Há quase nove anos, ao chegar ao curral, no tronco de contenção, para inseminar algumas vacas, deparei com uma gatinha selvagem recém-desmamada. Ela miava com fome. Então, retornei até a casa. Apanhei um pouco de leite e ração. E voltando, coloquei para ela beber e comer. Ela devorou tudo. Depois, roçou em mim e dançou ao meu redor, como todo o que é só no mundo se alegra quando encontra alguém que dele cuida. A partir daí, todos os dias eu lhe levava seu leite e a ração.
Depois de algum tempo, passou a vir até a minha sala e ficar ao meu lado. Quieta. Sempre satisfeita. Assim que embarrigou e foi parir pela primeira vez, sumiu. Pensei que houvesse morrido. Mas, passados uns dois meses, chegou toda orgulhosa com dois gatinhos.
Domingo passado, ela amanheceu morta. Estava barriguda. Quase na hora de parir. Um velho vaqueiro a encontrou sem vida. Perto de um cocho de água.
A companhia dela durante quase nove anos me ensinou o quanto podemos ser estimados por algum ser vivo. Pois no egocêntrico mundo tecnológico atual, tais valores quase que desapareceram por completo. E o pouco que ainda resta está quase que todo corrompido pelo poder do vil metal. E, com isso, as afeições que foram características históricas da raça humana na sua trajetória vivencial, hoje tornaram-se raras. Pois o que vigora é o oposto. E o pior de tudo é que quase todos acreditam ser participantes de um mundo em que se vive um progresso humano como nunca houve antes. Esquecem que nenhuma vida humana é mercadoria. Muito menos sem valor ou moeda de troca. Pois, por mais que a modernidade diga que só tem valor o produtivo, cujo preço se determina no mercado, ainda assim existem outros valores que são necessários ao dia a dia da humanidade. E que a frieza dos números ou da avançada tecnologia não conseguem expressar e nem ao menos captar sua importância.
Não há dúvidas, de que o capitalismo é o único meio econômico viável e real distribuidor de riqueza para todas as classes sociais. No entanto, é preciso melhorá-lo de modo que comporte em sua essência características que lhe sejam agregadoras de valor além do monetário. Afinal, o mundo hoje é muito mais consciente das reais necessidades dos indivíduos do que era 100 anos atrás. Nem tudo é dinheiro nem máquina. A vida vai muito além de toda a moderna parafernália tecnológica e instrumental. Isso cabe, principalmente, para ramos da economia que insistem em não evoluir nos seus métodos e procedimento arcaicos ainda adotados. E a mineração é exemplo clássico desse antiquado modo de produzir. Em que a ganância por insustentáveis reduções de custos se torna responsável por desastres ambientais e humanos inimagináveis e inconcebíveis para os dias atuais. A ausência de compromisso técnico eficaz com o meio ambiente e com a vida humana condena e evidencia o rumo criminoso adotado por esse segmento econômico. Afinal, nenhuma vida biológica é destituída de valor. Ao contrário.
Por isso, os que insistem em abafar crimes contra a humanidade em nome de um suposto apelo econômico se darão conta um dia, ao acordar, de que viveram uma tremenda ilusão. Que a vida passou e nenhuma lembrança saudosa e boa lhes restou em suas histórias e memórias. Pois foram agentes da morte e da destruição. E o tal do "progresso" lhes enganou. Sendo que o que passou não volta nunca mais. Para refazer o que deveria ter sido feito direito e com respeito a todos. Afinal, toda vida existente é sagrada. Chega de capitalismo selvagem!.