Brasília, 24 - "O Brasil nunca mais será o mesmo, diz autor de livro sobre a Lava Jato. Vou meter bala, avisou o vice-almirante Othon Pinheiro da Silva, apavorado, para os policiais que ameaçavam arrombar a porta do quarto em que se trancara. "Isso pode ser feito com um senador no exercício do mandato?, perguntou um estupefato Delcídio Amaral aos policiais federais que foram prendê-lo na porta do quarto do hotel em que se hospedava. (O celular) está lá em cima, eu posso ir lá pegar e o senhor espera aqui, disse o empresário Marcelo Odebrecht para um dos agentes que foram prendê-lo em sua casa.
Momentos tensos abundam, bem contados, no livro-reportagem Lava Jato - O juiz Sérgio Moro e os bastidores da operação que abalou o Brasil (Ed. Sextante), há 11 semanas em primeiro lugar em listas dos mais vendidos do gênero não ficção. Eu não esperava tanto, diz o jornalista Vladimir Netto, comemorando três edições, lançamentos concorridos aqui e acolá e estimados 90 mil exemplares vendidos até aqui. Só confirma que as pessoas querem se informar melhor sobre a operação mais importante da história recente do País, complementou, na manhã da sexta-feira passada, às voltas com os maus humores do gato Mussum, já velhinho, numa clínica veterinária de Brasília, onde mora, com a mulher e as filhas Manuela, de 5 anos, e Isabel, de 3 anos.
Netto, de 43 anos, é repórter do Jornal Nacional, da TV Globo, onde trabalha desde 2001, e vice-presidente da Associação Brasileiro de Jornalismo Investigativo (Abraji). Mineiro, de Caratinga, carrega uma história dos anos de chumbo - a prisão de seus pais, os jornalistas Marcello Netto e Míriam Leitão, em 1972, vítimas de tortura.
Jornalista desde 1994, primeiro da imprensa escrita (O Dia, Jornal do Brasil e Veja), cobriu a maioria dos últimos escândalos com denúncias de corrupção - entre eles a Lava Jato, da qual é um declarado entusiasta, com destaque para o juiz Sérgio Moro. A operação começou a virar livro em 1.º de janeiro de 2015 - depois de voltar da cobertura da posse da presidente eleita, Dilma Rousseff, como escreveu no capítulo dos agradecimentos, Os bastidores dos bastidores. Dezessete meses depois - maio deste ano - quase 400 páginas chegaram às livrarias.
Quis organizar as informações sobre uma operação complexa e cheia de variantes, que foi e está indo mais longe do que todas as outras, e fazer uma narrativa agradável, que convide à leitura, disse Netto. Em 12 capítulos, com muitos intertítulos que facilitam o entendimento, o livro começa com a prisão do doleiro Alberto Youssef, em 17 de março de 2014, no capítulo A casa começa a cair. Youssef disse a Netto, sobre aqueles dias: Eu sou homem de ter coragem de mamar em uma onça, mas o único homem de quem eu tenho medo nesta Terra se chama Sérgio Moro.
Para dizer algo a mais sobre os citados momentos de tensão: o vice-almirante Othon Pinheiro da Silva não meteu bala em ninguém, mas pulou em cima de um dos agentes da Polícia Federal ao finalmente abrir a porta do quarto. Houve uma breve luta e os policiais tiveram de imobilizá-lo e algemá-lo; o senador Delcídio teve a resposta positiva - sim, pode -, com a exibição do mandado de prisão; Marcelo Odebrecht não conseguiu livrar-se do agente quando quis ir sozinho buscar o celular. Eu vou junto, disse o PF, e assim o apreendeu.
Continuação. Netto já está trabalhando no Lava Jato, parte 2, que espera lançar pelo final de 2017. O Brasil nunca mais vai ser igual, disse. Quanto mais conhecermos essa operação, mais lições podemos tirar..