Sacha Calmon
Advogado, doutor em direito público (UFMG). Coordenador do curso de especialização em direito tributário da Faculdades Milton Campos, ex-professor titular das faculdades de direito da UFMG e da UFRJ. Ex-juiz federal e procurador-chefe da Procuradoria Fiscal de Minas Gerais. Presidente honorário da ABRADT e ex-presidente da ABDF no Rio de Janeiro. Autor do livro “Curso de direito tributário brasileiro” (Forense)
A independência do Banco Central é de ser mantida. Mas sua política é discutível. Para que juros tão altos de 13,75% ao ano se a inflação fechada em fevereiro de 2023 (anual) foi de apenas 5,60%?
A política de juros básicos do BC visa a combater a chamada "inflação de demanda" com a sociedade indo às compras à vista e a prazo acima da oferta existente, cujos agentes então aumentam os preços. Mas o Brasil, pelo contrário, está com os itens compráveis bem estocados existindo consequentemente pressão inflacionária.
A entrada de Lula no governo há dois meses tão somente, ao contrário do que se esperava, não pressionou os preços e pode até ter estabilizado a contento a oferta de bens e serviços (desde a eleição em outubro/22 até fevereiro/23). O "carry-over" é positivo. O agronegócio está de vento em popa.
A arrecadação, por outro lado, está em nível de estabilidade e crescendo a produção de agronegócio (maior oferta) num setor altamente sensível, com o Imposto de Renda superando pela primeira vez o imposto sobre circulação e consumo de mercadorias em geral e serviços de telecomunicações, energia elétrica, minerais, combustíveis e lubrificantes (ICMS) a demonstrar o crescimento da poupança nacional e moderação do consumo, favorecendo a estabilidade macroeconômica.
Assim sendo, como as pequenas e médias empresas industriais, comerciais e de serviços, irão se financiar com os juros básicos do BC encarecendo excessivamente o custo do crédito que move a economia favorecendo os banqueiros? Os grandes bancos estão reduzidos basicamente a cinco (BB, Caixa, Bradesco, Itaú e BTG-Pactual).
Nos EUA mais que 2 mil bancos estão atuando e, portanto, concorrência há e é real, embora as licenças para atuar dependam dos estados-membros da Federação e que são à volta de 52, se contarmos Porto Rico e Havaí.
Aos analistas mais sensatos o presidente do BC deve ter sensibilidade para entender que o país precisa de juros mais compatíveis com o crescimento do país, pois não há pressão inflacionária. Em verdade o custo do crédito prejudica tanto os produtores quanto os compradores.
O presidente da Câmara dos Deputados, senhor da pauta de votações, já disse em oportuno pronunciamento que a subserviência do BC não será votada. Estamos assim numa situação de estabilidade relativamente a um BC independente, o qual não pode exagerar nas pontas da política monetária mantendo-as altas ou baixas (as taxas básicas do juro primário conforme o conselho monetário nacional), sem motivação real.
O atual presidente do BC tem mandato (Lula não pode substituí-lo), foi nomeado pelo governo Bolsonaro. Significa que é insubstituível, a menos que entregue o cargo. É neto do ultraliberal Roberto Campos, dos tempos de Maluf, uma figura temida até pelos “soi disant” liberais...
Ora, o empreendedor ao tomar empréstimo nos bancos para garantir e fazer crescer os seus negócios tem que pagar aos bancos uma remuneração escorchante, sempre acima da taxa básica do BC (piso).
O presidente Lula, entretanto, poderá utilizar o BNDES, a carteira agrícola do Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para impulsionar o mercado agropastoril e os produtores de médio e pequeno porte, dos cinturões ou parques agrícolas, inclusive hortifrutigranjeiros, que se adensam ao redor das capitais e de expressivas cidades como Campinas, embora o “custo” do financiamento seja alto exatamente pelo elevado valor da taxa básica de juros do BC. Mas convenhamos que os bancos, para lá das taxas básicas, cobram juros muito altos, problema crônico do Brasil quando se discute o crédito, tema tóxico em nosso país.
Está na hora de a sociedade perceber que são os agentes econômicos, em última análise, que promovem o crescimento. Ao cabo não somos capitalistas e liberais?
O Estado não pode exagerar nos tributos. E por Estado vejo a união estados e municípios. E, o BC não pode inviabilizar a política de crédito para a economia nas compras e vendas a prazo, gerando a necessidade de o tesouro injetar mais títulos do governo (crédito público) no mercado para obter fundos ou emitir moeda, gerando inflação.
Quer a emissão de títulos quer a emissão de moeda são inflacionários. Os juros básicos estão muito altos mesmo. E Lula tem razão e se descerem 0,75% será positivo sinal para o mercado. Se ficarem parados, inviabiliza a tomada de empréstimo e a economia não cresce. Falta uma fita azul na macumba deixada na encruzilhada por Bolsonaro.
Até nisso Bolsonaro até hoje atrapalha o Brasil. E tudo por causa de uma riscada de canivete que um desequilibrado, contratado para isso, transformou em facada por conta própria!
É necessário um grande debate nacional sobre a política correta dos juros básicos do BC e, também, pelos elevados juros cobrados pelos bancos privados. O governo pode muito, mas não pode tudo. É hora do jornalismo colaborativo.
