Jornal Estado de Minas

Ajuste fiscal e privatizações são únicos planos para recuperação financeira de Minas, diz secretário


A única alternativa para tirar as contas do vermelho é a adesão de Minas Gerais ao plano de recuperação fiscal proposto pela União. A análise é do secretário da Fazenda, Gustavo Barbosa, que em entrevista ao Estado de Minas faz alerta para a necessidade de o estado cortar despesas – o que passa necessariamente pela alteração nas regras para aposentadoria – e aumentar a receita. Barbosa defende ainda a venda de estatais como a Cemig, medida que é imposta pela Lei Complementar 159/17, que rege o plano de recuperação. “A gente está falando de dezenas de bilhões de reais que entrarão para o estado buscar se equilibrar. 




 
Tenho que fazer o que a gente chama de liquidez. Deixo de pagar dívida, faço caixa com privatizações, e isso faz com que eu administre o caixa nos próximos anos para que consiga trazer estabilidade, pagar o salário do servidor”, afirma. As declarações de Gustavo Barbosa reforçam discurso do secretário de Governo, Bilac Pinto, que na sexta-feira pediu aos deputados estaduais que discutam o plano sem “paixão” e com “responsabilidade”. Segundo ele, sem as medidas emergenciais, ao fim dos quatro anos da gestão Romeu Zema, a dívida de Minas chegará a R$ 230 bilhões.

O governo vem apontando o ajuste fiscal como o caminho para resolver o problema do caixa de Minas. Por que ele é tão importante? 
Hoje estou estruturalmente com um problema: gasto mais do que arrecado. É simples assim. Mesmo que começasse o estado hoje, 1º de janeiro de 2019, sem nenhum resto a pagar, sem nenhuma dívida, sem nada, tenho uma estrutura de despesa maior que a estrutura de receita. Então é por isso que é preciso ajuste fiscal. Você não consegue fazer isso através de paliativos, por exemplo, receitas extraordinárias que foram utilizadas nos últimos anos. Fecha o orçamento do estado com receitas extraordinárias, quais sejam, empréstimos, saque de dividendos das estatais maior do que elas tinham capacidade de passar para manter suas atividades, saque em depósitos judiciais... Enfim, são situações que nos últimos cinco anos trouxeram quase R$ 20 bilhões de receitas extraordinárias. Resolveu o problema? Não, porque continuei com uma despesa num crescimento maior que minha receita. Então, é preciso ajuste fiscal para reverter esse processo. E como se faz? Você faz com que ela cresça em ângulo menor do que cresceria se não fosse feito nada. E melhora a receita. E uma informação importante: o governador não aceita aumentar a receita com o aumento de imposto. Então, a gente vai melhorar a receita somente com melhoria de processos na Fazenda, receita tributária. Obviamente, vamos continuar buscando outro tipo de receita: tenho uma carteira de mais de 500 imóveis. O estado não precisa e quero vender os imóveis. É uma receita extraordinária? É. Mas vai me ajudar a fazer caixa.

Mas ,na prática, que medidas serão tomadas para evitar o aumento da despesa?
Não posso antecipar porque a gente ainda não apresentou todos os planos (na Assembleia Legislativa). A gente apresentou solicitação de adesão (ao plano de recuperação), um PL da operação que a gente está buscando para fazer com que os pagamentos do 13º salário e do acordo com a AMM (Associação Mineira dos Municípios) sejam feitos e um PL para a venda da Codemig. Esse é um ponto. Há algumas situações que estão previstas na Lei Complementar 159/17, que rege o regime de recuperação fiscal. Pode dar aumento maior que a inflação? Não. E aqui você tinha sistematicamente aumento maior que a inflação. Imagine que o problema maior do estado é a despesa de pessoal, quase R$ 40 bilhões. Qualquer 1% são R$ 400 milhões, 2,5% são R$ 1 bilhão. Então, tenho capacidade de reduzir esse ângulo de despesa nesse sentido.




