Novo Hamburgo (RS), 13 - Quando o senador Álvaro Dias (PR) filiou-se ao Podemos em julho do ano passado para disputar a Presidência da República, seus conselheiros mais próximos lhe deram uma recomendação: ignorar a região Nordeste e concentrar toda a sua agenda de pré-campanha no Sul.
A sugestão tem uma explicação numérica. Na mais recente pesquisa Datafolha divulgada em abril, o senador chega a 11% das intenções de voto na região Sul, quase o dobro de seu ex-companheiro de partido, o ex-governador Geraldo Alckmin (6%).
"A estratégia deles era pescar onde tem mais peixe. Mas não segui os conselhos. Vou onde sou convidado", disse ele ao Estado. No plano nacional, o mesmo levantamento coloca o senador com 4% das intenções de voto em seu melhor cenário, marca suficiente para ser cortejado por adversários que antes davam os ombros para a sua pretensão eleitoral. "A princípio eu era ignorado como candidato. Hoje não mais", disse Dias durante tour pelo Vale dos Sinos e Serra Gaúcha.
Na quarta-feira passada, ao chegar em Novo Hamburgo, Dias foi saudado pelo presidente da Associação Comercial e Empresarial da cidade, Marcelo Lauxen, como "o candidato que pode unir o centro". O senador o respondeu dizendo que existem duas opções na mesa: "Eu sou a ruptura".
Em sua fala, Dias criticou as "ditaduras boquirrotas" da América Latina, prometeu privatizar estatais e ironizou a febre dos candidatos "outsiders". "O povo brasileiro desmentiu a teoria que o eleitor quer um outsider. O Brasil não é brinquedo para ser entregue a uma aventura."
Experiência na política não lhe falta. Ex-governador do Paraná e no quarto mandado como senador, Dias, aos 73 anos, virou uma das alternativas a candidaturas ligadas ao PSDB e MDB. Semana passada, ele foi procurado por outro presidenciável: o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) ofereceu um almoço a ele na residência oficial, em Brasília.
Durante a refeição, discutiram a possibilidade de uma aliança para se contrapor a uma eventual frente formada por tucanos e emedebistas. A tese também pautou uma conversa reservada de Dias com Flávio Rocha, do PRB, após um evento do setor de supermercados em São Paulo.
Presidente nacional do Podemos, a deputada federal Renata Abreu considera "impossível" Dias ser vice de Alckmin. "Mas podemos fazer uma coalizão de centro com o DEM e PRB. O candidato pode ser aquele que tiver melhor nas pesquisas, em nome de um projeto maior de combater os extremos. A ideia é construir uma segunda chapa de centro, mais limpa e programática". "A Renata Abreu faz as conversas.
Ex-tucano
A relação do senador com os tucanos foi turbulenta e deixou lembranças ruins. Dias conta que em 2001, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foi alvo de um processo de expulsão da sigla movido pelo então presidente do PSDB, José Aníbal. "O Álvaro e o irmão dele, Osmar, assinaram um pedido de CPI pedindo o impeachment de FHC. Como presidente nacional do PSDB, os procurei e disse que essa era uma iniciativa do PT. Era inaceitável que parlamentares do PSDB assinassem apoiamento à sua realização", afirmou Aníbal.
O senador paranaense foi então para o PDT, mas voltou a ser tucano em 2002, após a vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - preso e condenado na Operação Lava Jato. Em 2010, teve outro revés. Chegou a ser anunciado como candidato a vice do senador José Serra. Foi a eventos com ele nessa condição, nos quais foi anunciado no microfone como "futuro vice-presidente". Na véspera da convenção partidária, porém, soube pela imprensa que o deputado Índio da Costa (DEM-RJ) fora escolhido após uma reunião de caciques durante a madrugada.
Quatro anos depois, em 2014, viu novamente seu nome ser colocado no centro da articulação. Ele foi procurado em seu gabinete por deputados e senadores do DEM que teriam feito um convite para que ele entrasse no partido e disputasse a Presidência.
A articulação contou com o aval de Maia, mas teria sido abortada pelo senador José Agripino (RN), que tinha pretensão de ser o vice de Aécio Neves na disputa.
Solitário
Na quarta-feira passada, Dias estava sozinho no saguão de um hotel de Porto Alegre quando recebeu o Estado para acompanhá-lo pelo Sul. Chegou na noite anterior em um voo de carreira vindo do Rio de Janeiro. O senador respirou aliviado quando soube que, dessa vez, a secretaria do Podemos escolheu um hotel confortável. "Da última vez que estive aqui me colocaram em um hotel que não tinha cortina 'blackout'. A porta do frigobar não fechava. Reclamei!".
A última parada na viagem pelo Sul foi em Gramado, onde participou na quinta-feira do debate que reuniu pela primeira vez no mesmo palco, além dele, quatro pré-candidatos: Manuela Dávila (PCdoB), Henrique Meirelles (MDB), Ciro Gomes (PDT) e Guilherme Boulos (PSOL). Sentiu-se à vontade ao fazer coro as críticas ao governo Temer ao lado de Ciro, Boulos e Manuela.
O Estado de S. Paulo.
(Pedro Venceslau, especial para O Estado).