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Estado de Minas

Especialistas debatem: o Brasil pode eleger um Trump em 2018?

Cenário indefinido gera especulação sobre candidatura semelhante à do presidente dos EUA no Brasil


postado em 05/03/2018 06:00 / atualizado em 05/03/2018 15:11

(foto: Arte/Quinho)
(foto: Arte/Quinho)

Tão logo Donald Trump se elegeu presidente dos Estados Unidos, há um ano, começaram especulações sobre um possível “efeito Trump” capaz de influenciar as eleições ao redor do planeta e favorecer candidatos do mesmo perfil. Com a chegada de 2018, ano eleitoral no Brasil, e cenário político ainda nebuloso, crescem rumores sobre a ascensão de nome à imagem e semelhança do bilionário republicano para ocupar o Palácio do Planalto, como parte da onda conservadora que atinge o mundo. O país pode mesmo ter um “Trump brasileiro” vestindo a faixa presidencial verde-amarela?

A lista de candidatos nesse contorno já passou pelo empresário e prefeito de São Paulo Joao Doria (PSDB), pelo apresentador de TV Luciano Huck, que se retirou da disputa, até o sempre cotado deputado federal Jair Bolsonaro (PSC), único com a pré-candidatura lançada. Mas, na avaliação de especialistas americanos e brasileiros ouvidos pelo Estado de Minas, o contexto político-econômico dos EUA e do Brasil são muito distintos para uma análise simplista de que Trump, em sua versão canarinho, vem por aí.

Sem pudor nas palavras, em novembro de 2016, o norte-americano desbancou políticos profissionais com um currículo de celebridade, elegendo-se presidente da maior potência mundial. Nascido rico, o republicano, dono de fortuna superior a US$ 3 bilhões, multiplicou herança como incorporador de imóveis. A fama chegou mesmo depois de apresentar o reality show “O Aprendiz”, em que selecionava um executivo para trabalhar em suas organizações. O magnata acabou convencendo fora do meio político ao se apresentar como empresário de sucesso e defensor de posições conservadoras, a favor do armamento, homofóbico e nacionalista.

Fato é que, a cada momento, Trump é relacionado a um possível candidato brasileiro. A associação mais comum é com Jair Bolsonaro, ex-militar de ideias conservadoras e discurso duro contra a corrupção. Cotado a vice na chapa do tucano Geraldo Alckmin (PSDB), o prefeito de São Paulo Joao Doria também já foi comparado ao presidente norte-americano. Também empresário, Doria apresentou a edição brasileira de “O Aprendiz” e elegeu-se prefeito a partir da promessa de levar a eficiência na gestão da iniciativa privada para o poder público.

O apresentador de TV Luciano Huck, que já afastou a chance de se candidatar, foi um dos nomes fortes apontados para ocupar a presidência. Assim como Trump, Huck é um “outsider”, figura fora do jogo político, e estava sendo tratado como nome forte para disputar o cargo. Na pegada do empresário bem-sucedido, quem vem ensaiando se lançar candidato é Flávio Rocha, dono da rede de lojas Riachuelo, um dos maiores grupos do país. Rocha, que já foi deputado federal nos anos 1980, está à frente do movimento Brasil 200, criado para “pautar agenda política liberal no campo econômico e conservadora no que diz respeito a costumes”.

INDEFINIÇÃO Para a cientista política do Centro de Estudos Legislativos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Aline Burni, pesquisadora visitante da New York University, apesar das especulações, é cedo para previsões sobre um futuro Trump brasileiro. “As eleições são um jogo em duas etapas: primeiro, a coordenação e a articulação de elites políticas e, depois, a escolha do eleitorado. Por enquanto, esse cenário não está definido. Qualquer coisa pode acontecer. Tem que esperar o momento de decisão das candidaturas para ter noção mais realista”, afirma.

O prazo para filiação partidária se encerra apenas em 7 de abril, quando o quadro eleitoral de outubro deve ficar mais claro. Para além disso, a pesquisadora destaca que o contexto de Estados Unidos e Brasil são diferentes, o que exige cuidado na análise. “Falar em um efeito Trump é muito simplista. Os dois países têm sistemas políticos muito diferentes. O Brasil é uma democracia jovem com partidos não tão consolidados quanto na Europa e nos EUA”, diz. Ao contrário daqui, nos Estados Unidos, o voto não é obrigatório e o sistema eleitoral é indireto.

Ou seja, apesar de o republicano ter vencido, foi a democrata Hillary Clinton quem recebeu a maioria dos votos populares – 65,8 milhões, contra 62,9 milhões do republicano. O resultado, entretanto, foi decidido por quem teve a maioria dos votos do Colégio Eleitoral. Com isso, Trump conseguiu 306 votos contra 232 de Hillary. E ganhou. Os 538 representantes se pautam normalmente pelos votos dos eleitores no seu estado e o candidato vencedor no estado leva todos os votos dos representantes.

Se o sistema eleitoral afasta as duas nações, a descrença em relação a partidos políticos os aproxima. “Há uma frustração em relação aos partidos políticos. Eles representam realmente o que está nos bolsos deles”, diz a estudante de ciências sociais Zoe Doria, de 20 anos. Ela mora em Cincinnati, estado de Ohio, um dos que ajudou a eleger Trump e sempre comparece nos protestos contra o republicano, cujos eleitores se concentram fora dos centros urbanos, cooptados por um discurso nacionalista e xenófobo de Trump.

CONSERVADOR “Essa onda conservadora, nos Estados Unidos, tem a ver com muitos eleitores que perderam emprego e ficaram descontentes. No Brasil, a revolta está mais relacionada à corrupção. Agora, nos EUA, houve também outros aspectos que elegeram o Trump, como a manipulação eleitoral russa e o problema do machismo em relação à Hillary”, afirma o norte-americano David Fleischer, professor emérito de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB). Ele escreve semanalmente sobre política brasileira para o boletim americano Brazil Focus, do Brazil Iniciative, grupo da George Washington University.

Embora o Brasil também sustente alta taxa de desemprego – 12,2%, com 12,7 milhões de desempregados –, para Fleischer, a similaridade mais marcante entre os dois países seria a busca dos eleitores por um “outsider”, mas ainda longe de ser desenhada diante das indefinições de candidaturas. “Está difícil. Não sabemos se vamos ter Lula ou não disputando as eleições. A candidatura de Bolsonaro é puramente anti-Lula, e, se Lula desaparecer, o balão de Bolsonaro vai esvaziar. Não sabemos exatamente o que vai acontecer”, diz.

A diretora-assistente do Centro Latino-Americano Adrienne Arsht, ligado à organização de liderança e relações internacionais Atlantic Council, sediada em Washington, Roberta Braga, consegue enxergar tendências semelhantes entre os dois países. “A primeira é a crise de confiança. Os EUA viram ameaça do uso de armas nucleares, perda da força de setores industriais, as notícias falsas. No Brasil, a crise vem mais por causa da corrupção, o que leva os eleitores a procurarem por um outsider”, diz.

Roberta observa que 2018 será um ano crucial para a América Latina, com eleições em diversos países. “Vários países, entre eles Colômbia, Venezuela, México, Brasil, terão eleições em 2018 e depois desse resultado poderemos ver se o mundo está mudando”, comenta. Na aposta da pesquisadora Aline Burni, o Brasil caminha para um governo mais conservador. “É uma demanda que está crescendo e candidatos vão conseguir responder à ela. Existe uma reação a políticas inclusivas dos governos passados. Setores mais privilegiados se sentem ameaçados a perder direitos e espaço”, diz.

 


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