Jornal Estado de Minas

Empreiteira cobra indenização de R$ 20 trilhões na Justiça

Envolvida no escândalo da Petrobras, Construtora Mendes Júnior Engenharia S/A em razão de prejuízos que teria acumulado durante a construção da Usina Hidrelétrica de Itaparica

Maria Clara Prates
A Construtora Mendes Júnior Engenharia S/A, uma das empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobras, está cobrando da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf) uma indenização de R$ 20 trilhões, em razão de prejuízos que teria acumulado durante a construção da Usina Hidrelétrica de Itaparica, na divisa de Pernambuco e Bahia, ainda na década de 1980.
A análise do direito à indenização estratosférica equivalente a quatro vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil está nas mãos do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que adiou julgamento do recurso da empreiteira, em razão de pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves.

A cobrança surreal ocorre justamente quando o Ministério Público e a Polícia Federal apuram um dos maiores escândalos de desvio de dinheiro do país, em volumes ainda indefinidos, já que se estendem a pelo menos 12 anos. Entre os empreiteiros presos na sétima etapa da Operação Lava-Jato, está o vice-presidente da Mendes Júnior, Sérgio Cunha Mendes. Em depoimentos à Justiça, ele confessou ter pago propina ao doleiro Alberto Youssef, considerado o operador do esquema pelos investigadores, e ainda ao ex-diretor de Abastecimento e Refino da Petrobras Paulo Roberto Costa. Para isso, as obras contratadas com a estatal eram superfaturadas. De acordo com o processo, sete empreiteiras formaram um “clube VIP” para direcionamento de licitações públicas, com pagamento de propinas a partidos.

A Mendes Júnior Engenharia informou, por meio de nota, que apenas pleiteia a compensação porque construiu parte da usina com recursos próprios. “O direito ao ressarcimento deste desembolso foi reconhecido pela Justiça em 16/12/1992, em decisão transitada em julgado. A empresa desconhece os valores que vêm sendo publicados na imprensa”, informa a nota.
Segundo a empreiteira, sua única “pretensão é ser indenizada de acordo com decisão judicial e pelo valor a ser apurado pelo Poder Judiciário”. Alega ainda que “espera que a lei seja cumprida, que haja respeito à coisa julgada e que a justiça prevaleça”. E reafirma: “Caso isso não aconteça, a empresa continuará buscando seus direitos”.

DESCONHECIDO
Para se ter ideia do valor cobrado, o total é suficiente para fazer mais de 660 vezes todas as obras do Programas de Aceleração do Crescimento (PAC) Mobilidade nas 23 maiores cidades do país, no qual serão investidos R$ 30 bilhões pelo governo para a expansão e construção de metrôs, BRTs e veículos leves sobre trilhos (VLTs). Mas a maré não parece mesmo estar a favor da empreiteira. Apesar da interrupção do julgamento na quinta-feira, o relator do recurso, ministro Sérgio Kukina, apresentou o seu voto e defendeu que o recurso da empreiteira fosse desconhecido, confirmando a decisão do Tribunal Regional da 5ª Região (TRF-5), que julgou improcedente o pedido da Mendes Júnior, ao considerar que a empreiteira não demonstrou que os valores alegados foram aplicados na construção da usina.

“Não houve apresentação de documentos aptos a comprovar a específica destinação dos recursos captados no mercado financeiro para a construção da usina hidrelétrica de Itaparica. Diante de tais contornos, resulta que, para se desconstituir tal enredo, seria necessário, no ponto, o reexame de matéria fática, o que se revela incabível na estreita via do recurso especial, nos termos da Súmula 7 do STJ”, afirmou o ministro Kukina. Uma afirmação que confirma a sentença do TRF-5 que destacou que a União demonstrou que os atrasos foram quitados ainda na década de 1980, inclusive com a aplicação de juros e multas previstos no contrato. Além do ministro Benedito Gonçalves, ainda faltam votar os ministros Napoleão Maia Filho e Regina Helena Costa, além da desembargadora convocada Marga Tessler.

EMPRÉSTIMO A cobrança teve início com a contratação da Mendes Júnior, em 1981, para a construção da hidrelétrica no Nordeste. A obra foi concluída em 1986 e, durante esse período, a Chesf pagou com atraso algumas faturas. Em razão disso, a empreiteira alegou que foi obrigada a buscar recursos no mercado financeiro para evitar que as obras fossem paralisadas. No entanto, a Advocacia Geral da União (AGU) demonstrou, em documento de mais de 80 páginas, que não tinham comprovação de empréstimos e débitos que atingissem o valor de R$ 1 trilhão. O desembargadores do TRF-5 acataram as alegações da CGU, em sentença em fevereiro, e ainda fizeram questão de destacar que o valor seria suficiente para construir outras 18 hidrelétricas do mesmo porte. No entanto, a Mendes Júnior recorreu ao STJ, que agora analisa a questão.

Saiba mais

Briga nos EUA

Essa não a primeira vez que a Construtora Mendes Júnior cobra indenização sob a alegação de ter sofrido prejuízos no cumprimento de contratos.
Em 1996, a empreiteira ajuizou uma ação na Suprema Corte do Estado de Nova York contra o Banco do Brasil. A empresa solicita indenização de mais de US$ 1 bilhão, alegando ter sofrido prejuízos na construção de uma estrada de ferro no Oriente Médio. O valor estipulado teria como base em despesas da Mendes Júnior no Iraque, avaliados em US$ 800 milhões (dos quais US$ 420 milhões se referem a dívidas do governo iraquiano à construtora assumidas pelo BB) e débitos da empresa com o banco, também da ordem de US$ 420 milhões, relativos a um financiamento do BB (por meio de contrato de arrendamento mercantil) para que a empresa continuasse suas atividades naquele país. A ação foi em Nova York porque o contrato de arrendamento mercantil firmado em 1986 entre a Mendes Júnior e o BB Leasing, com sede naquela cidade, previa que qualquer controvérsia seria resolvida pela Justiça norte-americana.
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