São Paulo, 16 - O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proibiu magistrados de fazer ataques pessoais a candidatos, lideranças políticas ou partidos com a finalidade de descredenciá-los perante a opinião pública, em razão de ideias ou ideologias de que discorde nas redes sociais. A decisão assinada pelo corregedor do CNJ e ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio Noronha, provocou reação de entidades da magistratura.
Quatro delas condenaram o provimento do corregedor - a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a Associação dos Juízes para Democracia (AJD) e a União Nacional dos Juízes Federais (Unajuf) - e uma informou que vai pedir esclarecimentos: Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Além de apontar censura aos magistrados, as associações consideram que o texto do CNJ pode permitir perseguições políticas a juízes.
A liberdade de expressão dos juízes e juízas deve ser garantida para que o sistema jurídico funcione de modo adequado no Estado democrático, disse a juíza Laura Rodrigues Benda, da AJD. Para a ela, a resolução pode servir de instrumento de controle ideológico de magistrados. Posição semelhante é do juiz federal Eduardo Cubas, da Unajuf. Não tenho a menor dúvida de que o provimento constitui uma censura aos magistrados.
A decisão do CNJ acontece depois de o órgão receber representações contra magistrados sobre manifestações em redes sociais. Esse foi o caso que envolveu a desembargadora Marília Castro Neves. Em março, após o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL), no Rio, ela postou no Facebook notícia falsa que vinculava a vítima ao crime organizado.
Isso vem crescendo muito na magistratura. Esse tipo de comportamento está começando a se exagerar. Você não deve confiar num juiz que está escrevendo bobagem em rede social. Juiz tem de ter credibilidade, disse o ministro Noronha.
Para o futuro corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, do STJ, a norma reproduz o que a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) já dispõe. Não há inovação na ordem jurídica. O conselheiro Henrique Ávila, do CNJ, concorda e acredita que o texto só detalha e reproduz, na linguagem e no estágio tecnológico atuais, o que já está previsto na Constituição e na Loman. Não haverá qualquer dificuldade de aplicação, pois a esmagadora maioria dos magistrados observa seus deveres sem necessidade de lembretes, mas o provimento foi necessário porque aqui e ali se tem visto abusos em manifestações públicas e até políticas de magistrados.
Para dois conselheiros do CNJ ouvidos reservadamente, o provimento dá um rumo à falta de regulamentação do tema. O magistrado não é um cidadão igual ao outros, disse um conselheiro.
O assunto dividiu, no entanto, ministros de tribunais superiores. Para um deles, o provimento chega tarde e juiz não é analista político nem comentarista esportivo, tampouco pode ser visto como porta-voz de grupos ideológicos. Um segundo ministro achou desnecessário o provimento, completamente fora de hora e considerou ruim a edição do texto de forma monocrática. Um terceiro considerou adequada a medida. Para o presidente da seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Marcos da Costa, todos devem cumprir a lei, inclusive os ministros do STF.
São Paulo. Parte dos desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) defendeu a medida. Não se pode tirar foto com político depois de ele ter sua prisão decretada, como uma colega fez, afirmou o desembargador Damião Cogan, que apoia o provimento do CNJ. Ele se refere à desembargador Kenarik Boujikian, que se manifestou no Facebook a favor da concessão do habeas corpus no STF ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado e preso pela Lava Jato.
A desembargadora Ivana Davi disse que as redes sociais trazem uma realidade nova, mas os magistrados devem a cumprir a lei.
O Estado procurou Thomé, Sartori e Kenarik. Só Amaro respondeu, afirmando apoiar o provimento do CNJ. Também procurou Marília, mas não a achou. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.
(Marcelo Godoy, Teo Cury, Rafael Moraes Moura, Amanda Pupo, Augusto Decker e Thaís matos).