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Eutanásia: dilemas entre princípios constitucionais

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Direito à vida ou à dignidade? Permita-me dizer, claro que essa é uma decisão muito íntima e pessoal que uma pessoa ainda pode fazer em vida. Essa é uma das questões mais polêmicas discutidas no meio acadêmico jurídico e, em alguns casos, em tribunais de Justiça. Na Europa, por exemplo, um continente superavançado, somente quatro países (Holanda, Bélgica, Suíça e Luxemburgo) permitem esse tipo de execução. A discussão em torno da eutanásia envolve uma colisão de direitos fundamentais, em que, de um lado, está a autonomia da vontade do paciente e, do outro, está o direito à vida. Em outros termos, o debate gira em torno de se renunciar ao direito à vida. Trata-se, então, de um dilema difícil e complexo de ser ponderado, já que a vida sempre foi, até por razões religiosas, considerada um bem indisponível juridicamente, conforme verificado no artigo 13 do Código Civil.

A Constituição Federal de 1988 traz como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana. O direito à dignidade da pessoa humana propaga seus efeitos para todo o ordenamento jurídico interno, ao garantir tutela jurisdicional à dignidade do homem, a qual se verifica em todas as dimensões dos direitos humanos (liberdade, igualdade, fraternidade).

Todavia, o sistema civil Law (sistema romano-germânico), adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro, limita a arbitrariedade do Estado em face da ausência legislativa. Nesse sentido, não encontramos quaisquer atos normativos emanados do Estado que justifique ou tipifique o "direito à morte".

Igualmente, a Constituição em seu artigo 5º versa que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante. Valendo-se desse entendimento, conceder direito à morte poderia criar um precedente de insegurança jurídica.

Não obstante isso, aqui no Brasil, como na maioria dos países, a eutanásia é considerada crime, a depender da conduta, podendo ser classificada como homicídio, auxílio ao suicídio ou omissão de socorro, dependendo do fato típico. Tramita no Congresso Nacional, há muitos anos, anteprojeto de reforma da parte especial do Código Penal, colocando a eutanásia como privilégio ao homicídio e descriminalizando a ortotanásia (morte assistida sem sofrimento).

Visualizada a colisão de direitos, pode-se entender, em alguns casos específicos, que a solução mais compatível com os valores constitucionais poderia ser a autorização da eutanásia voluntária, ou seja, aquela que o sujeito em extrema condição de muitos anos de profundo sofrimento físico e psicológico manifesta seu desejo de não mais viver. Considera-se, então, tal escolha ser o centro da dignidade e autonomia da vontade pessoal.

Desse modo, fere a Constituição, também, não permitir que alguém, diante de uma pressão psicológica e de uma consternação de sobrevivência tão grande, opte por abreviar o seu sofrimento. Na ponderação de valores em si, afastando-se o caso concreto (vida versus autonomia e dignidade humana), até a de se considerar que a vida seja mais importante. Mas, no caso de uma pessoa que já perdeu todas as expectativas de viver e não mais considera que a sua vida seja digna de ser vivida, a balança está tão equilibrada que o melhor, juridicamente, talvez seja que a escolha recaia sobre o próprio indivíduo e não no Estado, que não pode se pautar por dogmas religiosos. Como no início deste texto, refaço novamente a pergunta: e você, o que escolheria – direito a vida ou a dignidade?..

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