Jornal Estado de Minas

Extravagâncias dão votos durante as campanhas eleitorais

Bordões e propostas esdrúxulas entraram para a história do horário eleitoral gratuito na TV. Diante do atual desalento com a classe política, fórmula pode ganhar força este ano

Bertha Maakaroun - enviada especial
Em poucos minutos, dezenas desfilam pelo palanque eletrônico repetindo chavões e pedindo o voto.
Serão mais de mil filiados a uma das 32 legendas com registro formal na Justiça Eleitoral, concorrendo nas eleições de outubro a uma das 77 cadeiras na Assembleia Legislativa e uma das 53 da bancada federal mineira. Nas grandes e médias siglas, a única regra é que o discurso mais geral dos candidatos a deputado reforce o conceito da campanha ao governo de Minas e ao Palácio do Planalto. Já nos partidos pequenos vale tudo. Os “caciques” dominam o curto tempo e cada um fala o que quer. Dado o surpreendente desempenho nas últimas eleições gerais do palhaço Tiririca, a “fórmula” que reforça um sentimento de desalento com a representação política poderá ressurgir com força.

Há extravagâncias que entram para a história e arrebanham enxurradas de votos. Com a promessa de construir um “aqueduto” para trazer o mar de Angra dos Reis até a Lagoa da Pampulha, Nelson Thibau, do então MDB, chegou à Câmara dos Deputados em 1975. “É só quebrar champanhe quando o mar chegar”, dizia ele, que logrou atrair votos de protesto contra o regime militar.

Naquela campanha, Thibau não se esqueceu das crianças: mirando-se no mundo de Walt Disney, anunciou a Thibaulândia.

Com um só bordão anunciado numa voz áspera, o médico cardiologista Enéas Carneiro, fundador do Partido da Reedificação da Ordem Nacional (Prona) amealhou em 2002 a votação recorde em São Paulo para deputado federal de 1,57 milhão de votos. Tudo em Enéas – que faleceu em 2007 – era muito característico: em contraste com a careca lustrosa, a enorme barba preta. Grandes óculos de míope encobriam o rosto do candidato, que invariavelmente vestia um terno sempre dois números maior do que o seu manequim. Enéas, que na década de 1990 concorreu duas vezes à Presidência da República, pregando o “estado nacional soberano”, a “ruptura com o modelo servil em que o Brasil fica de joelho no cenário internacional”, “contra a dívida galopante” e em crítica às privatizações, naquela campanha limitava-se a repetir, em protesto contra os segundos que dispunha na propaganda eleitoral: “Meu nome é Enéas”. O tom indignado cativou.

Nas eleições de 2010, foi a vez do palhaço Tiririca (PR-SP). Ele conquistou 1,3 milhão de votos desqualificando a política e o Congresso Nacional: “Vote no Tiririca, pior do que tá não fica!”. Tripudiando em cima da representação política, ele disparava: “Para deputado federal, Tiririca. Vote no abestado”. Em seus poucos segundos, havia variações no enredo: “Adivinha quem está falando? Duvido vocês adivinhar! Sou eeeu, o Tiririiiica, candidato a deputado federaaaal, 2222, não esqueeeeeça, peguei vocês, enganei vocês, vocês pensou que fosse outra pessooooa, sou eu, o abestaaaaado, vote 2222!”. O sucesso foi tanto que, até no Sul de Minas, onde em várias cidades fronteiriças era exibida a programação política de São Paulo, o “abestado” ganhou muitos votos. E quem levou a melhor foi o deputado federal Aelton Freitas (PR), que no estado era o dono do número 2222.

Em Minas, nas eleições de 2010, a frase que mais se repetiu na campanha televisiva dos candidatos a deputado estadual e federal foi: “Sou ficha limpa”.

A nova legislação acabara de ser sancionada, mas ainda se discutia no Supremo Tribunal Federal (STF) se seria aplicada ou não naquele pleito. Apesar dos esforços individuais voltados para a telinha de “desconhecidos” que tentavam a sorte e sonhavam em “explodir” nas urnas, nenhum dos candidatos despontou com a força de um Tiririca.

O fato é que diferentemente da propaganda política para as campanhas ao governo, ao Senado e à Presidência da República, exceção aos casos raros, a eficácia do palanque eletrônico para os candidatos a deputado estadual e federal é questionada: “Além de ser baixa a audiência, ao longo de todo o processo da propaganda eleitoral gratuita o candidato entra no máximo umas cinco vezes por alguns segundos”, avalia o deputado federal Marcus Pestana, presidente estadual do PSDB.

PUXADORES DE VOTO Apesar da dúvida quanto à eficácia do programa eleitoral para deputados, é intensa a disputa dentro dos partidos políticos pela visibilidade dos “segundos da fama”. Os candidatos a deputado federal têm 25 minutos às terças, quintas e sábados em cada um dos dois blocos. Os candidatos a deputado estadual têm às segundas, quartas e sextas-feiras, 17 minutos em cada um dos dois blocos. “Em regra, o PT distribui o tempo por igual entre os candidatos a deputado”, afirma o deputado federal Odair Cunha, presidente da legenda em Minas. Eventualmente, entretanto, “puxadores de voto” podem ter um tempo diferenciado, já que os votos que carregam contribuem para conquistar mais cadeiras para o partido. “A direção partidária pode convencer os candidatos a apostarem, no programa, em um candidato forte. A outra opção é dividir igualmente.

Como temos a convicção de que decide pouco, dividimos igualmente”, assinala Marcus Pestana.

Já no PMDB, os deputados estaduais e federais que disputam a reeleição têm mais tempo do horário eleitoral do que aqueles que os debutantes. “Quem é deputado e quem está na executiva do partido tem mais tempo”, afirma Saraiva Felipe, presidente do PMDB em Minas. “Há um conceito geral da campanha majoritária que é sugerido aos candidatos. Quem não quiser pode passar a mensagem que quiser em seu tempo”, afirma Saraiva, que sonha em ter em sua chapa um candidato com a espontaneidade do palhaço: “Nós nunca tivemos o privilégio de ter um Tiririca. Se aparecer, colocamos na hora”.

 

 

 

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