O Ministério Público de São Paulo apresentou denúncia à Justiça contra cinco policiais militares no caso do menino Ítalo Ferreira de Jesus Siqueira, de 10 anos, morto a tiros após furtar um carro na Vila Andrade em 2016. O MP entendeu que dois policiais devem responder por homicídio doloso por não ter havido confronto e outros três PMs devem ser responsabilizados por fraude processual, por supostamente terem alterado indevidamente a cena do crime.
A denúncia foi divulgada nesta quarta-feira, 29, pela instituição. No documento de dez páginas, o promotor Fernando César Bolque narra o caso e pede responsabilização dos policiais Otávio de Marqui e Israel Renan Ribeiro da Silva pelo assassinato e por fraude processual, e de Daniel Guedes de Oliveira, Linconl Alves e um terceiro identificado apenas como Adriano por fraude processual. A Justiça analisará a denúncia e decidirá se tornará os policiais réus no caso, o que poderá culminar com o júri popular dos agentes.
Na noite de 2 de junho de 2016, Ítalo e um colega de 11 anos furtaram um carro de dentro de um prédio na rua Nelson Gama de Oliveira. Nas ruas das proximidades, narra o MP, Ítalo dirigia de maneira vacilante por não saber manejar o veículo e também pela sua estatura reduzida. A situação chamou atenção da polícia que efetuava patrulhamento na região e que passou a seguir o carro.
O carro furtado acabou colidindo com um ônibus e depois com um caminhão. Diz o promotor que o policial Israel levou um esbarrão desse caminhão atingido e, no chão, atirou contra o veículo furtado após supostamente ver um "clarão" de dentro dele, indicando que Ítalo e o colega teriam efetuado um disparo.
O suposto clarão também foi o que motivou o disparo efetuado pelo policial Otávio de Marqui contra os ocupantes do veículo, atingindo Ítalo na cabeça e matando-o na hora. O promotor diz, no entanto, que não há provas que indiquem a realização de disparos por parte das vítimas.
Com os ocupantes do carro, a polícia encontrou um revólver calibre 38 com três cartuchos íntegros e três deflagrados. Na época, a criança que sobreviveu chegou a relatar que a arma teria sido plantada pelos agentes, o que não é citado na denúncia. A versão foi sustentada também pela mãe da vítima. O Ministério Público acredita que os policiais tenham alterado a cena do crime e eles mesmos tenham efetuados disparos no revólver posteriormente para sustentar a tese de confronto entre as partes.
A acusação aponta que o tenente Daniel Guedes Rodrigues determinou que Otávio retirasse a arma do local, o que, segundo o MP, já configura "inovação artificiosa do estado do lugar do instrumento do crime", o que é manifestamente proibido por lei.
"A única justificativa para a existência de um terceiro projétil deflagrado decorre da ocorrência do crime de fraude processual, ao determinar o denunciado Daniel Guedes Rodrigues que o policial Otávio Marqui retirasse a arma da cena do crime", escreve Bolque no documento.
Isso teria ocorrido quando os policiais teriam efetuado disparos na arma enquanto levavam a criança sobrevivente para a casa da sua mãe, trajeto que se estendeu por mais de duas horas. "É apurável que no caminho entre a suposta busca da mãe da criança, os policiais militares Linconl Alves, Sd. PM Adriano (ainda a ser identificado) e Israel Renan Ribeiro da Silva, todos já qualificados, com o nítido propósito de inovar artificialmente estado de coisa, promoveram disparo da arma de fogo que estava em posse da criança Ítalo, visando com isto induzir em erro o juiz natural da causa e o perito, na medida em que induz aquele que promoverá o julgamento da causa a acreditar que efetivamente houve um disparo por parte da criança Ítalo no momento do embate no ônibus e no caminhão, ao serem surpreendidos Otávio Marqui e Israel Renan Ribeiro da Silva com o suposto 'clarão'."
Denúncia diverge de posicionamento das polícias
Tanto a investigação da Corregedoria da Polícia Militar quanto a apuração conduzida pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) tiveram entendimentos distintos do que foi anunciado nesta quarta pelo MP. Em nota, a Secretaria da Segurança Pública disse que as investigações foram finalizadas sem indiciamentos dos agentes, que retornaram ao policiamento operacional.