Jornal Estado de Minas

Procuradores temem que soltura de Dirceu prejudique andamento da Lava-Jato


A decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) que permitiu a soltura do ex-ministro José Dirceu — que cumpre pena de 30 anos e 9 meses — coloca mais uma vez em debate a prisão após condenação em segundo grau. Por 3 votos a 1, os integrantes do colegiado concederam ontem liminar que autoriza que o petista responda o processo em liberdade até julgamento do último recurso possível. A proposta que resultou, de forma provisória, na revogação da prisão partiu do ministro Dias Toffoli. Os advogados questionaram a condenação do cliente pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Apesar de a decisão não mudar o entendimento da Corte sobre o momento da prisão, pode servir de base para reclamações de condenados em situação parecida.

Na mesma sessão, foi solto também o ex-assessor do PP, João Claudio Genu, e foram anuladas provas colhidas pela Polícia Federal contra a senadora Gleisi Hoffman (PT-RS). A Corte também liberou da prisão o empresário Milton Lyra, apontado como operador de propina do MDB do Senado. Ele é acusado de envolvimento em um bilionário esquema de fraudes com recursos de fundos de pensão Postalis, dos Correios e no Serpro.
Em relação a Dirceu, Toffoli propôs que fosse concedida a liberdade ao ex-ministro após o relator da Lava-Jato no STF, Edson Fachin, fazer um pedido de vista — algo que adiaria a análise do recurso. Se a decisão não fosse tomada ontem, o assunto seria retomado apenas em agosto, após o recesso do Poder Judiciário.
Dias Toffoli viu “plausibilidade” em um recurso apresentado pelos advogados de Dirceu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Na ação, a defesa alega que a prisão em segunda instância não é automática e que o próprio STF chegou a revogar uma prisão preventiva de Dirceu. O ministro Fachin então pediu mais tempo para avaliar a situação. Foi nesse momento que Toffoli propôs conceder a liberdade de ofício, ou seja, por iniciativa própria, sem que uma liminar fosse solicitada pela defesa. Ele entendeu que pode existir erro na “dosimetria da pena”, o cálculo realizado por parte do TRF-4 para definir quanto tempo Dirceu ficará preso.

O voto dele foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Fachin alertou o colega de que ele estava indo em direção a um entendimento contrário ao que já foi definido pelo plenário do Supremo, que passou a permitir o encarceramento assim que esgotados todos os recursos na 2ª instância de Justiça.

Ao rebater as alegações do relator da Lava-Jato, Toffoli então afirmou que essa decisão vale apenas para o processo em questão e não vai contra o que já foi definido pelos demais colegas em julgamento no plenário. “Vossa excelência está colocando no meu voto palavras que não existem. Jamais fundamentei contrariamente à execução imediata da pena pelo STF.
Não tem a ver com a execução imediata da pena”, disse.

Em parecer, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se posicionou contra o pedido de liberdade de Dirceu. “Diante do novo entendimento desta Suprema Corte, a execução da condenação, com a prisão do réu, será medida a ser aplicada automaticamente, como efeito imediato decorrente do acórdão condenatório”, escreveu Dodge.Preso desde maio deste ano, Dirceu foi condenado a 30 anos e 9 meses de prisão, pelo TRF-4, no âmbito da Lava-Jato, acusado dos crimes de corrupção passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Ele cumpria pena no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.

Tempo recorde


As alegações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva são semelhantes às de Dirceu. Os advogados do ex-presidente sustentam que ele não teve um julgamento justo no TRF-4, e que o processo dele tramitou em um tempo recorde, revelando perseguição por parte da Justiça. Um recurso da defesa estava previsto para ser levado à 2ª Turma. Mas o ministro Fachin decidiu remeter o pedido ao plenário da Corte. Como o Ministério Público tem 15 dias para se manifestar, o caso do petista só deve ir ao plenário em agosto.

A decisão pró-Dirceu indica que se Lula fosse julgado pelos mesmos ministros, como estava previsto, as chances de ser liberado para aguardar o andamento do processo fora da cela onde está, na Superintendência da PF, em Curitiba seriam altas. Atualmente o STF está dividido em relação ao cumprimento da pena.
A maioria dos ministros da 1ª Turma opta por manter a prisão dos condenados. É lá que está a ministra Cármen Lúcia, presidente da Corte. A 2ª Turma já desmembrou a delação da Odebrecht e tem preocupado a força-tarefa da Lava-Jato.

Outros condenados em segunda instância também podem fazer alegações parecidas para pleitear a liberdade. Esse é o caso do ex-senador Gim Argello, que está preso por ter sido condenado a 11 anos de prisão pelo TRF-4. Ou do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, que já foi condenado a mais de 100 anos de cadeia.

Condenados


Confira condenados que podem pleitear o mesmo recurso de Dirceu e pedir a liberdade até a última apelação ao STF:

» Gim Argello, ex-senador
Condenado pelo TRF-4 e atualmente preso, a defesa poderia pedir autorização para que ele responda em liberdade

» Eduardo Cunha, ex-deputado
Condenado no TRF-4, ainda pode apresentar recursos. Poderia pedir a liberdade até o fim do processo

» Sérgio Cabral, ex-governador do Rio
Cabral foi condenado a 14 anos e dois meses de prisão pelo TRF-4. Ele é réu em 23 ações e a pena dele já passa de 100 anos

Sem perspectiva


Condenado pelo TRF-3 por peculato, estelionato, corrupção passiva, formação de quadrilha e uso de documento falso, Luiz Estevão recorre da sentença. Mas o caso já transitou em julgado até mesmo no STJ e STF. Mesmo que tente o mesmo recurso, ele não seria beneficiado. Atualmente a defesa tenta obter a redução de pena do ex-parlamentar.
Trinta e sete recursos foram apresentados ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), todos negados até o momento..