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Estado de Minas Editorial

O escândalo da escravidão


01/08/2022 04:00

Em pleno século 21, no país cujo agronegócio alimenta boa parte do mundo, dotado de propriedades recheadas de tecnologia, sobrevoadas por drones, fertilizadas por máquinas de última geração, beneficiadas pelos avanços da inteligência artificial e de olho na internet das coisas, uma chaga do atraso mancha uma parcela da produção e imprime para sempre uma marca de dor e humilhação nas vidas de milhares de seres humanos. Foi o que comprovou a chamada Operação Resgate, que, em sua segunda edição, em menos de um mês de investidas em 22 estados e no Distrito Federal, libertou nada menos que 337 trabalhadores em condições semelhantes às da escravidão.

A ofensiva envolveu 105 ações fiscais, com atuação conjunta do Ministério Público Federal, Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública da União, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal. Trinta e sete delas constataram pessoas em trabalhos forçados, condições degradantes e remuneração inexistente, insuficiente ou confiscada a título de pagamento de “dívidas”.

Dos mais de 330 seres humanos arrancados das garras de feitores “modernos”, a esmagadora maioria era serviçal da agropecuária: 304 atuavam em atividades de colheita em geral, no cultivo de café ou na criação de bovinos. Grande parte, 149 deles, foi vítima de tráfico de pessoas. E cinco eram simplesmente crianças.

Não foi, infelizmente, uma ação fiscal concentrada para combater um fenômeno isolado. Apenas nos sete primeiros meses deste ano do bicentenário da independência do Brasil, quando a abolição da escravatura se aproxima, ao menos oficialmente, de completar 135 anos, foram identificadas no país 1.178 pessoas submetidas à escravidão contemporânea.

Quando se amplia o horizonte de tempo desse horror que transporta uma parte do país para os tempos coloniais, sobe também a proporção do escândalo: de 1995 a 2021, o Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas contabiliza mais de 55 mil seres humanos resgatados de atividades que reproduzem a condição de escravidão no país. É como se toda a população de uma cidade do porte de Congonhas, na Região Central de Minas Gerais, vivesse escravizada.

Observar esses números significa refletir também sobre o fato de que esses foram os trabalhadores explorados que de certa forma tiveram a sorte de serem em algum momento identificados, localizados e libertados – e tiveram a chance de reaver, se não todos os seus direitos, ao menos um mínimo de dignidade. O que pensar do contingente desconhecido de seres humanos que podem viver escravizados nas terras deste Brasil continental, sem que sua condição nunca seja detectada pelos braços do Estado?

“O trabalho escravo não é uma ficção, é uma realidade que precisa ser banida da sociedade”, afirmou o subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, coordenador da Câmara Criminal do Ministério Público Federal, ao divulgar os dados da Operação Resgate. O delegado do Núcleo de Repressão ao Trabalho Forçado da Polícia Federal, Henrique Santos, destaca a urgência de eliminar a prática. “Nossa missão é erradicar o trabalho escravo no Brasil, não reduzir ou diminuir, mas banir essa atividade”, ressaltou.

Para isso, é imprescindível a união de órgãos como a que deu origem à operação, da qual participaram mais de 100 auditores fiscais do Trabalho, 150 policiais federais, 80 policiais rodoviários federais, 44 procuradores do Trabalho, 12 defensores públicos federais e 10 procuradores da República. Mas, muito mais que isso, é necessário equipar e garantir a segurança e a efetividade daqueles que fazem o trabalho de rotina para coibir esse tipo de crime.

Segurança, suporte e amparo que não tiveram, por exemplo, os três fiscais do Trabalho assassinados, assim como o motorista que os conduzia, em emboscada naquela que ficou conhecida como a Chacina de Unaí, em 2004, na cidade do Noroeste de Minas. A sensação de impunidade que cerca o múltiplo assassinato, pelo qual até hoje apenas o motorista que conduziu os pistoleiros está efetivamente preso, não contribui para o esforço de que o país precisa para apagar em definitivo de sua história a mancha da exploração do trabalho e da escravização de seres humanos.


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