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Ela morreu abraçada ao seu fiel amigo


postado em 11/02/2019 05:04

Quanta tristeza, quanta tragédia, quanto sofrimento, quanta irresponsabilidade, quanta omissão, quanta conivência, quanta corrupção, quanta falta de caráter, quanta falta de humanidade, quanta demonstração de desamor pelo seu próprio país, quanta falta de seriedade, quanta falta de respeito, quanta ganância, quanta maldade. A tragédia criminosa provocada pelo rompimento, em Brumadinho, da barragem de rejeitos de minério da Vale, que já foi do Rio Doce até ser vendida, por preço irrisório, no governo de Fernando Henrique Cardoso, provoca a eclosão espantada de todos os quantos e quantas possíveis da língua portuguesa. E leva o medo aos que moram, trabalham e vivem em áreas sujeitas a riscos idênticos, em bairros e condomínios localizados perto de minerações, em áreas baixas, no sopé de montanhas, nas margens de rios, riachos, córregos sujeitos a transbordamentos por excesso de chuvas e de rejeitos de barragens rompidas.

Acrescento, se não exagero, aos quantos e quantas, mais um. Quanta emoção com que se acompanha o relato dos jornalistas, repórteres, fotógrafos e cinegrafistas que cobrem a tragédia, com dedicação e competência, e o depoimento dos sobreviventes sobre o que aconteceu nos minutos, nos segundos que antecederam o tsunami de lama e rejeitos minerais, destruindo e soterrando tudo e todos que estavam, por obra do destino impiedoso, no leito natural da escumalha enfurecida morro abaixo.

Quem não chora ao ouvir o relato da morte daquela moça bonita abraçada ao seu pequeno cãozinho que ela tentou salvar? Moradora de área vizinha da barragem, alertada pela explosão causada pelo rompimento, ela já estava ao volante de seu carro, com a ignição ligada, pronta para escapar, quando se lembrou do pequeno ser que a acompanhava 24 horas por dia, esquecido dentro de sua casa. Voltou para apanhá-lo. Saiu correndo com ele no colo para entrar no carro. Não conseguiu. Em segundos, o mar revolto de lama e pedras de minério, que descia a uma velocidade calculada em mais de 100 quilômetros, a alcançou, envolveu, encobriu e soterrou. Os bombeiros, heróis maiores de Brumadinho, descobriram seu corpo. Ela morreu abraçada com seu pequeno e fiel amigo. É de sangrar o coração dos ainda não empedernidos.

Outra, aquela jovem que foi salva por um funcionário da empresa. Com uma corda ele conseguiu retirá-la da lama que encobria suas pernas e parte de seu corpo. Ao sair, traumatizada, ela chorava e perguntava por seu marido e seu filhinho de um ano, que estavam ao seu lado. O marido foi encontrado, mas já sem vida. O garotinho desapareceu no lamaçal. Quem não se emociona com sua triste história e a da jovem e muito bonita médica, na faixa dos 30 anos, que foi a primeira a ser resgatada, mas já morta, colhida pelo destino cruel que a levou ao local,  convocada pela Vale para substituir uma colega ausente?

Como esquecer aquelas crianças espantadas que procuravam entender o que acontecera com seu pai e sua mãe, modestos servidores da mineração, que não retornavam ao modesto lar da família. E a cena chocante da corda lançada pelo helicóptero da PM, levando pelo ar apenas a perna que sobrou de uma das vítimas. E a cena revoltante, descrita neste espaço, na edição do EM do dia 4, da vaca de olhos tristes que suplicavam socorro. Socorro negado, apesar dos pedidos de ajuda de um grupo de veterinários e ajudantes, todos voluntários, que se esgotaram no inútil esforço braçal para erguê-la e retirá-la da lama grudenta, obrigados a sacrificá-la, com injeção letal, para poupá-la da lenta e sofrida agonia. Tudo ali tem a marca da tristeza, da dor, do choro, do desconsolo, do desespero.

Doloroso, melancólico, soturno e sofrido, o silêncio noturno chuvoso do espaço em que viviam tantas destroçadas famílias de trabalhadores. Espaço em que crianças alegres e barulhentas brincavam nos finais de tarde. Espaço ecumênico em que todos conviviam com as vacas e os bois, com as cabras e cabritos, galos e galinhas, que proporcionavam o leite, os ovos, a carne para a alimentação trivial de todos os dias.  Tudo acabou, tudo morreu.

E agora? Haverá apuração competente, punição rigorosa, ou tudo acabará no esquecimento, como aconteceu com o mesmo desastre, há menos de quatro anos, em Mariana? Alguém foi punido? As vítimas foram amparadas e indenizadas pelos causadores da tragédia, menor em número de mortos, 19, do que em Brumadinho, mais de 200, incluindo os desaparecidos para sempre? São perguntas que aguardam resposta. Como os governantes do país e do estado, graças à rejeição do eleitorado consciente, não são aqueles nada confiáveis, muito pelo contrário como se sabe, além de omissos, preguiçosos, incompetentes, coniventes, dos tempos da tragédia de Mariana, há esperança de que, agora, tudo poderá ser diferente. Que seja.


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