postado em 15/05/2020 17:25 / atualizado em 15/05/2020 17:45
Amazona (Nova Fronteira, 1986;Companhia das Letras, 2019)
Na primeira edição, “novela” era parte do título. Só que não. É romance que se quer típica história de amor, folhetim, quase telenovela. Só que não também. Porque o autor brinca a sério com um gênero, sendo mais pastiche e menos paródia. Não é para ser engraçado, mas para escancarar truques e estereótipos do best-seller, com imagens fotográficas e cortes cinematográficos, sem jamais perder a ternura. Desde o título, referência às guerreiras, ressalta a força da mulher. Para ser lida em moto-descontínuo, de olho no contraditório.
A senhorita Simpson: histórias (Companhia das Letras, 1989)
São seis contos e a novela que dá título ao volume. Tão divertido quanto experimental, é ponto altíssimo na obra. O voo literário sai do nacional para alcançar território mais amplo. Começa no lugar do artista no Brasil, passa por um espetáculo circense europeu, faz escala num desses “países bolivianos” e retorna aos recantos do Rio de Janeiro de diferentes classes sociais e perspectivas diversas, inclusive a do estrangeiro. Se for para descobrir Sérgio Sant’Anna, este livro é o melhor princípio (ou o melhor meio).
O monstro: três histórias de amor (Companhia das Letras, 1994)
O sexo tudo impulsiona. A primeira história é a carta de uma engenheira ao amante passageiro escrita – ou erguida – sobre o que é solene e racional, mas “pornografia como uma construção assinada também pelo corpo”. Na segunda, um professor universitário (de extremas “lucidez e articulação verbal”), acusado de estupro e assassinato de uma bela jovem, concede entrevista a uma revista. A terceira história narra, grande parte em forma de diálogo, a vida de um renomado compositor. O desejo tudo erotiza.
Um romance de geração (Civilização Brasileira, 1980; Bertrand Brasil, 1988; Companhia das Letras, 2009)
Jornalismo, artes cênicas, literatura. Na primeira edição, o subtítulo: “comédia dramática em um ato”. Na última (2009), “teatro-ficção”. Transformada em peça de teatro dentro da própria obra, a entrevista entre Ele (O escritor) e Ela (A jornalista) se desenrola num apartamento-cenário em Copacabana. Sim, Matrioska ou Babuska metida no abismo do artista em conflito com condições políticas, comerciais e midiáticas adversas. Qualquer semelhança com o atual momento do país não terá sido mera coincidência.
Breve história do espírito (Companhia das Letras, 1991)
Sant’Anna invoca o demo para nos oferecer histórias de humor refinadíssimo. Três homens em três enrascadas, ou quase. O jornalista desempregado tem de escrever redação de emprego para uma igreja evangélica. O professor de ressaca precisa dar uma aula na universidade. O jurista renomado reúne amigos e amantes para uma festa de despedida. O autor consciencioso demonstra como habilidades do estilo constroem identidades masculinas. Não há nada fora da linguagem e suas versões para cada situação cotidiana.
O homem-mulher: contos (Companhia das Letras, 2014)
O melhor livro de Sérgio Sant’Anna no século 21 traz um pouco de tudo do autor e a novidade da memória autobiográfica. Dezenove histórias comprovam que ele não perdeu a mão até os últimos textos. Servem ao novo e ao fiel leitor, entre experimentação e vontade de leitura. Estratégia da metanarrativa sem solavancos, artes plásticas em descrição reenquadrada, erotismo travestido em identidades cambiantes, rigor formal embalado por tratamento estético. Por fim, melancólica, a aproximação da morte.
*Sérgio de Sá é doutor em estudos literários pela UFMG, autor de A reinvenção do escritor: literatura e mass media (Editora UFMG) e professor na Universidade de Brasília
No topo da estante
Os 22 participantes desta edição especial do Pensar elegem os seus livros favoritos
O voo da madrugada
8 votos
O concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro
3 votos
O monstro: três histórias de amor
3 votos
A tragédia brasileira
2 votos
A senhorita Simpson
2 votos
Anjo noturno
1 voto
O homem-mulher
1 voto
Notas de Manfredo Rangel, repórter (A respeito de Kramer)
1 voto
O pássaro da perfeição*
1 voto
*Antologia de contos lançada em Portugal pela Editora Tinta da China