Jornal Estado de Minas

Prefeituras mineiras assumem gastos de R$ 2 bilhões de responsabilidade do estado e União

Estudo feito com base em dados oficiais dos municípios mineiros mostra que eles gastaram em apenas um ano R$ 2 bilhões com serviços

Juliana Cipriani
- Foto: As constantes queixas dos prefeitos mineiros, de que, ao longo dos anos, os municípios foram assumindo funções que não seriam de sua responsabilidade sem a respectiva contrapartida financeira, podem ser traduzidas em uma conta de R$ 2,090 bilhões. Esse é o valor que, segundo estudo da Associação Transparência Municipal, as 853 prefeituras mineiras tiraram de seus orçamentos somente em 2011 para pagar por ações que deveriam, por obrigação constitucional, ser custeadas pelos cofres do estado ou da União. O rombo foi 12,4% maior, em comparação com o de 2010, quando foram necessários R$ 1,829 bilhão para pagar a “conta alheia”.
Os recursos vão para pagamento de transporte escolar e merenda de alunos, manutenção de delegacias no interior, postos de alistamento militar, correios e telégrafos, financiamento complementar de equipes do Programa Saúde da Família e, em muitos casos, cessão de servidores. Áreas que, legalmente, não seriam de competência dos prefeitos.

Os municípios mineiros tiveram em 2011, quando foi apurado o último balanço da Secretaria do Tesouro Nacional usado no estudo, uma receita de R$ 36,056 bilhões, o que corresponde a 9,76% dos orçamentos somados de todos os municípios brasileiros. Enquanto isso, a despesa com serviços de responsabilidade das esferas estadual e federal, de R$ 2,090 bilhões, corresponde a 10,77% do que gastou a soma das prefeituras do país. Em relação à receita orçamentária das cidades mineiras, o valor gasto com funções alheias representa em média 5,8% do total, mas nos municípios menores esse percentual pode chegar a mais de 10%.

Ainda de acordo com o estudo, 79,13% dos municípios mineiros – que são aqueles com até 20 mil habitantes – gastam mais com rubricas que seriam da União ou do estado do que a própria arrecadação tributária. Essa é a realidade de 675 cidades, que tiveram receita própria em média de R$ 2,234 milhões e somaram gastos médios de R$ 4,628 milhões com serviços que não eram de sua competência. Segundo o responsável pelo estudo, François Bremaeker, os dados de 2112 só estarão disponíveis no segundo semestre, mas foi observada uma tendência de crescimento das despesas em comparação com o ano anterior. “O que mais tem aumentado de gastos ultimamente é a guarda municipal, que acaba fazendo o serviço de segurança das ruas, que seria dos policiais militares (do estado)”, afirmou.

De acordo com Bremaeker, a Lei de Responsabilidade Fiscal permite que os municípios façam esses gastos complementares, desde que eles estejam previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias, mas isso acaba ocorrendo mesmo sem essa previsão. O levantamento, segundo o pesquisador, foi feito com base nos gastos por área declarados. De acordo com Bremaeker, o maior peso é com serviços que seriam da esfera estadual.

Convênios
O presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Ângelo Roncalli, confirma que essa é uma dificuldade nas finanças municipais e lembra que orientou os novos prefeitos a não assumirem convênios sem que a União ou o estado repassem os recursos para custear as ações. “É uma realidade perversa que os municípios têm enfrentado nos últimos anos. Essa observação de que a maioria gasta mais com obrigações que não são dela do que arrecadam em receitas tributárias é um dado chocante”, afirmou. O dirigente conta que a situação já foi encaminhada ao governo do estado e à União em 2011, mas até agora poucas medidas foram tomadas

Segundo o presidente da AMM, enquanto os encargos aumentam para os prefeitos, o repasse do Fundo de Participação de Municípios (FPM) vem caindo. Em 2011, quando eram previstos R$ 7,419 bilhões no ano para Minas Gerais, foram realizados somente R$ 6,597 bilhões, uma diferença de R$ 822 milhões ou 11% do que foi colocado inicialmente na lei orçamentária.

Em nota, o governo de Minas Gerais disse que o Brasil vive uma situação delicada em função da concentração de tributos nas mãos da União, o que tem prejudicado estados e municípios, obrigando-os a se ajudar mutuamente. A assessoria informou que o governo mineiro doou 10 mil unidades de materiais como pontes, bueiros e mata-burros a 403 municípios e celebrou 2.117 convênios com prefeituras em 2011 e 2012. Na área da segurança, o estado informa que tem investido 13% de sua receita e alega que não tem havido contribuição da União, que tem contingenciado as verbas para o setor.