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Estado de Minas

Especialistas levantam dúvidas sobre a capacidade da Justiça em fiscalizar doações de campanha

Esta será a primeira eleição geral em que o novo método será implantado


postado em 24/06/2018 08:00 / atualizado em 24/06/2018 08:28

(foto: Breno Fortes/CB/D.A. Press)
(foto: Breno Fortes/CB/D.A. Press)
Três anos após a proibição da doação de empresas a campanhas eleitorais, o cenário não é otimista. Esta será a primeira eleição geral em que o novo método será implantado, mas especialistas ouvidos pela reportagem avaliam os riscos da decisão. O que surgiu como uma vontade popular de garantir que as empresas não influenciem nas eleições se tornou um mecanismo que dificulta a transparência.


Além da possibilidade de aumentar o número de “laranjas” com a proibição, a tendência, segundo especialistas, é que a sociedade também enfrente obstáculos para descobrir os verdadeiros financiadores de partidos. Isso porque, apesar da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2015, de proibir a doação de empresas, isso não necessariamente impedirá que as instituições prestem este tipo de serviço e burlem o sistema, explica o advogado criminalista Daniel Gerber. “(A lei) reflete uma ignorância quanto ao próprio conceito de empresa, que nada mais é do que uma extensão de pessoas voltadas a determinado fim. Assim como nos infantiliza a ponto de imaginar que uma lei qualquer que proíbe a doação fará com que todos corram de uma maneira adequada”, argumenta. “A partir de agora, os interesses das empresas somente se tornarão públicos se exercidos de forma ilícita. Eles fecharam a porta para o exercício legítimo de suas representações perante o Estado”, completa.


Considerando a possibilidade de que alguma empresa cometa irregularidade, há um problema central a ser enfrentado: a transparência. Antes da decisão da corte, qualquer pessoa poderia acessar a página do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), digitar o nome do candidato e saber quais instituições doaram recursos para aquele político, e qual o valor.  Era também possível descobrir, por exemplo, qual o total de investimento que uma determinada entidade realizava para candidatos ou partidos. O interesse dessa fiscalização é justamente saber se uma empresa fazia lobby para um político em troca de pautas que a favoreceriam dentro do Congresso. Mas o mesmo já não pode ser feito este ano, já que se parte do pressuposto de que as instituições não farão a doação.


O assunto voltou à tona após o início da arrecadação virtual, os chamados crowdfunding, e após a distribuição de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), aprovado pelo TSE em 18 de junho. Os dois métodos vieram como alternativa para que um político consiga mais recursos para financiar a campanha eleitoral e, com isso, não depender da doação das empresas.


No sistema de financiamento coletivo, todos os sites, segundo a corte eleitoral, devem identificar as pessoas que fizeram a doação. Portanto, os dados como Cadastro de Pessoa Física (CPF) e o valor depositado são informados. O problema é que em alguns casos, políticos contam com mais de 1,8 mil doadores diferentes, e como não será possível a doação pelo Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), será mais difícil descobrir se há alguma ligação entre uma pessoa, com CPF, e uma empresa. “Isso não diminui a transparência, isso impede completamente a transparência”, comenta Gerber. Com isso, para o criminalista, será possível que empresas usem o nome de pessoas “laranjas” para fazer doações, sem serem descobertas.


Para tentar coibir qualquer tipo de irregularidade, o TSE garantiu que cruzará os dados dos doadores com outros órgãos, como a Receita Federal. Mas, essa fiscalização ficará por conta dos órgãos federais, e dificultará a vigilância pela sociedade civil. Para Gerber, as ações de controle do órgão são um “desperdício de energia pública”, já que ainda não se sabe qual será o custo dessa operação. “E também não existe fiscalização perfeita. O furo sempre pode ocorrer”, avalia. “A contribuição privada, seja ela de onde for, empresa ou pessoa física, é bem-vinda quando declarada. Porque isso escancara, dá publicidade a um grupo de pressão social, que investe em determinado partido para ver seus interesses aceitos”, afirma Gerber.


Já o sócio coordenador do Departamento de Direito Eleitoral e Político do Braga Nascimento e Zilio Advogados, Tony Chalita, lembra as eleições de 2016, na qual a regra para proibir este tipo de financiamento já funcionava. “Houve uma quantidade absurda de CPFs laranjas, de pessoas já mortas, de pessoas que recebiam verbas de programas sociais, Bsolsa Família, ProUni, outros programas sociais. Ou seja, de alguma forma conseguiu-se caracterizar uma transferência involuntária”, afirmou.

 

 

VAQUINHA VIRTUAL

 

Brasília – Com a proibição, a ideia é que os políticos se organizem e consigam gastar menos recursos durante o período eleitoral. Até porque, justamente para coibir as fraudes e os “laranjas”, limitou-se o valor doado por pessoas físicas. No caso da “vaquinha virtual”, o limite máximo é de 10% do valor da renda declarada para a Receita Federal no ano anterior às eleições. Já no caso do FEFC, cada partido receberá um auxílio, no qual deverá gastar com as campanhas de candidatos. O valor para cada legenda depende de uma série de fatores. A sigla com maior parte do montante será o MDB, com R$ 234,2 milhões.


“Em 2014, Dilma gastou bilhões na campanha, e Aécio quase R$ 250 milhões. Hoje, a regra é que o teto de gastos para a campanha do presidente é de R$ 70 milhões. Ou seja, tem-se três vezes menos que o segundo candidato que mais gastou em 2014”, explica Chalita. O problema, no entanto, é que os custos da campanha não diminuíram. “A redução do tempo de campanha pela metade não reduz pela metade os custos. As empresas que fazem a campanha não vão trabalhar menos, eles terão trabalho redobrado, a campanha acontece a todo o vapor”, explica Chalita. É esse desequilíbrio financeiro que justificaria, segundo o especialista, a análise que afirma que haverá fraudes entre empresas e candidatos.


Ainda de acordo com Chalita, a tendência é que o STF reveja a proibição ao verificar os resultados das eleições deste ano. “Não tenho dúvida de que em algum momento se vá perceber a mesma situação em 2016, inclusive, fala-se que o que tivemos de caixa dois foi muito maior do que em 2014, em 2010, justamente porque eles não poderiam mais ter a participação das empresas, mas os custos de campanha continuaram. Então, esse ponto continua muito crítico”, completa.

 

 

 


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