Jornal Estado de Minas

A reunião ministerial e sua repercussão

Conteúdo para Assinantes

Continue lendo o conteúdo para assinantes do Estado de Minas Digital no seu computador e smartphone.

Estado de Minas Digital

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e segurança do Google para fazer a assinatura.

Experimente 15 dias grátis

Rodrigo Augusto Prando
Professor e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie e do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas

No fim da tarde de sexta-feira, o famigerado vídeo da reunião ministerial do governo Bolsonaro foi divulgado por determinação do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF). A exibição, no canais de TV, foi realizada por trechos e, em alguns momentos, partes foram mantidas em sigilo. Dos pontos mais polêmicos já se tinha conhecimento mesmo antes da divulgação, com maior ou menor precisão dos detalhes. Vejamos alguns elementos que reclamam maior atenção.



Em primeiro lugar, questiono-me o porquê de, justamente aquela reunião ter sido gravada. Sabendo o presidente Bolsonaro de seu linguajar, bem como do de muitos ministros e, ainda, do teor da discussão, qual a motivação para o registro em vídeo? Outro ponto que chama a atenção é que não há nenhuma atitude de empatia com os doentes e mortos pela pandemia. Nada. O tão falado e defendido "povo" na perspectiva de Bolsonaro não foi digno de uma fala de pesar pelas vidas perdidas. Os palavrões pululam não só na fala presidencial, mas de outros ministros. E, aqui, nenhuma novidade, inclusive porque pesquisas no período eleitoral indicavam que o eleitor se identificava com essa linguagem e a considerava um fator positivo do então candidato, dada a sua autenticidade.

Para os bolsonaristas, a fala, portanto, foi um mel para seu deleite vocabular e a confirmação de que Bolsonaro não mudou nada, é o mesmo de antes. Em muitas ocasiões, o presidente cobrou uma defesa mais enfática de seu governo, ideias, pautas e ações de seus ministros, pois muitos preferiam manter-se calados para preservar sua imagem pública. Certamente, o recado, dado a todos, era endereçado para Sergio Moro, que, de braços cruzados, mostrou-se desconfortável. As falas de Paulo Guedes e Onyx Lorenzoni pareciam tratar de um país distante da realidade, especialmente no que tange à visibilidade do Brasil no exterior.

Os ministros Weintraub e Damares têm a especial atenção do presidente e não se furtaram de externar o desejo de mandar para a prisão ministros do STF, prefeitos e governadores. Ricardo Salles, por sua vez, afirma ser importante "ir passando a boiada" para mudar os regimentos e as normas de proteção ambiental, até porque, em sua visão, haveria um momento em que a imprensa estaria mais preocupada com a pandemia e, logicamente, deveriam aproveitar essa janela de oportunidade. Um ministro do meio ambiente que parece preocupar-se com outros interesses e não os de preservação atinentes à sua pasta.



E quanto aos governadores, as expressões do presidente ao se referir a Doria e Witzel estão no campo das necessidades fisiológicas, cuja repetição é desnecessária neste escrito. Bolsonaro, orientado por valores que conjuga liberalismo econômico e conservadorismo nos costumes, insiste numa população armada, que, assim, não seria escravizada por nenhuma tirania. E, na escala de importância, a liberdade tem mais peso que a vida para o presidente da República. O fulcro do vídeo, contudo, está naquilo que Moro e seus advogados entendem ser a confirmação do desejo de Bolsonaro de intervir politicamente na Polícia Federal, mormente, no Rio de Janeiro. Segundo a versão oficial, mudar a "Segurança" seria relacionado à segurança pessoal, mas esta, como se sabe, está a cargo do Gabinete de Segurança Institucional; para Moro, ali, estava a insistência de troca na PF, ou seja, corroboraria a versão do ex-ministro em depoimento no processo que segue sob responsabilidade do STF.

Veremos, logo mais, o impacto da reunião no mosaico jurídico e nas questões políticas. Bolsonaro se esmerou no seu estilo de confrontar as instituições e, agora, recebe parte da resposta no universo jurídico e dos atores políticos.