LGBT expulsos de casa. Tem um projeto genial feito pelo Fernando Haddad que se chama Transcidadania, que é pegar as pessoas LGBT que moram nas ruas e capacitá-las para ter outras coisas que não seja a prostituição, doenças, violência, morte. Há pessoas que têm sofrimento mental e temos que tratá-las com os Centros de Atenção Psicossocial (Caps).





Se eleito, como será sua relação com os governos Zema e Bolsonaro?
A mesma que tivemos. Fui ministro do governo Lula. Tivemos quatro governos, 16 anos, e nunca discriminamos uma cidade por ser do partido A, B ou C. Quando se discrimina uma cidade, prejudica-se o povo. Zema vai ser contra quem votou nele? Vai perseguir porque um prefeito é do PT e é contra as privatizações que ele quer fazer, que achamos totalmente absurdas? Não. Tem que haver relação republicana. O que tiver que investir, tem que investir. Assim como o governo federal. Felizmente, para muitas políticas públicas existe o pacto federativo, que diz que a União deve entrar com isso e aquilo. Se ela recusar, você judicializa e a cidade ganha. Teremos uma relação republicana normal para tratar os governos. Uma coisa é oposição política, que meu partido faz de forma vigorosa ao governo Bolsonaro, que a gente chama de neofascista, de rompimento com a democracia, com a soberania nacional, antipopular. Agora, como prefeito, meu papel não é esse. Isso é meu partido que faz, na Câmara Municipal, na Assembleia, na Câmara dos Deputados e no Senado. O prefeito governa para todos. Mesmo quem não votou nele e até quem não gosta dele.

Com essa pandemia, como o senhor pretende recuperar a economia da cidade?
Por exemplo, usar o potencial do orçamento da prefeitura em contratações de outra maneira, privilegiando pequenas e médias empresas. Em vez de grandes empresas e empresários amigos. Nada disso. Onde mais gera emprego no Brasil é na pequena e micro. Esse esquema também de fortalecer o mercado interno com a renda municipal, atingindo mais de 300 mil pessoas, é bom para a economia, um poderoso vetor econômico. A moeda social só vale para Belo Horizonte, logo fortalece pequenas e microempresas. Em todas as áreas, serviços e comércio. Acho que não tem muito segredo.

Se eleito, como o senhor pretende tratar a retomada das aulas com a pandemia?
No caso da pré-escola, que é prioridade, as creches estão paradas no tempo. Estão do mesmo tamanho de quando começou o governo Kalil. Óbvio que não atendem. É uma maneira de gerar emprego também expandindo as creches. O ensino infantil é fundamental. Estavam implantando, já estava na metade dos alunos com escola em tempo integral. O aluno chega de manhã, sai à tarde, com almoço de boa qualidade, tem acompanhamento para recuperar esse tempo perdido. Ter preparação para isso. E ele acabou com a escola em tempo integral. Agora, são só quatro horas e meia. Como faz uma mulher que sai de casa às 5h e volta às 19h? Como é que faz? Vai deixar os filhos onde? São as que mais precisam de ensino em tempo integral. As crianças serem bem cuidadas é fundamental para a luta contra a desigualdade social. No caso da exclusão digital, temos um projeto de levar fibra ótica para todas as escolas municipais. De modo a atender também a uma vertente que é a cidade inteligente. Tínhamos aquele projeto da BHTec, das startups aqui, da UFMG, da Prodabel, de levar fibra ótica para as favelas, subir morros. Porque o mercado não sobe. Tem que ser o poder público. O mercado procura o lucro, é normal, o capitalismo funciona assim. Não sobe o morro porque lá não tem lucro. O poder público tem que levar inclusão digital via escolas também. Tem um déficit crônico de programadores, então tem que começar desde os 7 anos de idade a preparar as pessoas para o futuro. Tem um socorro emergencial e tem que preparar para as vocações de BH para o futuro.


PERFIL

Nilmário Miranda
Idade: 73 anos
Naturalidade: Belo Horizonte
Estado civil: casado
Filhos: três
Carreira: Foi deputado federal e estadual e secretário de Direitos Humanos no governo Lula. Concorreu ao governo de Minas em 2002 e 2006





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