Há quem diga que trabalhar desde cedo faz bem. Não é verdade! Trabalhar, em vez de brincar e estudar, causa males irreversíveis.
Quem perdeu o lado lúdico dos primeiros anos de vida ou a preparação educacional adequada na infância e na adolescência, certamente terá, exponencialmente, ampliadas as dificuldades de alcançar o pleno desenvolvimento biopsicossocial.
O trabalho precoce subtrai horas de lazer e estudo. Com isso, gera adultos frustrados, infelizes, despreparados para competir com aqueles que puderam dedicar seu precioso tempo às brincadeiras, otimização e potencialização de seus talentos e capacidades.
A equação, portanto, é perversa. Quem nasceu econômica e socialmente menos favorecido tem como triste sina a eternização da miséria. O trabalho infantil tem, na pobreza, causa e consequência. É um círculo vicioso, que se retroalimenta.
A pobreza conduz ao trabalho precoce. O trabalho antes da idade ideal provoca evasão escolar ou, no mínimo, cansaço, desmotivação, desinteresse e, consequentemente, baixo rendimento escolar. A exclusão do processo educacional ou o processo formativo incompleto, falho, comprometido gera pessoas com inaptidão cognitiva e intelectual e sem qualificação profissional.
Poucos compreendem que o trabalho infantil não destrói só a infância e a perspectiva de futuro de quem o pratica. Ele compromete, também, nossa capacidade de desenvolvimento como nação.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontava, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, em 2017, que no ano anterior, 2016, tínhamos ainda 1,8 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos sendo explorados pelo trabalho. Como, em razão de mudança metodológica, desprezaram-se 716 mil na mesma faixa etária que trabalhavam para o próprio consumo, é correto afirmar que o quadro era mais grave: 2,516 milhões de trabalhadores infantis. São os números disponíveis mais recentes.
Em 19 de julho, anuncia o IBGE, será retificada a pesquisa de 2017 e divulgados os novos resultados (de 2018), observando parâmetros traçados em resolução da OIT.
Claro que as piores e mais rudes formas, como descascar mandioca em farinheiras com afiadas facas, quebrar pedras em pedreiras, amassar barro em olarias, cortar cana na lavoura, expor-se à fuligem e degradação em carvoarias, vender doces em faróis, ser aviãozinho do tráfico ou vítima de exploração comercial sexual e tantas outras assemelhadas são modalidades que chocam e repugnam muito mais.
Certamente, elas, as piores formas, são as maiores responsáveis pelas 261 mortes ocorridas nos últimos 11 anos (de 2007 a 2018), conforme dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação Sinan/SVS, do Ministério da Saúde, reproduzidos pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI).
Sem considerar a subnotificação e/ou estabelecimento de conexão com o trabalho, outras 662 crianças perderam pelo menos uma das mãos trabalhando no mesmo período.
De 2007 a 2018, foram 26.365 acidentes graves envolvendo crianças e adolescentes enquanto trabalhavam. No total, 43.777 agravos à saúde relacionados ao trabalho de meninos e meninas brasileiros, vítimas da tragédia diária do trabalho prematuro.
Mesmo em atividades tidas por glamourosas, porém, trabalhar cedo pode ser sinônimo de tragédia anunciada.
O que dizer, então, da noticiada dação em pagamento de um atleta de apenas 11 anos de idade a um empresário, que nos remete à escravatura.
Não há mais tempo e nem deve haver tolerância. Basta! Precisamos cuidar das nossas crianças e adolescentes.
A família, a sociedade, a comunidade e o Estado, independentemente da ordem em que forem exigidos, têm o dever constitucional (artigo 227 da CRFB) e legal (ECA) de propiciar-lhes proteção integral e absolutamente prioritária. Juntos, precisamos dizer um sonoro não ao trabalho infantil e um vibrante sim à educação..