O Brasil, que enfrenta uma das piores crises fiscais dos últimos tempos, sofre a cada dia novos baques com decisões nada oportunas dos detentores do poder que não se preocupam em comprometer, ainda mais, as já combalidas contas públicas. A última delas foi a determinação do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), no sentido de que o reajuste dos servidores públicos federais seja pago na folha do ano que vem, quando a previsão era de que o pagamento só se daria em 2020, o que contribuiria para a contenção dos gastos do governo que está chegando.
A iniciativa descabida de Lewandowski contradiz medida provisória assinada, em setembro, pelo presidente Michel Temer, que adiou o aumento dos salários dos funcionários públicos civis da União, justamente para que as contas de 2019 pudessem fechar dentro da previsão. Com a decisão solitária e fora de hora do ministro, o impacto na folha do funcionalismo será de R$ 4,7 bilhões, montante não previsto no orçamento do próximo ano. Isso significa que, para cobrir o rombo, o novo governo que tomará posse em janeiro terá de encontrar outra fonte de receita, o que pode atingir os programas sociais voltados para os mais pobres.
A questão que se impõe é que sem o adiamento do reajuste previsto pela MP de Temer, a equipe do presidente eleito Jair Bolsonaro não terá como abrir espaço dentro do teto de gastos implementado pelo atual governo - o mecanismo limita o crescimento das despesas governamentais à inflação. A folga prevista era considerada importante para o funcionamento da máquina estatal em 2019 sem risco de colocar em perigo a prestação de serviços essenciais, que já são precários, nas áreas da saúde, educação e segurança.
O que causa certa perplexidade, por causa das dificuldades econômicas e financeiras do país, é que a decisão de Lewandowski beneficia um segmento privilegiado da população, aquinhoado com os melhores salários pagos pelo poder público. De acordo com o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, serão agraciados com o aumento salarial 372 mil servidores ativos e inativos. Mais grave é que de nada adiantou a tentativa das autoridades de enxugamento da máquina administrativa, uma vez que as 124 mil funções, gratificações e cargos comissionados, que seriam extintos pela medida provisória, continuarão existindo.
O que assusta é que o ministro do STF é o relator de outras seis ações em que as categorias profissionais de servidores pedem o pagamento de aumento também no ano que vem, sob a alegação de ter direito adquirido ao reajuste, já que o mesmo foi publicado em lei antes de ser adiado, pela MP, para 2020. Tudo indica que serão acatadas por Lewandowski, pois a manobra dele na recente derrubada da MP já tinha sido feita anteriormente, quando ele revogou outra PM que tratava da mesma matéria.
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