Jornal Estado de Minas

MAIS UMA DENÚNCIA

Pesquisador brasileiro é deportado ao chegar ao México

As denúncias de truculência, burocracia e desinformação de autoridades da imigração mexicana e "descaso" da representação brasileira na Cidade do México não cessam. O pesquisador Dan Gabriel D'Onofre, professor do departamento de economia doméstica e hotelaria da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) foi deportado no dia 2 de junho após chegar à capital mexicana, onde participaria da IX Conferência Latino Americana e Caribenha de Ciências Sociais (CLACSO).



No encontro, realizado entre 7 a 10 de junho na Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), com o tema "Desigualdades na América Latina e Caribe", Dan apresentaria resultados da pesquisa "Conceito de Recreio Pandêmico," que desenvolve no Recreio dos Bandeirantes, na região da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. As características e estrutura do bairro propiciam atividades recreativas em áreas abertas. Portanto, o pesquisadro captou os elementos ao longo da pandemia em seus diversos estágios e confrontou com o direito à cidade.

O que seria uma viagem de troca de conhecimentos, tornou-se um pesadelo. Dan foi informado que deveria fazer uma solicitação de visto com 30 dias de antecedência à data do embarque, no dia 1º de junho. Ele conta que obedeceu todos os procedimentos indicados e os documentos requeridos -solicitação de entrada no país, passaporte, e cartão de vacinação - foram apresentados no embarque que ocorreu no aeroporto do Rio de Janeiro. 

O voo contratado constava uma conexão em Bogotá, Colômbia, com uma espera de mais de 10 horas, período que aproveitaria para um giro pela cidade. "O voo para Colômbia atrasou 2h30 e algumas pesquisadoras que iriam para escala mais curta perderam o voo. E a solicitação de entrada no México expirava no dia primeiro, como a minha. Elas tiveram problemas e também foram deportadas."





Segundo Dan, ele embarcou rumo à Cidade do México às 23h e, neste momento, reapresentou todos os documentos à imigração colombiana sem qualquer problema, chegando à capital mexicana às 3h40.

"Direcionados para imigração mexicana, os passageiros estrangeiros preencheram uma tarjeta, solicitada a todos os viajantes.  Ao apresentar a documentação, a atendente informou que havia um problema na minha solicitação e que eu poderia fazer renovação e me direcionou a outro setor. Começava aí um processo coercitivo que jamais imaginei que passaria", conta Don.

A partir desse momento, opesquisador foi impedido de tocar no celular e foi informado que o documento não era visto, portanto ele precisava carimbar o passaporte, o que poderia ser feito lá mesmo. "Mas comecei a desconfiar devido ao modo estranho que o grupo passou a ser tratado."





Sem celular, relógio, as horas passavam e ninguém sabia o que estava acontecendo, até ser entrevistado por um funcionário da imigração com as perguntas de praxe aos estrangeiros em qualquer país. Informou que é funcionário público no Brasil, que estaria participando de um evento e que ficaria hospedado na casa de amigos, informando o endereço. O funcionário se desculpou e o conduziu de volta à sala. Durante a entrevista o funcionário utilizou um aplicativo tradutor no celular. 

"De repetente um funcionário retorna com três passaportes brasileiros, me chama e mais duas mulheres que não conhecia, nos separa e informa que estávamos impedidos, e que a partir daquele momento não poderíamos mais ficar no México. Separados por gênero, fui para uma ala onde deixei os pertences. Mandaram tirar o cadarço do tênis e guardar todos os pertences e documentos dentro da mala", relatou o pesquisador.

 

Cela com outras dez pessoas 

 
Muito emocionado, o professor disse que jamais imaginou passar por uma situação tão vexatória. "Fui colocado em uma cela. Me dei conta que estava sendo colocado talvez em situação de imigrante ilegal. Tinha umas dez pessoas, com camas de aço, colchões de plástico, luz forte, sem tv, sem notícia sem nada".





Em determinado momento uma atendente da imigração passou informando que seria permitido fazer uma única ligação e, ao preencher um caderno com dados e horário foi quando o grupo soube que já era 8 horas da manha no horário local.

"Tentei falar com as pessoas que me hospedariam mas não atenderam devido estar em trânsito para o trabalho. Acabei não conseguindo contato. Pedi para falar com a Embaixada Brasileira, porque precisava de uma mediação. Ele respondeu que não entraria no país. Respondi que tudo bem, mas precisava de uma conversa sobre a situação com a representação de meu país. Ele disse que a embaixada brasileira estaria fechada e abriria as 9h da manhã e que me chamaria neste horário, me colocando de volta na cela sob guarda da polícia", recorda.

Mas o grupo não conseguiu mais contato com os funcionários da imigração e os policiais da escolta diziam que nada poderiam fazer. Até que por volta do meio-dia serviram um lanche, e Dan e mais duas brasileiras foram conduzidas para a deportação. 





"Fui tolhido de ter a mediação de uma representação consular e tratado em uma lógica que não cabe a mim, pois não era imigrante ilegal. Tinha passagem de ida e volta. Ou agiram mediante a um critério pessoal, algo que extrapola uma perspectiva baseada em algum rito, ou o campo de triagem deles é péssimo. Um pesquisador poderia ser facilmente identificável até pela internet. Mandei posteriormente e-mail para embaixada brasileira e até hoje não tive qualquer resposta. Isso já no Brasil", disse.

As pessoas que o acolheriam no México, quando deram conta que tinha chamada não atendida e ele demorando a dar notícias, descobriram que havia um número da imigração do aeroporto. Era um número só de emissão, não recebia chamadas. Eles então ligaram os fatos e entraram em contato com a embaixada brasileira. O órgão  informou, mais tarde, que o pesquisador não entrou no país devido a problemas com visto.

"A embaixada não teve postura proativa comigo e com outros brasileiros que conheci no momento da deportação. Uma delas é companheira de um professor da Rural (Universidade Federal). Eles obtiveram a informação e não procurou sequer saber quem era o brasileiro detido, se precisava de ajuda. Tanto por parte da imigração, quanto da embaixada brasileira, que foi informada sobre deportação e não buscou sequer a informação se realmente se tratava de imigração ilegal. Três eventos da área de ciências sociais vão acontecer no México, será que o México é ideal para receber essas pessoas da América Latina?", questiona D'Onofre.



Outra denúncia 


A professora do departamento de comunicação social da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Graziela Mello Vianna, também denunciou constrangimento sofrido por cidadãos brasileiros que viajaram ao México no início de junho.

Ela e um grupo passaram pela ameaça de terem a entrada negada. O grupo participou do evento ao qual Dan foi impedido por ter sido deportado.

Posição do goveno brasileiro  


Em nota, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil reconheceu problemas reclamados por vários brasileiros ao entrar no México. Leia o texto na íntegra:

 "O Ministério das Relações Exteriores tem acompanhado com preocupação relatos de centenas de brasileiros atualmente impossibilitados, por questão técnica, de tramitar autorização eletrônica para ingresso no México. 

O Itamaraty solicitou, em alto nível, providências urgentes ao governo mexicano, por meio da Secretaria de Relações Exteriores, da Secretaria de Turismo e do Instituto Nacional de Migração, com vistas a resolver o problema.





O Brasil reitera a expectativa de que seja encontrada com urgência solução definitiva para a questão, que prejudica centenas de turistas e empresários brasileiros."

O Ministério das Relações do México não se manifestou até o momento da publicação desta reportagem.

Brasileiros presos no México 


Segundo a agência Carta Maior, há 20 mil brasileiros presos na fronteira do México com os EUA - a única fronteira, no mundo, entre o terceiro e o primeiro mundo. Por essa razão, o governo dos EUA impôs o retorno do visto de entrada dos brasileiros no México e o Brasil, em reciprocidade, tomou a mesma atitude para a entrada dos mexicanos aqui.

Para se ir ao México, é preciso pedir o visto nos consulados, o que inclui a impressão de um formulário, com foto recente, mais comprovantes de reservas de hotéis no México, comprovante de rendimentos dos últimos três meses, comprovante de pagamento de cartão de créditos nos últimos três meses, entre outros documentos. 

Uma vez entregues todos os documentos, os vistos serão concedidos, caso os documentos sejam aprovados em três dias úteis. A circulação entre os dois países mais importantes do continente fica submetida a esses trâmites, a partir da decisão do governo dos EUA.