História indica que Assembleia sempre foi marcada por submissão ao governo do estado

História mostra que Executivo tem forte influência sobre Legislativo. É do governo grande número de leis aprovadas

Flávia Ayer
"O Legislativo aceitou a condição de subserviência. Eles (os deputados legislam muito e fiscalizam pouco. Para a democracia e para a cidadania, não é saudável" Antônio Calhau, consultor da ALMG - Foto: Lia Priscila/ALMG

A chegada do PT ao Poder Executivo, depois de 12 anos de governo tucano no estado, tem promovido uma dança das cadeiras na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Com a posse dos 77 deputados, a composição da base do governador Fernando Pimentel (PT) e da oposição segue indefinida. Enquanto isso, ganha força um terceiro bloco, dito independente, que flutua entre um lado e outro. A maior parte dessa turma é de deputados aliados do PSDB no governo anterior e de novos partidos que chegam à Casa. Mas, se depender da história, a base de Pimentel deve sair ganhando. Tradicionalmente, o Executivo sempre exerceu forte influência sobre o Legislativo, numa relação, segundo especialistas, danosa à democracia.


Embora os dois poderes sejam tratados como independentes, os números confirmam a força do Executivo sobre a Assembleia. Desde que a Constituição de 1989 deu aos legisladores mineiros a possibilidade de sustar decretos, regulamentos, resoluções e outros atos normativos que contrariem as leis aprovadas pela Casa Legislativa, esse instrumento só foi usado três vezes. “O Legislativo aceitou a condição de subserviência.

Eles (os deputados) legislam muito e fiscalizam pouco. Para a democracia e para a cidadania, não é saudável. O Legislativo não só deve produzir boas leis, mas fiscalizar, sem ser submisso”, afirma o consultor da ALMG Antônio Calhau, mestre em direito administrativo pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e autor de estudo sobre a sustação de atos normativos.

Para Calhau, a instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) – investigação conduzida pelo Legislativo para apurar denúncias contra interesses coletivos e a máquina pública – são outro indicativo dessa relação de submissão. De acordo com dados da Gerência de Documentação e Informação da ALMG, nos últimos oito anos, houve apenas a CPI da Telefonia, criada em 2013 para apurar a responsabilidade das operadoras pela prestação inadequada de serviços. “O requerimento para uma CPI tem que ser assinado por 26 deputados. Já tivemos CPI’s que não foram criadas por interferência direta do governador do estado, porque acaba respingando no Executivo”, reforça Calhau.

Também chama atenção o fato de o Executivo ser um dos maiores autores de leis no estado, embora legislar seja uma das principais competências dos deputados. Para se ter uma ideia, quase um terço das matérias, desde Projetos de Lei a Propostas de Emenda à Constituição (PEC), aprovadas no plenário da Assembleia no ano passado tinham autoria do governador. De um total de 147 textos, 48 eram assinados pelo Executivo. E a maior parte do conteúdo assinado pelos parlamentares se refere a declaração de utilidade pública e a autorização para doação de terrenos. “O chefe do Executivo é uma personalidade muito forte e muitas matérias são de iniciativa do governo, como a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a criação de secretarias e autarquias, o estatuto de servidores”, diz.

Cargos e verbas Pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG, o cientista político Lucas Cunha ressalta que a lógica de composição das bancadas do Legislativo sempre teve bastante influência do governo. “O governador tem muitos recursos de poder, verbas e cargos, para distribuir aos deputados estaduais. Se o parlamentar ficar na oposição, ele não vai participar desses recursos e políticas”, afirma. “O deputado controla pouco recurso e precisa da visibilidade dos eleitores.
Se você é deputado de oposição de um partido pequeno pode sumir no sistema político e não conseguir se eleger novamente”, completa.

O pesquisador alerta que, quanto mais transparente e institucionalizada, mais atuante tende a ser a Casa legislativa. “Se a Casa é muito informal, há tendência maior de acordo entre políticos”, reforça Cunha, para quem a democracia pressupõe a independência dos poderes. Ele ressalta que o sistema político do Brasil, país presidencialista com grande fragmentação de partidos, pressupõe a costura de uma base parlamentar para haver condições de governar. “O que percebo na ALMG são lideranças um pouco sem graça que farão parte do governo de Pimentel porque estavam no governo anterior. Por causa disso, se colocam como independentes. Isso pode ser um ganho para o Legislativo nesse primeiro momento”, diz.

 

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