(none) || (none)
UAI

Continue lendo os seus conteúdos favoritos.

Assine o Estado de Minas.

price

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e segurança do Google para fazer a assinatura.

Assine agora o Estado de Minas por R$ 9,90/mês. ASSINE AGORA >>

Publicidade

Estado de Minas

Por que não testamos o novo coronavírus?


postado em 28/05/2020 04:00

Marcus Lindgren
Sócio da Moore Auditores e Consultores e professor associado da FDC e Skema Business School

Depois de semanas confinados, começamos a ouvir algumas notícias mais alvissareiras que aumentam nossa expectativa de voltar a algum tipo de vida normal, independentemente do que seja esse normal. Porém, todos os estudos de especialistas colocam a falta de capacidade de testagem em massa como um dos fatores impeditivos de uma flexibilização mais acelerada do isolamento. Isso leva a uma pergunta básica: o que falta para conseguir fazer os testes, se temos uma excelente rede de laboratórios, públicos e privados, de diagnóstico in vitro?

A resposta tem sua origem em algumas décadas passadas e precisa ser pensada considerando toda a cadeia industrial da saúde. No Brasil, essa cadeia só tem início e fim, não tem meio. No extremo inicial dessa extensa sequência de etapas de agregação de valor estão as universidades e institutos de pesquisa, em sua maioria entidades públicas, de renome internacional, conduzindo, competentemente, a pesquisa básica, subvencionadas por verbas públicas. Na outra ponta, estão as indústrias que montam os kits e os equipamentos de análises clínicas, que são vendidos para os cerca de 14 mil laboratórios que realizam os exames com nossas amostras biológicas. Entre os extremos, há um grande hiato.

No início dos anos 2000, fui dirigir uma das maiores indústrias de produtos para diagnóstico do Brasil e tive a oportunidade de conhecer a realidade desse setor. Desde então, milito direta ou indiretamente com os diversos atores dessa área da saúde e tenho tido a oportunidade de conhecer as diversas facetas dessa complexa malha. E uma coisa sempre me incomodou: a fragilidade estratégica dessa cadeia de valor, que não foi capaz de desenvolver os elos intermediários, necessários para converter os investimentos realizados na pesquisa básica em produção de matérias-primas, insumos, peças e componentes para alimentar as etapas seguintes do processo produtivo. Estamos falando de enzimas, anticorpos, sais e outros materiais biotecnológicos fundamentais para a produção dos kits, que, em sua grande maioria, precisam ser importados. Esses são itens de maior valor agregado que demandam ativos tecnológicos sofisticados, o que poderia ser usado como justificativa tosca para explicar por que seria mais interessante importar do que produzir localmente. Então, tomemos itens menos tecnológicos como exemplo: o que me dizer da falta de produção local de frascos?. Pois é, nós não produzimos a maior parte dos recipientes no Brasil... acredite se quiser!

Esse é um claro exemplo da miopia estratégica coletiva, que envolve o Estado e os empresários – sim, não é culpa exclusiva dos governantes. Por falta de visão integrada de longo prazo, optamos por assumir uma postura de importadores que apenas fazem a montagem final, o assembling de partes fabricadas em outros países, deixando enormes lacunas nas etapas intermediárias do processo industrial. Os kits que estão sendo registrados na Anvisa, a toque de caixa, para atender à demanda da pandemia, são todos importados; alguns, nem rotulados no Brasil são – já vêm de fora com rótulos no padrão exigido pelo órgão regulador. Nem isso agregamos de valor com nossa mão de obra.

Algumas iniciativas isoladas têm tentado criar soluções para eliminar tais falhas estruturais. Em 2011, tive a oportunidade de conduzir um projeto junto com a Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial (CBDL) para a criação do Centro de Excelência de Diagnóstico In Vitro (Cediv), que deveria ser um polo para o estímulo ao desenvolvimento de tecnologia e empresas do setor. Infelizmente, não conseguimos arregimentar apoiadores para colocá-lo em marcha. Anos mais tarde, a partir do estímulo dado pela Codemig e Fundepar, conseguimos alinhar as expectativas de várias organizações públicas e privadas para dar vida ao Biotech.Town, que se materializou como o lócus para criação de empresas que visem ao desenvolvimento do setor industrial brasileiro da saúde, eliminando os vazios estruturais que menciono. Esse fantástico empreendimento entrou em operação em meados de 2018 e já gerou frutos, com cerca de 20 empresas sendo aceleradas em suas instalações.

Em toda crise, algum aprendizado deve ser tirado para que saiamos fortalecidos para encarar futuras adversidades. Nesse sentido, o coronavírus está nos ensinando a necessidade do pensamento estratégico mais amplo, que traga embutido o conceito de sustentabilidade não apenas de empresas individualmente, mas de cadeias inteiras. Isso demandará uma ação coordenada entre o empresariado, o Estado e a academia, pois nenhum desses elementos, isoladamente, será capaz de cumprir tal desafio. Só assim conseguiremos evitar que desastres como a COVID, Mariana, Brumadinho e tantos outros de menor monta causem os danos irreparáveis que temos experimentado.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)