Do dia para a noite, 8 mil cubanos abandonaram suas vagas no Programa Mais Médicos, deixando desassistidas as áreas mais vulneráveis do País. Para o médico Drauzio Varella, um dos mais renomados do Brasil, o Mais Médicos foi "o programa de interiorização de maior alcance e duração" já desenvolvido e agora está ameaçado.
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Vagas do programa Mais Médicos começam a ser preenchidas na Grande BHAdesão ao Mais Médicos cria déficit no SUSEstabilidade e salário pesam na escolha de migrar para o Mais MédicosChuvas causam cancelamento de voos no Aeroporto de CongonhasNa entrevista a seguir, ele diz que o perfil dos médicos formados no Brasil - de classe média alta e predominantemente feminino - dificulta a fixação do profissional nas regiões do País que mais precisam. "Você acha que essas pessoas de classe média alta vão querer ir para esses lugares? Você tem uma filha, paga caro na faculdade dela, você quer que ela se forme para trabalhar no sertão de Alagoas?"
Qual é sua visão geral sobre o Mais Médicos?
O Mais Médicos foi o programa de interiorização de maior alcance e duração. Nunca um programa alcançou tantas pessoas em território nacional e durou tanto tempo. Acho que o defeito foi ter deixado o programa na mão do governo de Cuba, porque o acordo podia ser rompido a qualquer momento, como aconteceu. E daí você tem mais de 8 mil médicos para substituir. Primeiro, surgiu essa situação com as declarações do presidente (eleito) dizendo que os médicos eram ruins, que o programa era só para dar dinheiro para Cuba. E então, tiraram todo mundo de uma vez.
A solução de trazer médicos de Cuba foi inteligente?
Deixando de lado a parte política e a questão sobre se está certo você mandar dinheiro para Cuba ou não, acho que foi uma solução possível. Não tínhamos médicos nesses locais.
Mas quando o programa foi lançado, em 2013, já não havia um número de brasileiros suficiente para cobrir esses lugares?
Nós temos um contingente de médicos brasileiros suficiente para atender o País inteiro - são quase 500 mil médicos -, mas o problema é a concentração.
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, colocou em questão a qualidade do médico cubano. Ele é capacitado para trabalhar aqui?
Em Cuba tem um curso de quatro anos e, pelo meu entender, prepara para as coisas básicas. Para dar cuidados básicos você precisa ter um médico com formação em clínica médica e saúde da família, que é o que falta aqui. Nós não temos médicos preparados nessa área porque o pessoal não se interessa, eles querem fazer especialidade. O fato é que não tínhamos esses 8 mil médicos brasileiros dispostos a ir para esses lugares.
Mas agora eles subitamente se interessam?
Quantas faculdades de Medicina abrimos desde o Mais Médicos? É um número muito grande. Atualmente formamos 20 mil médicos por ano. Vamos aumentar nos próximos seis anos e chegaremos a 38 mil médicos por ano. Você tem agora mais gente pra concorrer às vagas, ainda mais com o salário de R$ 11 mil reais em meio a essa crise.
Os cursos são bons no Brasil?
Não. É isso que eu acho engraçado, eles ficam falando da formação dos cubanos, mas não falam da dos brasileiros. Essas faculdades estão abrindo por interesses econômicos. Os cubanos que prestaram o Revalida tiveram o mesmo índice de aprovação que os não cubanos.
Você acha que o Mais Médicos está ameaçado?
Acho. Um programa de interiorização em que você tira 8 mil médicos de um dia para outro, é o início de um drama. Ninguém estava preparado.
Se fosse pra ser bem feito, teria que ter um planejamento.
Lógico.
Mas você acha que teve uma inviabilidade do presidente novo?
Sem dúvida. Os cubanos poderiam ter dito que não se dariam bem com o presidente, que não haveria entendimento. Mas deveriam ter pensado nas pessoas que estão sendo atendidas, ter fixado uma data.
Você conhece o Luiz Mandetta, escolhido por Bolsonaro para ser ministro da Saúde?
Não conheço. Ele fez uma declaração sobre aids que desgostou o pessoal da área (Mandetta disse não acreditar na eficiência de campanhas de prevenção realizadas em escolas e postos). Mas devemos aguardar, pois ele nem assumiu ainda..