Jornal Estado de Minas

POLÍTICA

Bolsonaro e Moro atribuem tensão a 'rede de intrigas'

Após duas semanas de confronto, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, tiveram nesta terça-feira, 27, uma conversa reservada no Palácio do Planalto. Interlocutores relataram que no encontro falou-se numa "rede de intrigas" que teria o objetivo de desgastar a relação dos dois. Bolsonaro costuma ser municiado por grupos de WhatsApp e, muitas vezes, age de acordo com as informações que recebe pelo aplicativo.

Bolsonaro e Moro não fizeram comentários públicos sobre a reunião. Mas, poucas horas após o encontro reservado, o ministro afirmou e tuitou que o presidente tem compromisso com o combate à corrupção. Bolsonaro respondeu na rede social: "Vamos, Moro!". Recebeu de volta: "Estamos juntos, Sr. Presidente. Pelo Brasil e pelo futuro".

Interlocutores viram na troca de declarações o resultado do que teriam combinado a portas fechadas.

Bolsonaro está incomodado com as críticas de interferência na Receita Federal e na Polícia Federal, o que afeta sua imagem, inclusive entre seus seguidores nas redes sociais. Até esta terça, Moro, a quem a PF é subordinada, não havia saído em defesa do presidente. No Planalto, não falta quem lembre que, num dos momentos mais delicados para o ministro, quando vazaram conversas com membros da Lava Jato, Bolsonaro o apoiou publicamente.

Na semana passada, o presidente chegou a responder irritado a um comentário de internauta de que ele não poderia abandonar Moro. A mensagem dizia: "Jair Bolsonaro, cuide bem do ministro Moro. Você sabe que votamos em um governo composto por você, ele e o Paulo Guedes". Em resposta, escreveu: "Todo respeito a ele, mas o mesmo não esteve comigo durante a campanha, até que, como juiz, não poderia".

Enquanto Bolsonaro é acusado de interferir nos órgãos de controle que de alguma forma esbarraram em integrantes de sua família, o ministro aparece como o grande defensor do trabalho de investigação.
No domingo, o contraponto entre os dois se acentuou. Moro recebeu demonstrações de apoio em várias cidades do País durante manifestação contra corrupção. Já Bolsonaro foi cobrado a vetar integralmente a Lei de Abuso de Autoridade, movimento que o colocará em confronto com o Congresso.

Na sexta-feira passada, um antigo aliado de Moro, o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato, disse em entrevista à Gazeta do Povo que o presidente está se distanciando da pauta de combate à corrupção. Mais uma vez, o ministro não saiu em defesa de Bolsonaro.

Além do silêncio e da popularidade de Moro nas redes sociais, medida em relatórios de inteligência elaborados pelo Ministério da Justiça, interlocutores do presidente dizem que ele se incomoda com a resistência do ministro a atender algumas de suas sugestões. Uma delas foi a nomeação do delegado Alexandre Saraiva para a Superintendência da PF no Rio, rejeitada pela cúpula do órgão com apoio de Moro.

Um interlocutor frequente de Bolsonaro resumiu: "O diálogo do presidente com todos os ministros é muito direto e muito franco. Alguns têm mais resistência a atender as suas solicitações do que outros.
Moro está um pouco mais nessa fase, mas não tem desgaste capital".

Os dois lados negam, contudo, que a relação esteja próxima de uma ruptura e admitem que a saída de Moro seria ruim para o governo e para o próprio ministro. Nesta quinta-feira, 29, eles estarão lado a lado num evento em Brasília para lançar um dos programas-vitrine da Justiça. Denominado de "Em frente Brasil", prevê a união das forças de segurança municipal, estadual e federal para atacar o problema de violência urbana inicialmente em cinco cidades de médio porte.

Defesa

As primeiras palavras de Moro em defesa de Bolsonaro vieram horas depois do encontro a sós que tiveram na terça. Moro abriu um evento da PF no qual reiterou o compromisso do presidente da República com o combate à corrupção e, ao mesmo tempo, qualificou como "extraordinário" o trabalho do diretor-geral da corporação, Maurício Valeixo. Nas últimas semanas, Bolsonaro ameaçou demitir Valeixo com o discurso de que é ele "quem manda" na PF.

"O presidente Jair Bolsonaro tem um compromisso com prevenção e combate à corrupção. Esse foi um dos temas centrais que me levaram a aceitar esse convite, e eu creio que o governo tem avançado nessa área", disse. "Claro que às vezes há alguns reveses, mas nós temos avançado no enfrentamento da corrupção", complementou.

Desde que assumiu o cargo, Moro sofreu algumas derrotas, como a retirada do antigo Conselho de Controle de Administração Financeira (Coaf) da pasta da Justiça e Segurança Pública. Também enfrenta dificuldades para conseguir a aprovação do seu pacote anticrime, que não recebeu o respaldo do governo para ser votada com celeridade.

Verba

Também após o encontro com o presidente, o ministro, que havia reclamado de forma contundente do corte de verba em ofício ao ministro Paulo Guedes (Economia), manifestou resignação. A interlocutores, disse que todos os ministérios serão afetados com redução no orçamento em 2020.

Produtividade

O delegado Ricardo Saadi, superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro - cuja substituição foi anunciada no dia 15 pelo presidente Jair Bolsonaro, que alegou "questão de produtividade" - é um dos mais bem avaliados no Índice de Produtividade Operacional (IPO), que mede o desempenho das superintendências em todo o País.

Nesse índice, produzido a partir de dados sobre operações deflagradas, inquéritos resolvidos e atividades administrativas, entre outras variáveis, a Superintendência do Rio de Janeiro, sob a chefia do delegado Saadi, passou neste ano de 24.º para 4.º no ranking de desempenho.
O índice compara os meses de agosto de 2018 a este mês.
O dado é sigiloso para não expor os últimos da lista.

A produtividade da Superintendência da PF no Rio era uma das mais baixas do País há alguns anos. Sob o comando do delegado Saadi, contudo, houve um salto de eficiência. Ele assumiu o posto em fevereiro do ano passado e comandou a divisão em diversas operações de grande impacto, como a que levou à prisão o doleiro Dario Messer.

Além disso, a PF do Rio deflagrou a Operação Furna da Onça, que apura, entre outros fatos, a chamada "rachadinha" entre servidores e deputados na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

Por causa da polêmica, a mudança na superintendência do Rio vai aguardar mais um pouco. O jornal O Estado de S. Paulo apurou que a estratégia é evitar mexer neste assunto até esfriar o clima. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo..