O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse à juíza Gabriela Hardt nesta quarta-feira, 14, que "nunca foi tão fácil ser ladrão nesse país". Interrogado por três horas na ação penal em que é réu no caso do sítio de Atibaia, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o petista exaltou-se quando questionado sobre propinas pagas no âmbito de contratos da Petrobras e a criação de um suposto "caixa-geral" do PT, que teria sido administrado pelo ex-tesoureiro da legenda João Vaccari, preso na Operação Lava Jato desde abril de 2015.
"Eu não acredito", disse Lula, durante a audiência marcada por um embate nervoso e ríspido com a magistrada.
"O senhor não acredita, mas foi lhe dito nos outros depoimentos sobre quantidades de valores devolvidos por diretores e gerentes da Petrobras relativos a propinas e os valores em contas bloqueadas de políticos no exterior", seguiu Gabriela Hardt.
"Aí é caixa deles, na verdade eles ganhavam um prêmio. Nunca foi tão fácil ser ladrão nesse país. Você rouba, aí depois você faz a delação e fica com um terço do roubo ou dois terços do roubo", retrucou o ex-presidente.
"Mas, então aconteceu?", indagou a juíza.
"Eu quero saber se encontraram dinheiro do Vaccari no exterior, eu quero saber se encontraram conta do PT no exterior. Por isso, quando um cidadão vem aqui e grita 'olha, era tudo do caixa do PT, era tudo do caixa do PT', ele está mentindo!", afirmou o petista.
Gabriela seguiu. "Quando se vincula pagamento no exterior ao publicitário contratado pelo PT, o senhor não vê vinculação numa coisa com a outra?"
"Eu não tenho vinculação uma coisa com a outra."
"Eu não estou falando que o senhor tem, estou falando de propinas que são imputadas ao partido."
"Veja, se o empresário resolveu corromper alguém e depositar o dinheiro a pedido do cidadão que tinha direito àquele dinheiro no exterior é problema dele. Paga pelo erro, tá? Até porque, agora, a MP aprovada no ano passado anistiou todos os ladrões que depositaram dinheiro lá fora, todos os sonegadores que depositaram foram anistiados."
"Sonegador pode ser, lavagem de dinheiro não, senhor ex-presidente", corrigiu Gabriela.
"O que eu quero dizer é que toda vez, é a segunda vez, o Léo (Pinheiro, da empreiteira OAS) vem aqui e diz 'foi caixa do Vaccari'. O Vaccari fez uma carta desmentindo e o juiz Moro não aceitou.
Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, também é réu na ação penal do sítio de Atibaia. Em seu interrogatório, ele detonou Lula. Disse que o sítio era mesmo para Lula.
No interrogatório desta quarta, 14, a juíza cercou o ex-presidente com indagações sucessivas sobre a reforma do sítio e a instalação da cozinha - tudo ao custo de R$ 1,02 milhão, valor supostamente bancado pelas empreiteiras OAS e Odebrecht e pelo amigo do ex-presidente, o pecuarista José Carlos Bumlai.
A juíza perguntou ao petista sobre eventual pagamento aos executores das benfeitorias na propriedade rural. Lula reagiu com veemência.
"Eu nego veementemente, eu nego a existência dessa conta-geral."
"Quem fez a reforma da cozinha?", insistiu a juíza.
"Eu não sei quem fez, o que eu sei é que foi discutido entre o Fernando (Bittar, em nome de quem está o sítio de Atibaia), a mulher do Fernando e a Marisa (ex-primeira dama, morta em fevereiro de 2017). Precisava aumentar que a cozinha estava pequena."
A juíza insistiu uma vez mais. "O sr não achou estranho não buscar a OAS para ressarcir? Fernando Bittar disse que o sr e dona Marisa iam pagar. O sr. pagou?"
"Estamos falando de 2014, eu não era mais presidente da República.
O ex-presidente foi irônico. "Não sei se a sra é casada, mas o seu marido entende pouco de cozinha, como eu. Não era comigo esse assunto."
"Sou divorciada", disse Gabriela.
Defesa
O advogado Cristiano Zanin Martins, defensor de Lula, divulgou a seguinte nota:
"Depoimento de Lula mostra arbitrariedade da acusação
O ex-presidente Lula rebateu ponto a ponto as infundadas acusações do Ministério Público em seu depoimento, reforçando que durante o seu governo foram tomadas inúmeras providências voltadas ao combate à corrupção e ao controle da gestão pública e que nenhum ato de corrupção ocorrido na Petrobras foi detectado e levado ao seu conhecimento.
Embora o Ministério Público Federal tenha distribuído a ação penal à Lava Jato de Curitiba sob a afirmação de que 9 contratos específicos da Petrobras e subsidiárias teriam gerado vantagens indevidas, nenhuma pergunta foi dirigida a Lula pelos Procuradores da República presentes à audiência. A situação confirma que a referência a tais contratos da Petrobras na denúncia foi um reprovável pretexto criado pela Lava Jato para submeter Lula a processos arbitrários perante a Justiça Federal de Curitiba. O Supremo Tribunal Federal já definiu que somente os casos em que haja clara e comprovada vinculação com desvios na Petrobras podem ser direcionados à 13ª. Vara Federal de Curitiba (Inq. 4.130/QO).
Lula também apresentou em seu depoimento a perplexidade de estar sendo acusado pelo recebimento de reformas em um sítio situado em Atibaia que, em verdade, não têm qualquer vínculo com a Petrobras e que pertence de fato e de direito à família Bittar, conforme farta documentação constante no processo.
O depoimento prestado pelo ex-Presidente Lula também reforçou sua indignação por estar preso sem ter cometido qualquer crime e por estar sofrendo uma perseguição judicial por motivação política materializada em diversas acusações ofensivas e despropositadas para alguém que governou atendendo exclusivamente aos interesses do País.
Cristiano Zanin Martins".