Jornal Estado de Minas

artigo

A casa onde viveu JK






Serafim Melo Jardim
Diretor- presidente da Casa de Juscelino 
 
 
 
Quero falar da Casa de Juscelino Kubitschek em Diamantina e registrar um desrespeito à história e uma inominável injustiça que permite a destruição da memória do maior presidente que o país já teve. Procuram não preservar o seu passado. JK esteve presente na história do Brasil de 1956 a 1976. Contarei aqui uma história triste e que poderá repetir-se, como aconteceu com a casa do maior escritor do país: Machado de Assis.





Em seu livro “Memórias póstumas de Brás Cubas”, Machado escreveu: “Nós matamos o tempo; o tempo nos enterra”. Não podemos viver sem o passado e precisamos ter tempo para preservar o presente. A casa onde Machado de Assis morreu, em 1908, na Rua do Cosme Velho, 18, no Rio de Janeiro, foi demolida em 1940. No cinquentenário de sua morte, em 1958, o então presidente Juscelino Kubitschek desapropriou um imóvel ao lado, em tudo igual, para ali ser instalado o Museu Machado de Assis. Na calada da noite, a casa foi impiedosamente demolida, para edificação de uma pizzaria. E lá se foram o seu museu e o respeito àquele que os franceses têm com o seu Balzac, os ingleses com Dickens, e os alemães com Goethe. Destruída a casa onde morreu, descobriu-se também que foi abaixo a casa onde Machado nasceu, na Ladeira do Livramento. Triste homenagem ao extraordinário escritor. Casas, monumentos, documentos, a história esquecida, sendo dilapidada sem remorsos e, principalmente, sem o respeito a Machado de Assis.

O país que herdamos e vamos transmitir à nova geração é desmemoriado. Crimes como a derrubada das casas de Machado de Assis jazem vergonhosamente impunes diante dos nossos olhos, sem indignação e sem protestos. 
 
 
 
Falemos agora da Casa de Juscelino, em Diamantina. Enquanto estiver vivo, lutarei para manter em pé a casa onde ele viveu os melhores dias da sua infância e juventude e moldou o seu caráter, como ele próprio costumava dizer. Em 9 de agosto de 1976, na porta do Hotel Del Rey, em Belo Horizonte, Juscelino me pediu um favor: comprar para ele a casa onde viveu em Diamantina, na Rua São Francisco, 241. Treze dias depois, ele morreu em um acidente rodoviário provocado. Durante nove anos, trabalhei para conseguir atender ao seu pedido, o seu sonho. Em 12 de setembro de 1985, entreguei ao povo de Minas Gerais e do Brasil a casa da Rua São Francisco, 241, totalmente restaurada. Hoje, faz 37 anos da sua inauguração e 55 anos que estou ao seu lado. Nove anos em vida e 46 anos depois de sua morte. Nesses 55 anos, dediquei a minha vida para manter viva a imagem do maior presidente que este país já teve.





Hoje, sofro o desprezo do poder público, da Prefeitura de Diamantina e do atual prefeito, que, por ironia, tem o nome de Juscelino, e nesses cinco anos não colocou um centavo na Casa de Juscelino e dela tentou se apossar, visando destruir um trabalho de 37 anos.

Em 15 de fevereiro de 2022, a Secretaria de Cultura do Estado de Minas Gerais completou 1.287 dias sem repassar à Casa de Juscelino um único real, em desobediência aos convênios de 2017, 2019, 2020 e 2021. E ainda contrapõe sua inadimplência com falsas alegações, algumas até risíveis, além de argumentar que não assina os convênios porque a Casa de Juscelino não teria prestado contas dos convênios anteriores, de 2014, 2015, 2016 e 2018. Rematada mentira! Reitero que sempre acreditei na justiça e na verdade. De consciência tranquila, pergunto:
 
Tendo posse documental dos protocolos de sua entrega, como explicar que não prestei contas do convênio de 2014, e como explicar que, mesmo assim, assinaram os convênios de 2015, 2016 e 2018? Por que, diante do convênio de 2013, com contas prestadas e aceitas, depois de seis anos argumentam que a Casa de Juscelino entregou naquela oportunidade uma simples cópia xerox, ao invés do original?

Fiz esta defesa e, em fevereiro de 2022, sete meses depois que protocolei no estado a nossa contraposição, ela está engavetada. Melhor não responder mesmo, pois sabem que não têm razão. Minha atuação à frente da Casa de Juscelino sempre foi transparente, respeitosa, íntegra, o que me coloca em posição superlativa. Por sempre acreditar na verdade e na prevalência da Justiça, e me alicerçar na inquebrantável determinação de não deixar a Casa de Juscelino, na Rua São Francisco, 241, em Diamantina, ter o mesmo destino lamentável e desrespeitoso das casas de Machado de Assis, na Rua do Cosme Velho, 18, e na Ladeira do Livramento, no Rio de Janeiro.

Tentam fazer comigo o que tramaram com o reitor Luiz Carlos Cancellier, de Santa Catarina. Não conseguirão. Sofro a penúria financeira de um convênio não cumprido, mas me reforço no entendimento e na fé de de que esta injustiça será reprovada.

Na minha opinião, este artigo deveria merecer reflexão profunda das autoridades estaduais, e, mais, o discernimento de que o presidente Juscelino e a sua casa de infância e juventude não merecem coveiros oficiais e históricos da sua destruição e esquecimento. Especialmente quando se comemoram 120 anos de JK neste 2022 e o bicentenário da independência do Brasil.