Agosto de 2018
Numa conversa de Facebook, em agosto, jornalistas comentam o recrudescimento da violência contra a mulher. “É preciso fazer alguma coisa, não podemos perder a capacidade de nos indignar”, afirmou Hélia Ventura, jornalista aposentada do Diário da Tarde. Alguns dias depois, Mirian Chrystus publica, também no Facebook: “Mulheres do mundo, uni-vos”. É o começo da reedição do “Quem Ama Não Mata”, o potente slogan criado em 1980.
O mesmo slogan, a mesma indignação contra a mesma violência. Mas o mundo mudou, a sociedade é outra. Há 40 anos, o feminismo se dividia basicamente em duas grandes correntes, a europeia, com influência de Simone de Beauvoir, e a norte-americana, de Betty Friedan.
O feminismo norte-americano, em linhas gerais, era massivo e apontava falhas do sistema capitalista que poderiam ser sanadas. Já o feminismo europeu influenciava mais o meio universitário, que reverberava as ideias para a sociedade através da mídia. A principal questão colocada pela intelectual francesa foi questionar a imbricação destino e biologia.
IDENTIFICAÇÃO Assim, quando surgiu a ideia de se reeditar o ato de 1980, logo se constatou a necessidade de incorporar as várias vozes do feminismo atual: “ser mulher” passa a ser, inclusive juridicamente, parte de sentimento e identificação: tanto que a morte de mulheres trans por companheiros pode ser incluída no conceito de feminicídio, lei aprovada em 2015 pela presidente Dilma Rousseff.
De todos os fenômenos culturais, o que mais impactou o feminismo dos anos 1970/80 foi o feminismo negro. Ele não veio apenas como mais uma vertente a se somar, mas como a prática e reflexão teórica que colocou em xeque as bases do feminismo tradicional. Este foi criticado como essencialista, por não levar em conta a concretude das experiências singulares de grupos de mulheres que não apenas as brancas de classe média.
Assim, o movimento/ato “Quem Ama Não Mata” de 2018 vai refletir esse momento da cena atual.
Mais uma vez, feminismo e política se encontram, se entrelaçam: em 1975, combatendo a ditadura militar; em 1980, reivindicando a redemocratização do país e a anistia. Agora, juntamente com as forças democráticas do país, contra violências praticadas durante o processo eleitoral, zelando pela nossa frágil democracia.
Mirian Chrystus é jornalista. Eliane Marta Teixeira Lopes é professora emérita da Faculdade de Educação (UFMG). Silvana Cóser é socióloga..