 
 



O Rio foi o único estado que aderiu, até o momento, ao programa de ajuste fiscal com a União. Há críticas de que as medidas não deram certo. O próprio presidente da Assembleia Legislativa, Agostinho Patrus, esteve no Rio para conversar sobre o assunto e voltou criticando o ajuste. Por que aqui seria diferente?
Há controvérsias nessa afirmação. O que não deu certo? Vamos contextualizar o Rio de Janeiro pré-ajuste fiscal. Quatro meses de salários atrasados, décimo-terceiro não pago, servidor precisando trazer papel higiênico de casa, índices de saúde e educação não cumpridos. Qual é a situação de dezembro de 2018? Décimo-terceiro pago, salário em dia, índice de saúde mais elevado, não precisa mais levar papel higiênico. Éóbvio que ali tem um processo de resolução de curto e médio prazo. O plano de recuperação fiscal não é o fim de um governo. Ele é o meio, uma forma de ter mais recursos para entregar para educação, para saúde e segurança. O plano de recuperação fiscal é por adesão, ou seja, entro e saio na hora que quiser. Se fosse realmente danoso ao Rio, qual seria a atitude dos gestores? Seria sair ou permanecer? Entendo o que o presidente da Assembleia falou, mas é importante entender que o plano é importante para resolver situações. Ele pode não ser o melhor, fiz o plano lá, ele precisa de aprimoramento, sem dúvida. Foi o primeiro, tanto Rio de Janeiro quanto a União não tinham exata noção, porque tudo é novo. Claro que você faz tudo dentro da técnica possível, mas não necessariamente vai acontecer ao longo do tempo, e por isso precisa de rever sempre. Agora vai para a Assembleia para uma discussão. Se a Assembleia entender que teria alternativas, não consigo enxergar. Estamos em um país democrático e a Assembleia é soberana para aprovar e é o que a gente vai buscar.

Quando o senhor diz que não enxerga outra opção, significa que o governo não tem plano B, caso o ajuste não seja aprovado na Assembleia?
Quando você tem um déficit nos próximos seis anos de mais de R$ 110 bilhões, não existe plano B. Não conheço nenhum outro tipo de plano que faça que se adeque a um orçamento negativo de R$ 110 bilhões em seis anos. Aí, no outro ano, mais R$ 16 bilhões de déficit, no outro ano, mais. Então, não conheço nenhum outro tipo de ferramenta, plano, instrumento que possa reverter esse processo que não seja o plano de recuperação. Mas não sou o dono de todas as verdades do mundo.

Quando o servidor terá o salário pago no quinto dia útil e em parcela única?
A gente está buscando primeiro uma operação (antecipação de receita de nióbio da Codemig) que ajuda inicialmente o processo. Se a operação ocorrer no montante acima de R$ 5 bilhões ou R$ 6 bilhões, a gente consegue pagar o décimo-terceiro e fazer gestão de caixa para que nos próximos três meses consiga esse movimento. Mas se não vier o ajuste, isso duraria apenas esse processo de alívio de caixa. Porque continuarei gastando o mesmo que gastava antes e a minha receita continuará a mesma. Essa é uma receita extraordinária que a gente está tentando para minimizar essa situação do servidor público. Isso ajudaria no curto prazo. Não teria condições de manter isso se não fizer mudanças estruturais.






Entre os pontos do ajuste fiscal está a privatização. Por que é necessário vender estatais?
A Lei 159/17 exige a privatização, esse é um primeiro ponto. Segundo, o governador foi eleito falando que venderia as estatais. Então, não há nenhum desalinhamento no que a gente vem falando. Terceiro, as estatais cumpriram  papel fundamental num determinado momento para o desenvolvimento de Minas. Não questiono as empresas. Agora, elas hoje não têm capacidade de investimento para prestar bom serviço. Nos últimos ano,s foram drenados recursos delas, os dividendos retirados de forma inadequada, muito mais do que deveria. Hoje, tenho a Cemig que precisa nos próximos anos de mais de R$ 20 bilhões de investimento do governo. Ela tem capacidade de fazer isso? Não. E o acionista majoritário, controlador, tem condição de colocar dinheiro? Esse acionista não está pagando salário. É uma coisa muito pragmática. O papel do governo é prestar saúde, educação e segurança. Ele tem que ter empresa de energia? Tem que ter regulação e agência fiscalizadora importante que tenha capacidade de cobrar o serviço bem-feito. Para o plano é importante (privatizações). A gente está falando de dezenas de bilhões de reais que entrarão para o estado buscar se equilibrar. Tenho que fazer o que a gente chama de liquidez. Deixo de pagar dívida, faço caixa com as privatizações, e isso faz com que eu administre o caixa nos próximos anos para que consiga trazer estabilidade, pagar o salário do servidor e o fornecedor.

