São Paulo, 31 - O personagem chega apressado para a entrevista numa sala simples e quente no centro de São Paulo. Não há seguranças, seguidores ou qualquer tipo de assédio. Quem o acompanha é seu filho, que às vezes também é assessor. O glamour é exíguo, quase inexistente - assim como o são o dinheiro e o tempo de TV no horário eleitoral gratuito. Trata-se de João Vicente Goulart (PPL), filho do ex-presidente João Goulart, que agora tenta repetir os passos do pai e chegar à Presidência.
As condições simbolizam a campanha dos candidatos 'nanicos', que sequer aparecem nas pesquisas de intenção de voto. "O trabalho é de formiguinha", resume a jornalista Valéria Monteiro, que se fez presidenciável pelo PMN e agora tem a candidatura colocada em xeque pelo próprio partido - em pesquisas internas, viram que ela não chegaria a 3%.
Além desses, há também a sapateira Vera Lúcia, do PSTU, no time de postulantes inéditos e invisíveis. Aos 50 anos, a sergipana que começou a militar no movimento sindical quebra a hegemonia do dirigente Zé Maria como nome da sigla à Presidência. Ele, que postulou ao cargo quatro vezes, obteve 0,09% dos votos em 2014.
Dos três, o único que já conseguiu se eleger é João Vicente, que foi deputado estadual no Rio Grande do Sul pelo PDT, nos anos 1980.
Em comum, todos têm a visão de que o Brasil segue caminhos equivocados e precisa mudar. No campo das ideias, também, há divergências. O caso do PSTU é o mais destoante. O partido, que se classifica como de esquerda revolucionária, defende, por exemplo, o armamento da população - mesma bandeira do deputado federal Jair Bolsonaro (PSL). "Hoje em dia, a questão da segurança passa pela autodefesa dos trabalhadores contra a violência do Estado", explica Vera, pontuando a diferença em relação à direita.
A ideia do PSTU, cujo tempo de TV no horário eleitoral gratuito é de seis segundos, é chegar ao Planalto para dar poder a conselhos populares, que seriam os responsáveis por definir os rumos do País - mesmo que passem por cima do Congresso. "Se você quer saber se a revolução socialista vai se dar pacificamente, não vai", diz.
Já a proposta de João Vicente passa por um grande diálogo nacional.
O filho de Jango foi um dos fundadores do PDT ao lado de Leonel Brizola e outros quadros históricos do trabalhismo. Saiu do partido ano passado por causa de divergências que envolviam a memória de seu pai. Viu no PPL uma forma de continuar a luta pelo ideário trabalhista. O partido, assim como os de Vera e Valéria, não tem representantes no Congresso.
Sobre o candidato do PDT, Ciro Gomes, João Vicente é sucinto: falta encampar de fato o legado do trabalhismo, dando nome aos bois. "Tem falado pouco sobre Jango e Brizola. Sobre Getúlio, menos ainda. Cada um tem o direito de colocar sua egolatria na gravata que lhe cabe."
Com um discurso mais progressista, a pré-candidata do PMN, Valéria Monteiro, prefere não se classificar como de esquerda.
Apresentadora do Jornal Nacional, da Rede Globo, nos anos 1990, Valéria estava inquieta observando a crise de representação que toma conta do País. Aos 53 anos, achou que poderia se alçar à política e escolheu o PMN. Hoje ela acusa a legenda de usar uma pesquisa que não lhe foi apresentada para evitar sua candidatura. A jornalista diz que vai até o final como postulante à vaga - a convenção da sigla é em julho.
Campanha
Driblar a falta de recursos é tarefa árdua para os candidatos desconhecidos e a internet é peça-chave - mas, num país em que, segundo o IBGE, o acesso à rede chega a apenas 63% dos domicílios, viajar é indispensável. Valéria, por exemplo, já visitou cidades em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais na sua Caravana da Coragem. Os deslocamentos são feitos com carro próprio, um Kia Cerato 2011, com o assessor ao volante.
João Vicente também percorre Estados e participa de eventos do partido para traçar estratégias de campanha. A disputa com partidos tradicionais chama de "Davi contra Golias", mas não desanima.
Vera Lúcia já admite que, por falta de dinheiro, não conseguirá chegar a todos os cantos do País. A sapateira compara o desafio de fazer campanha sem grandes recursos com a situação de quem é pobre em terras tupiniquins. "É preciso muita criatividade para sobreviver num país como esse e se manter vivo como desempregado. Outro desafio é conseguir sobreviver e trabalhar com um salário mínimo. E outro é fazer campanha como faz o PSTU." As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.
(Caio Sartori).