Jornal Estado de Minas

EX-ALIADOS

Mandetta diz que Bolsonaro fará uso político do exame

Mapa informativo que mostra a situação de Minas Gerais com o COVID-19 (foto: Mapa informativo que mostra a situação de Minas Gerais com o COVID-19)
Ter a certeza de que está infectado com o novo coronavírus não mudou algumas das convicções do presidente Jair Bolsonaro, que aproveitou a entrevista desta terça-feira para defender o uso da hidroxicloroquina. E também para tripudiar sobre quem é contra o uso do medicamento em pacientes com sintomas leves da COVID-19, como o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que não demorou a revidar.



“Muita gente faz exame e toma conhecimento que já foi acometido pelo vírus. A maioria da população não sente absolutamente nada. Eu tive cansaço, febre. Se tivesse tomado cloroquina, não teria sentido nada”, afirmou o chefe do Executivo.

Ele lembrou que o titular da Saúde foi contrário ao uso da chamada “cloroquina”, mas outros não são, inclusive gente próxima a ele. “Em Campo Grande (MS) (terra natal de Mandetta), o prefeito (Marquinhos) Trad fez apelo ao Governo Federal e hoje o Ministério da Saúde já vai mandar para lá um carregamento de hidroxiclorquina. E olha a ironia do destino: o Trad é primo do Mandetta, que era contra o uso do medicamento. O protocolo dele previa uso apenas em caso grave. E em caso grave a chance de sucesso é quase zero.”

Em entrevista à Globonews, o ex-ministro da Saúde, porém, desmereceu a fala do ex-chefe. Segundo ele, mesmo que o presidente se cure com os medicamentos que vem tomando, isso não significa nada, pois faltarão evidências científicas, fazer experimentos. 



Ele ressaltou que a Organização Mundial de Saúde (OMS) suspendeu as pesquisas com a droga, depois que não houve comprovação de eficácia e, principalmente, por provocar arritmia em pacientes propensos a cardiopatias. 

“Não se trata de ser contra, sempre tratei (a hidroxicloroquina) como mais uma droga necessária em um arsenal para combater a pandemia. O que fizemos foi parametrizar para pacientes gravíssimos, depois graves. E a polêmica é se deveria dar para pacientes leves, pois não havia estudo. Se você sabe que a maioria vai sarar sem nenhuma complicação, a pergunta é 'você deve ministrar um medicamento que pode permitir arritmia cardíaca?' Tínhamos tudo do melhor em termos de recursos. Então, não podemos patrocinar via estado algo que pode matar as pessoas. E algumas pessoas próximas ao presidente achavam que sim. E o Nelson Teich (sucessor no Ministério da Saúde) achava a mesma coisa. Depois, sem nenhum médico no caminho, puderam promover a distribuição. O que estamos precisando é de ciência”, afirmou Mandetta.
 

USO POLITIZADO 

 
Para o médico, a cloroquina teve seu uso politizado, primeiro pelo presidente norte-americano Donald Trump, depois por Bolsonaro, para que as pessoas tivessem tranquilidade em meio à pandemia. “Mas não pelo viés de saúde, mas pelo político.”



Desde a saíde de Teich, em meados de maio, o Brasil está sem titular da Saúde. Quem responde pela pasta interinamente é o general Eduardo Pazuello, reconhecido como bom administrador, mas sem formação médica, o que é criticado por muitos, ainda mais em meio a uma pandemia.

“Alguns criticam o Pazuello por não ser médico. O (José) Serra lá atrás (governo Fernando Henrique Cardoso) era economista e foi um bom ministro da Saúde. Ele está funcionando, é ruim de imprensa, mas excelente gestor da saúde. Mas não vai ficar para sempre, está comemorando três meses no cargo e já deu sua contribuição também”, afrimou Bolsonaro, indicando que busca um titular para a Saúde.

Apesar das diferenças de visão sobre a pandemia, Mandetta afirmou esperar que o Brasil encontre o melhor caminho para vencê-la. E deseja pronta recuperação do presidente. 

"Seria bom que o governo falasse a mesma língua. Fico feliz quando o pessoal chega e fala: ‘eu conseguia entender o que o senhor estava falando’. A linguagem chegava a todas as camadas. Sempre me preocupei com isso. A primeira linha de defesa está no núcleo familiar, ali que se discute um problema, no caso um vírus. E ela foi construída, apesar de o presidente sempre destruí-la ao pensar apenas na economia", disse. 


"Era um falso dilema, pois está para lá de demonstrado de que a economia se recupera o quanto antes a socieade se prepara, a economia se recupera quanto mais as pessoas sentem que houve união contra o agente infeccioso. Isso foi explicado inúmeras vezes ao presidente, mas ele permaneceu apegado a isso. E o brasileiro, depois de determinado tempo, jogou a toalha, passou a aceitar 1,3 mil mortos por dia, falam que está diminuindo quando morrem 1,2 mil por dia. Muito disso vem por pressão política, pelas eleições municipais, da opinião pública, está todo mundo cansado.”