Recentemente, deputados de Goiás participaram de audiência na Assembleia de Minas e fizeram relato sobre prejuízos e aumento da conta de luz para a população depois da privatização da Celg, a empresa de energia goiana. Que garantias os mineiros podem ter que o mesmo não acontecerá com a venda da Cemig?
Não participei dessa questão, mas algumas informações são públicas. As mensurações de prestação de serviço melhoraram depois da privatização, gerou emprego, gerou investimento. Mas qual é o contexto? A Celg é uma das piores fornecedoras de energia elétrica do país. Melhorou inclusive a colocação dela, mas ainda é ruim. Agora, alguém chamou também a Eletropaulo para conversar? Vamos pegar todas as amostragens e ver o que é. Tenho empresas que deram certo também. É importante ouvir todos os lados. A Celg, a meu ver, não tem avaliação ruim como é colocado. É preciso contextualizar o que era a Celg e o que ela é hoje, o que ainda precisa ser aprimorado.
  
 


 
Mas qual é a garantia que a venda da Cemig vai estar no grupo de operações positivas, e não negativas? 
Qual a garantia que ela está na negativa? É a mesma garantia que se dá que vai estar na positiva. O que faz com que isso aconteça? Que se tenha uma agência reguladora forte, uma cobrança da sociedade, é assim que funciona. Por que vou me inspirar na Celg se posso me inspirar em São Paulo? A gente se parece mais com São Paulo do que com Goiás, sob a ótica da economia. E não é demérito de Goiás, mas a gente está no Sudeste e tem que se inspirar nas situações que também deram certo. Insisto: para que a gente garanta isso, precisa de uma agência reguladora bastante atuante, as tarifas são definidas pela agência reguladora, e a cobrança da sociedade também. E vamos lembrar mais uma vez que o governador foi eleito com mais de 70% dos votos falando que ia privatizar. Vamos colocar isso bem claro: será que a sociedade falou: 'você pode, mas privatizar não pode”, será? Era um discurso forte que ele tinha.





Estados e municípios ficaram de fora da reforma da Previdência, pelo menos por enquanto. Qual a importância das mudanças na aposentadoria para as contas de Minas?
É fundamental e vou dar uma ideia de valor: no ano passado, o estado teve déficit de R$ 17 bilhões, aproximadamente. Isso não é despesa, é déficit previdenciário. Este ano, R$ 18,3 bilhões. No ano que vem, R$ 19,6 bilhões. Esse recurso é usado para pagar despesa de aposentado e pensionista. Nossa receita corrente líquida, que é o caixa do estado, é algo próximo de R$ 60 bilhões. Estou tirando quase R$ 20 bilhões desse dinheiro e estou pagando aposentadoria de 300 mil pessoas. Você não acha que precisa reformar isso? É justo? Não é culpa deles, é culpa de uma lei ultrapassada. Nós hoje vivemos mais. O que justifica alguém se aposentar aos 48, 49 anos? Não acha que quando chegar lá vai estar em pleno exercício da sua faculdade mental? Tenho 54 anos e ainda tenho muito para colaborar. Você tem situações hoje, insisto, não é culpa do servidor, mas a pessoa trabalha 25 anos e vive aposentada por 40 anos. Essa conta não fecha. Porque temos aposentadoria precoce. Nos estados, a grande maioria, na faixa de 70%, se aposenta cinco anos mais cedo. São os professores, segurança pública e saúde, que é a grande maioria dos servidores públicos. A exceção é o pessoal se aposentar na normalidade. Isso é ótimo, mas tem custo. Você precisa postergar a ideia da aposentadoria. Minas precisa aumentar a contribuição previdenciária porque o custo muito elevado. Poucas pessoas são beneficiadas. É legal, mas estrangulou o orçamento. Se tirar o resultado da Previdência, somos superavitários em R$ 3 bilhões ao ano. Não posso demitir aposentado, pensionista, não posso reduzir aposentadoria nem pensão.

Minas vai fazer reforma caso os estados não sejam incluídos no texto que tramita no Congresso?
Nossa prioridade agora é o plano de recuperação fiscal, então vamos batalhar para que ele aconteça. Se não for lá (no Congresso), é um problema que também precisa ser atacado. Não pode colocar o problema debaixo do tapete. Alguns estados que não estão com essa discussão (ajuste fiscal) na Assembleia estão pensando em fazer voo solo, independentemente lá do Congresso. Mas, no nosso entendimento, a batalha agora é o plano de recuperação fiscal, até porque os efeitos do plano de recuperação são mais imediatos do que os de uma reforma da Previdência.


















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