São Paulo, 16 - "Soltem os braços, descruzem as pernas, inspirem o ar pelo nariz e soltem pela boca. Vamos ouvir nosso coração", propõe a advogada Denise Ortiz, para uma plateia ansiosa de 50 pessoas. "Vamos fechar os nossos olhos e pensar: 'Como estou hoje?', 'Como foi o minha manhã até aqui?'. O "aqui" é o Foro Regional de Santo Amaro, zona sul da capital.
Sentados no auditório estão, em grande maioria, pais e mães que são partes em processos de guarda, pensão alimentícia, alienação parental, entre outros conflitos familiares. A advogada prepara os participantes para a representação que ocorrerá em seguida, quando os próprios integrantes serão convidados para fazer as vezes de atores, representando os dramas do vizinho de cadeira.
A cena faz parte de uma técnica nova nas comarcas do Tribunal de Justiça de São Paulo: a constelação familiar. O objetivo é esclarecer as partes, com uso de psicodrama, sobre o que há por trás do conflito que gerou o processo judicial e abrir caminhos para a pacificação. A reportagem acompanhou a "Oficina de Direito Sistêmico Paz Para Todos", segunda vivência realizada na Vara da Família de Santo Amaro.
A partir de junho, a unidade colocará em prática a constelação como mais uma técnica possível para a solução de conflitos. As vivências, que tiveram início em março e ocorrerão mensalmente, fazem parte de um projeto voluntário realizado por quatro consteladoras.
Os conflitos levados para uma sessão de constelação são geralmente voltados para questões familiares, como violência doméstica, endividamento, guarda de filhos, divórcios litigiosos, inventário, adoção e abandono. A participação nos encontros é voluntária e o convite é feito pela juíza coordenadora do projeto de constelação familiar em Santo Amaro, Claudia Spagnuolo. "Em um processo, as pessoas costumam ver a situação de forma fragmentada. A constelação dá a possibilidade de ver de fora o seu problema", explica Claudia. Além de Santo Amaro, a Vara da Família de Santana, zona norte da capital, também realiza oficinas.
Na sessão, antes da mediação conduzida pela advogada Denise - que também é consteladora - os participantes escutam meia hora de palestra e têm sete minutos para reflexão. O tema principal: conflitos familiares.
Ana Paula é orientada a escolher, de forma aleatória, quatro pessoas da plateia: cada um representará um membro da família, inclusive ela mesma. Na dinâmica da constelação, as sensações físicas e os sentimentos são levados em conta e explorados pela consteladora. Um mecânico de 32 anos, que enfrenta processo de visita do filho, foi um dos convocados para representar a história de Ana Paula. "Estava tenso, mas no final fiquei mais consciente do que todo o processo vai causar no meu filho", afirmou.
"As pessoas se emocionam porque se reconhecem. O objetivo da constelação é fazer refletir sobre a relação com a família, com os pais e com os amigos", explica a consteladora. Após a dinâmica, os participantes preenchem uma ficha em que sinalizam interesse ou não em participar de uma constelação individual.
Resultados
De caráter terapêutico, o método vem ganhando espaço no Judiciário. Pelo menos 16 Estados e o Distrito Federal já utilizam a técnica. A constelação familiar começou a ser aplicada pela Justiça da Bahia, em 2012, pelo juiz Sami Storch. "O índice de conciliação sobe expressivamente com a constelação. É desgastante e sofrido um processo tradicional", diz Storch. A técnica foi testada naquele ano com cidadãos de Castro Alves, município a 191 quilômetros de Salvador. Nas 90 audiências realizadas, nas quais pelo menos uma das partes participou da vivência de constelação familiar, o índice de conciliação foi de 91%. No Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), os números mais atualizados mostram que a taxa de acordo varia de 58% a 75% quando há constelação no processo.
O Estado de S. Paulo.
(Juliana Diógenes).